Mauro Ferreira no G1

Aviso aos navegantes: desde 6 de julho de 2016, o jornalista Mauro Ferreira atualiza diariamente uma coluna sobre o mercado fonográfico brasileiro no portal G1. Clique aqui para acessar a coluna. O endereço é http://g1.globo.com/musica/blog/mauro-ferreira/


domingo, 31 de agosto de 2014

CD 'Barulho feio' é outro passo torto de Fróes em poética trilha experimental

Resenha de CD
Título: Barulho feio
Artista: Romulo Fróes
Gravadora: YB Music 
Cotação: * * * 1/2
Disco disponível para download gratuito e legalizado no site oficial do artista

 Quinto álbum solo de Romulo Fróes, Barulho feio é outro passo torto de Romulo Fróes em sua caminhada experimental. Trilha pavimentada à margem do mercado fonográfico desde 2001, ano do lançamento do primeiro disco do cantor, compositor e músico paulistano - um EP que abriu caminho para a edição, três anos mais tarde, do primeiro álbum de Fróes, Calado (Bizarre Music, 2004), apresentado já há uma década. De lá para cá, o artista solidificou sua parceria com os compositores e artistas plásticos paulistanos Eduardo Climachauska (o Clima) e Nuno Ramos, nomes recorrentes na ficha técnica de Barulho feio, hábeis na construção de letras embebidas em poesia contemporânea, cujos versos saltam aos ouvidos entre os ruídos sonoros e humanos que pautam Barulho feio, disco em que Fróes experimenta (des)caminhos para a canção popular brasileira. Não por acaso, a primeira das 15 músicas do disco - Não há, mas derruba (Romulo Fróes e Nuno Ramos) - é introduzida com o sopro torto do saxofone de Thiago França, músico fundamental na arquitetura de Barulho feio ao lado de Guilherme Held (na guitarra) e de Marcelo Cabral (no baixo acústico). O caminho seguido é o mais difícil. Firme nessa rota sem atalhos, Fróes impede o salto da veia de um samba-canção que circula embutida nessa faixa de abertura. O que salta aos ouvidos já de cara e sempre são os ruídos, as interferências, os barulhos feios inseridos nas músicas - como se o álbum quisesse captar a (des)organização urbana de uma metrópole. No caso, o caos e a poesia da cidade de São Paulo (SP), matérias-primas do bom disco. Os ruídos e a poesia estão por toda parte, aclimatando músicas como Na minha boca (Romulo Fróes e Alice Coutinho), Pra comer (Romulo Fróes e Clima) - visão poética do voo de um urubu à espreita aérea da carniça? - e a composição-título Barulho feio (Romulo Fróes e Nuno Ramos) em ambiente dissonante, distante do formato convencional da canção. Mas a canção está lá, ecoando citações e influências do samba e da bossa entranhada na levada básica que nortei a faixa O que era meu (Romulo Fróes e Alice Coutinho). "Dizem por aí que eu não sou nada / A pessoa mais errada / Que eu perdi a direção / Dizem que eu deixei no violão / O que em mim tinha de bom", rumina Fróes, a sós com seu violão, em versos de Como um raio (Romulo Fróes e Nuno Ramos) que evocam a morbeza romântica do cancioneiro do compositor carioca Nelson Cavaquinho (1911 - 1986) - cuja obra, a propósito, vai ser abordada por Fróes em disco previsto para ser lançado em 2015. Entoada a capella pelo cantautor de voz grave (e extremamente bem colocada neste disco produzido por Fróes com Cacá Lima), Poeira - parceria de Mariana Aydar com Nuno Ramos - espalha a poesia urbana que sobressai no disco entre melodias de moderado poder de sedução. Em Peixinho triste (Lanny Gordin, Guilherme Held e Nuno Ramos), a guitarra cria o clima dessa canção que anuncia o sol, já desaparecido na música seguinte, Cadê (Marcelo Cabral e Clima), cuja letra cita Assum preto (Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira, 1950). Cadê explicita a importância paradoxal do silêncio neste disco ruidoso. Entre silêncios e atonalidades, Fróes faz dueto com a cantora paulistana Juçara Marçal em Espera (Rodrigo Campos, Romulo Fróes e Alice Coutinho) e faz barulho ao amplificar a guitarra noise de Guilherme Held em Se você me quiser (Romulo Fróes e Clima) e em Noite morta (Romulo Fróes e Nuno Ramos). Já A luz dói (Clima e Nuno Ramos) clareia somente a voz de Fróes neste tema cantado a capella que encerra o disco na penumbra, mas já com a certeza de que a luz voltará. Possível metáfora para adiantar o próximo passo torto de Fróes, caminhante noturno de trilha experimental que espalha poesia no chão, sem chão. Até que o barulho não é tão feio assim.

Guinga lança 'Roendopinho', álbum solo em que toca solitário seu violão

 Guinga lança álbum solo, Roendopinho, neste mês de agosto de 2014. Gravado de 7 a 9 de abril de 2014 em estúdio de Osnabrück, na Alemanha, Roendopinho sai pelo selo Acoustic Music Records. O CD é tido como o primeiro disco solo do cantor e compositor e violonista carioca porque, nele, o músico toca 15 temas autorais a sós com seu violão. Metáfora poética, o título Roendopinho, aliás, foi criado com a justaposição do gerúndio do verbo roer com a palavra pinho (madeira usada para a construção do violão). Com eventuais inéditas como Pucciniana e a música-título Roendopinho, a seleção de repertório do CD vai de 1991 - ano em que Lendas brasileiras (Guinga e Aldir Blanc) foi lançada em disco - a este ano de 2014. Roendopinho é o 13º álbum da discografia de Guinga. Eis, na ordem do CD, as 15 músicas do disco Roendopinho:

1. Pucciniana (Guinga, 2014)
2. Choro breve nº 1 (Guinga, 2014)
3. Roendopinho (Guinga, 2014)
4. Anjo de candura (Guinga, 2010)
5. Picotado (Guinga, 1996)
6. Igreja da Penha (Carta de pedra) (Guinga, 2006)
7. Cheio de dedos (Guinga, 1996)
8. Di maior (Guinga, 1999)
9. Constance nº 2 (Guinga, 2014)
10. Unha & carne (Guinga, 2006)
11. Sargento Escobar (Guinga, 1999)
12. Funeral de Billie Holliday (Guinga, 2014)
13. Cambono (Guinga e Thiago Amud, 2013)
14. Lendas brasileiras (Guinga e Aldir Blanc, 1991)
15. Ellingtoniana (Guinga, 2012)

Terceiro álbum de Guizado, 'O voo do dragão' chega à cena em setembro

Exímio trompetista da cena contemporânea brasileira, Guizado - nome artístico do músico pernambucano Guilherme Mendonça -  vai lançar seu terceiro álbum solo em setembro de 2014. O voo do dragão é o título do CD que sucede Punx (Diginois / Urban Jungle, 2008) e Calavera (Trama Virtual, 2010) na discografia do artista. O voo do dragão é trabalho autoral.

Trilha 'disco' da novela 'Boogie oogie' inclui gravações de Gal, Rita e Tim

Com lançamento em CD previsto para setembro de 2014, em edição da gravadora Som Livre, a trilha sonora da novela Boogie oogie (TV Globo) inclui vários hits da disco music, já que a trama de Rui Vilhena é ambientada em 1978, auge dos dancin' days. Sucesso lançado pelo cantor e compositor carioca Tim Maia (1942 - 1998) em seu álbum Disco club (Warner Music, 1978), Sossego é um dos fonogramas nacionais selecionados para a trilha de Boogie oogie pelo produtor musical Eduardo Queiroz e por Mariozinho Rocha, diretor musical da Rede Globo de Televisão. Quase todas as músicas são dos anos 1970, mas muitas extrapolam o universo das discotecas. Na ala nacional, há gravações de Caetano Veloso (London London, canção do artista baiano, lançada em seu álbum londrino de 1971), Gal Costa (Barato total, música de Gilberto Gil lançada por Gal em 1974), Hyldon (As dores do mundo, tema do próprio Hyldon que despontou em álbum de 1975), Jorge Ben Jor (Minha teimosia, uma arma para te conquistar, música de Ben lançada em 1974), Lady Zu (A noite vai chegar, funk-disco de Paulinho Camargo gravado por Zu em compacto de 1977), Novos Baianos (Acabou chorare, música de Luiz Galvão e Moraes Moreira que deu título ao álbum lançado pelo grupo em 1972) e Rita Lee (Coisas da vida, balada de Rita, gravada pela compositora em 1976). Parceria de Baby do Brasil com Pepeu Gomes, Deusa do amor é a única música nacional deslocada no tempo da trama e da trilha sonora de Boogie oogie, já que foi lançada por Pepeu em seu álbum de 1983.

sábado, 30 de agosto de 2014

Moska lança 'single' com gravação de 'Enrosca', hit de Fábio Jr. em 1982

Música do cantor e compositor carioca Guilherme Lamounier lançada pelo autor em 1977, regravada pelo cantor paulistano Fábio Jr. em 1982 com sucesso e revivida após quase 20 anos pelo cantor paulista Junior Lima (da dupla Sandy & Junior) em 2001, Enrosca ganha a voz do cantor e compositor carioca Moska. Feita para a trilha sonora da novela Império (TV Globo, 2014), a gravação - calcada no violão de Moska e de tom folk - está sendo lançada em single.

Zizi inicia, em São Paulo, a gravação de uma música (inédita) de Zeca Baleiro

Zizi Possi iniciou em São Paulo (SP) a gravação de uma música inédita composta pelo artista maranhense Zeca Baleiro para a cantora paulistana. A música se chama O mar me leva e está sendo gravada para um EP. Zizi - em foto de Rama Oliveira - já pôs a voz-guia. A gravação do disco vai ganhar o reforço de músicos portugueses, em Lisboa,  para depois ser finalizada no Brasil.

Pedro Luís vai gravar primeiro DVD solo em ateliê de artista plástico carioca

Situado na Zona Norte da cidade do Rio de Janeiro, o ateliê do cenógrafo e artista plástico carioca Sérgio Marimba foi a locação escolhida pelo cantor e compositor carioca Pedro Luís para a gravação do primeiro DVD e CD ao vivo de sua carreira solo. Estão programadas as participações das cantoras Nina Becker e Zélia Duncan no registro ao vivo, agendado para 31 de agosto de 2014. O DVD vai ser gravado em show para convidados, sob direção da atriz e jornalista Bianca Ramoneda e do fotógrafo Jorge Bispo - autor da foto de Pedro inspirada na icônica pose dos integrantes do grupo inglês The Beatles posta na capa de seu álbum de estúdio Abbey Road (Apple Records, 1969).

Memórias de Menotti & Fabiano reavivam tempo de melodia no sertanejo

Resenha de CD
Título: Memórias anos 80 & 90
Artista: César Menotti & Fabiano
Gravadora: Som Livre
Cotação: * * * 1/2

Em constante mutação desde 1929, ano em que começou a ser formatada pelo jornalista e folclorista paulista Cornélio Pires (1884 - 1958) com a junção de causos a cânticos tradicionais do interior do Brasil, a música sertaneja atualmente incorpora todos os códigos e símbolos da música pop. O processo de modernização começou no fim dos anos 1960 - quando a dupla goiana Léo Canhoto & Robertinho incorporou à guitarra elétrica ao gênero, adotando visual-ostentação - e seguiu pela década de 1970. A partir dos anos 1980, a balada romântica de caráter sentimental passa a ser o ritmo (pre)dominante no universo sertanejo sem diluir a influência das guarânias paraguaias e das rancheras mexicanas (estas associadas ao universo mariachi). Dupla sertaneja originária da cidade mineira de Ponte Nova (MG), César Menotti & Fabiano reavivam esses tempos em que a melodia era abundante na música sertaneja - hoje mais diluída na mistura pop com ritmos dançantes como arrocha e funk - no sétimo título de sua discografia. Projeto duplo que celebra a primeira década de carreira fonográfica da dupla e que está sendo lançado nos formatos de CD e LP, via Som Livre, Memórias anos 80 & 90 é o melhor disco da dupla por conta da reunião de um repertório entranhado nas lembranças afetivas de um Brasil imune aos modismos e aos hypes musicais ditados pela imprensa do eixo Rio de Janeiro - São Paulo. Com seu canto em dupla enraizado nas tradições da música caipira (calcada na forma anasalada e exteriorizada da exposição vocal), César Menotti & Fabiano revivem - sem inventar moda - 35 músicas que passaram na peneira do tempo sertanejo com suas melodias e versos simples que cativaram o público fiel do gênero por seu poder de sedução. Alocadas em 28 faixas por conta dos sete medleys do disco duplo, essas 35 músicas foram - em sua maioria - sucessos consumidos pela massa anônima que dá o tom sertanejo do Brasil. Nem todas foram hits, mas todas se alinham pelo caráter melódico e pela forma direta de falar de amor e dor. Talvez a mais conhecida em todo o Brasil seja a guarânia Nuvem de lágrimas (Paulo Debétio e Paulinho Rezende, 1989), música que extrapolou o universo sertanejo ao quebrar a barreira das FMs cariocas na gravação feita pela cantora paraense Fafá de Belém com a dupla paranaense Chitãozinho & Xororó, pioneira na conquista do mercado urbano de Rio de Janeiro e São Paulo. Do repertório de Chitãozinho & Xororó, a propósito, são quatro das 35 músicas do disco. Nem todas foram retumbantes sucessos nacionais - caso de Só quem amou demais (Fatima Leão, Alexandre e Netto), canção gravada pela dupla em álbum de 1995 - mas todas estão em sintonia com o conceito de Memórias anos 80 & 90. Também pioneira, a dupla Matogrosso & Mathias - autointitulada A mais romântica do Brasil - pavimentou essa estrada sertaneja desde os anos 1970, alcançando grande sucesso nessa década em que já adotaram o estilo romântico e emplacaram sucessos como Espinhos da vida (Matogrosso e JK Filho, 1976) e Pedaço de minha vida (Matias e Nascimento, 1977), que, embora não sejam dos anos 1980, estão no disco unidos por Menotti & Fabiano em medley gravado em tom tradicional, de raiz, com a participação de seu tio Alalino, responsável por mostrar aos cantores boa parte dessas músicas (a tia Neiva ajuda a dupla a passar a limpo Camisa branca, hit da dupla Mococa & Paraíso em 1987). Da década de 1980 - realmente - é De igual para igual, a parceria de Matogrosso com Roberta Miranda que alavancou em 1985 a carreira da então emergente cantora e compositora paraibana e que fez sucesso no eixo Rio-São Paulo na voz do cantor carioca José Augusto. Também do repertório de Matogrosso & Mathias é Memória (Fátima Leão, Matogrosso e Cida Moraes), música que batiza e abre o CD duplo de Menotti & Fabiano, mas grafada no plural, como Memórias. Fátima Leão, Roberta Miranda, a dupla Christian & Ralf - representada pelas autorais Chora peito (1986) e Ausência (1987) - e Carlos Randall são compositores recorrentes nas 35 músicas deste disco duplo em que César Menotti e Fabiano mostram que já temos um honroso e melódico passado sertanejo. 

sexta-feira, 29 de agosto de 2014

'Arte na capa' expõe fatos e curiosidades sobre as embalagens de 26 discos

Série assinada por João Felipe Freitas que vai ser apresentada ao longo da programação do Canal Brasil a partir de 1º de setembro de 2014, sem horário fixo, Arte na capa vai expor na tela da TV fatos e curiosidades sobre o design e a embalagens de 26 títulos da discografia brasileira. Primeiro álbum de Luiz Melodia (Philips, 1973), Pérola negra é assunto de um dos 26 episódios. Como sinaliza a foto de Juliana Torres, o próprio cantor e compositor carioca detalha a gênese da emblemática capa do LP. Melodia conta que a foto da capa - na qual o artista aparece em banheira, segurando um globo terrestre - foi feita em ferro velho situado no bairro carioca de Copacabana. Os grãos de feijão que circundam a capa foi ideia do próprio Melodia, que queria representar na capa do disco a fome que assola o Brasil. Já a contracapa de Pérola negra expõe mosaico de fotos em que aparecem amigos de infância do cantor, criados no Morro de São Carlos, no Estácio, na cidade do Rio de Janeiro (RJ), lugar que inspirou o álbum que impulsionou a carreira do artista carioca no mercado fonográfico há 42 anos.

Elza decide fazer em Porto Alegre o registro do show em que canta Lupicínio

 Principal homenagem prestada ao compositor gaúcho Lupicínio Rodrigues (1914 - 1974) no ano em que o Brasil festeja timidamente o centenário de nascimento do autor de músicas como Nervos de aço (1947) e Vingança (1951), o show Elza Soares canta Lupicínio Rodrigues pode ganhar registro audiovisual ainda em 2014. A cantora carioca - em foto de Rodrigo Braga - planeja gravar o show em apresentação feita na cidade gaúcha de Porto Alegre, terra natal de Lupicínio. Clique aqui para (re)ler a resenha do show que estreou em maio, no Teatro Rival, no Rio de Janeiro (RJ).

Embora fluente, a biografia de Edu paira na superfície rasa dos perfis oficiais

Resenha de livro
Título: Edu Lobo - São bonitas as canções - Uma biografia musical
Autor: Eric Nepomuceno
Editora: Edições de Janeiro
Cotação: * * *

Ao fim da biografia oficial de Edu Lobo, (bem) escrita pelo jornalista Eric Nepomuceno, há um capítulo intitulado Notas pessoais em que o autor expõe os efeitos que a ausência do pai provocou na infância do cantor, compositor, músico e arranjador carioca, que completa hoje 71 anos. O pai era o compositor e jornalista pernambucano Fernando Lobo (1915 -1996), autor de músicas como Chuvas de verão (1949). Pai e filho nunca foram íntimos, mesmo quando Edu passou a conviver mais com Fernando, na adolescência e início da juventude. Mesmo feita sem aprofundamento, a abordagem dessa questão familiar é um dos raros momentos em que Eric Nepomuceno aproxima o homem Edu Lobo do leitor de São bonitas as canções. Escrita com fluência, a biografia paira na superfície dos perfis oficiais. Até porque o biógrafo é amigo pessoal do biografado há quase 50 anos. Para preservar a amizade e o caráter chapa branca do luxuoso livro recém-posto no mercado via Edições de Janeiro, o escritor jamais ultrapassa o limite da intimidade consentida e tampouco desrespeita os interesses do amigo. Na sequência desse único capítulo de tom mais pessoal, há outro - intitulado Ainda música - em que o autor revela curiosidades sobre a vida cotidiana de Edu, como sua habilidade no preparo de risotos (sobretudo o de lagosta com abóbora) e na imitação de colegas compositores como o carioca Antonio Carlos Jobim (1927 - 1994) e o pernambucano Lenine. De todo modo, justiça seja feita, o livro cumpre o que promete na capa: é uma confiável biografia musical de Edu Lobo. Nepomuceno reconstitui os principais passos da vida profissional do artista com conhecimento de causa - como fica claro no capítulo 12, Uma obra com cheiro de mato e de mar, de tom mais analítico. Embora nem sempre se detenha no detalhamento da gênese de títulos importantes da discografia de Edu, como o álbum Limite das águas (Continental, 1976), o autor traça com propriedade os caminhos trilhados pelo compositor. Do apogeu comercial da era dos festivais, duplamente vencidos com Arrastão (Edu Lobo e Vinicius de Moraes, 1965) e Ponteio (Edu Lobo e José Carlos Capinam, 1967), ao progressivo recolhimento voluntário para se dedicar ao ofício de compositor e arranjador de trilhas criadas sob encomenda, Edu Lobo seguiu rota coerente, sem concessões ao volátil mercado. "É bom saber como a fama é, e pular fora quando ainda há tempo. Porque, quando você assume um compromisso com a fama, tem que se comprometer com todas as suas ramificações. Tem de acompanhar de perto o que está tocando no rádio, o que está vendendo, e vai acabar compondo não pensando na sua música, mas no que vende. Vai compor para o mercado. Você vai ter de se transformar para não perder o tamanho da fama conquistada, e essa fama acaba sendo seu maior compromisso. A única saída será deixar de ser você para virar aquele produto da fama. Eu jamais quis isso", ratifica Edu, coberto de razão, para Nepomuceno em depoimento lapidar que aponta os certeiros caminhos seguidos pelo artista na pavimentação de sua obra, de sua estrada nobre. É pena que, em nome do compromisso com a amizade e com o tom oficial do livro, o biógrafo tenha se contentado com algumas respostas vagas. A insatisfação do compositor com a trilha sonora do musical Deus lhe pague (1976) - composta por Edu com Vinicius de Moraes (1913 - 1980) - poderia ter sido mais investigada, para citar somente um exemplo de que como a amizade entre biógrafo e biografado pode ter sido um entrave que impediu o livro de abordar a obra do artista com mais detalhes e profundidade. Mesmo assim, o bom acabamento do texto - que amarra o início ao fim da narrativa com histórias da primeira parceria de Edu com Vinicius - torna o livro recomendável. A exposição de fotos raras - de todas as fases da vida de Edu - também contribui para aumentar bastante o poder de atração da biografia São bonitas as canções. Embora muitas vezes superficial, é bonito o livro de tom oficial.

Em sintonia com Hamilton, Diogo reitera sua evolução no show 'Bossa negra'

Resenha de show
Título: Bossa negra
Artistas: Diogo Nogueira e Hamilton de Holanda (em foto de Rodrigo Goffredo)
Local: Theatro Net Rio (Rio de Janeiro, RJ)
Data: 27 de agosto de 2014
Cotação: * * * * 1/2
Show em cartaz na casa Imperator, no Rio de Janeiro (RJ), em 10 de setembro de 2014

O show Bossa negra mostra a quem quiser ouvir - sem preconceito - que Diogo Nogueira se tornou um excelente cantor. Projetado na segunda metade dos anos 2000, o artista carioca se revelou inseguro nos shows iniciais, mas foi se aprimorando na escola do palco e, nos últimos espetáculos, já vinha mostrando grande progresso e desenvoltura em cena. O projeto com Hamilton de Holanda - nascido de um show feito pelo cantor carioca com o bandolinista também carioca em 2009, em Miami (EUA) - é a coroação da evolução do filho de João Nogueira (1941 - 2000), que dá show de interpretação em músicas como Doce flor (Hamilton de Holanda, Marcos Portinari, Diogo Nogueira, André Vasconcellos e Thiago da Serrinha, 2014). Feita na sequência imediata do lançamento do disco, recebido com unanimidade positiva pela crítica, a estreia nacional do show Bossa negra reitera o upgrade do cantor. Para Hamilton, o projeto reafirma a sua maestria no toque do bandolim e adiciona dose de popularidade ao seu nome por juntá-lo com um artista jovem que já tem público fiel. Para Diogo, Bossa negra - tanto o disco como o show que debutou em cena no Theatro Net Rio, no Rio de Janeiro (RJ), de 25 a 27 de agosto de 2014 - representa aquisição de status no mercado fonográfico. Não fosse pela interpretação menos rigorosa de Sem compromisso (Nelson Trigueiro e Geraldo Pereira, 1954), samba abordado já no relaxado bis, o show teria reeditado a perfeição do disco gravado sob a direção de Hamilton. Em cena, a Bossa negra tem realçado o tempero jazzístico entranhado na sonoridade do CD. O jazz cheio de bossa bem brasileira é percebido já no toque do bandolim de Hamilton na execução do exuberante samba que dá título ao projeto, Bossa negra (Hamilton de Holanda, Marcos Portinari e Diogo Nogueira, 2014), primeira das 20 músicas enfileiradas no roteiro da apresentação de 27 de agosto. São 20 músicas se contabilizada a citação de Berimbau (Baden Powell e Vinicius de Moraes, 1964) feita ao fim do afro-samba Canto de Ossanha (Baden Powell e Vinicius de Moraes, 1966), música ausente do disco, mas presente em espírito, já que os afro-sambas foram a principal fonte de inspiração do projeto. O show ressalta também o acento percussivo do toque do bandolim de Hamilton, evidente em sambas como Bicho da terra (Diogo Nogueira, Bruno Barreto, Wallace Perez e Hamilton de Holanda, 2014) e no já mencionado Canto de Ossanha. Com seu canto exteriorizado, Diogo se mostra totalmente à vontade na divisão e nos scats imprimidos em Batendo a porta (João Nogueira e Paulo César Pinheiro, 1974). Neste sucesso de seu pai, João Nogueira, o jazz vem também do toque do baixo de André Vasconcellos, músico que divide o palco com Diogo, Hamilton e com o percussionista Thiago da Serrinha. Já Brasil de hoje (Hamilton de Holanda, Arlindo Cruz, Marcos Portinari e Diogo Nogueira, 2014) sobressai em cena (também) pela entrada do coro infantil formado pelos filhos dos artistas. É quando Diogo senta no palco e direciona o seu microfone para as crianças, que cantam sem virtuosismos vocais, com a naturalidade e a espontaneidade de suas poucas idades. Sempre em fina sintonia com Hamilton, o cantor remexe no Vatapá de Dorival Caymmi (1914 - 2008) sem aguar a receita dada pelo centenário compositor baiano em 1942. Ao fim do número, Diogo, Hamilton e Thiago da Serrinha batucam nos tamborins que formam o cenário interativo criado pela designer Marina Ribas com Fred Gelli. Dois números mais tarde, abordagem apoteótica do samba-canção Risque (Ary Barroso, 1952) confirma a interação entre Diogo e Hamilton em cena.  A bossa negra conserva no palco a pegada do excelente CD homônimo.

quinta-feira, 28 de agosto de 2014

Em cena, 'Bossa negra' ganha o tempero do jazz e do 'Vatapá' de Caymmi

Inspirado pelos afro-sambas compostos por Baden Powell (1937 - 2000) com Vinicius de Moraes (1913 - 1980), o álbum Bossa negra (Universal Music, 2014) - lançado neste mês de agosto pelo cantor e compositor Diogo Nogueira com o compositor e bandolinista Hamilton de Holanda - tem sutis toques de jazz à moda brasileira. No show, que estreou no Rio de Janeiro (RJ) em três apresentações que lotaram o Theatro Net Rio de 25 a 27 de agosto, o tempero do jazz sobressai mais em saboroso roteiro ao qual os artistas cariocas adicionam os infalíveis ingredientes do Vatapá receitado em 1942 pelo centenário compositor baiano Dorival Caymmi (1914 - 2008). O afro-samba Canto de Ossanha (Baden Powell e Vinicius de Moraes, 1966) e os - azeitados - sambas Batendo a porta (João Nogueira e Paulo César Pinheiro, 1974) e Sem compromisso (Nelson Trigueiro e Geraldo Pereira, 1954) também encorpam o roteiro, alocados entre as 14 musicas do CD Bossa negra. Eis o roteiro seguido por Diogo Nogueira e Hamilton de Holanda - em foto de Rodrigo Goffredo - em 27 de agosto de 2014 na apresentação do show Bossa negra que lotou o Theatro Net Rio, no Rio de Janeiro, a cidade natal dos bambas:

1. Bossa negra (Hamilton de Holanda, Marcos Portinari e Diogo Nogueira, 2014)
2. Desde que o samba é samba (Caetano Veloso, 1993)
3. Mais um dia (Hamilton de Holanda, Marcos Portinari, Diogo Nogueira, André Vasconcellos e Thiago da Serrinha, 2014)
4. Bicho da terra (Diogo Nogueira, Bruno Barreto, Wallace Perez e Hamilton de Holanda, 2014)
5. Batendo a porta (João Nogueira e Paulo César Pinheiro, 1974)
6. Salamandra (João Nogueira e Paulo César Pinheiro, 2014)
7. Brasil de hoje (Hamilton de Holanda, Arlindo Cruz, Marcos Portinari e Diogo Nogueira, 2014)
8. Até a volta (Hamilton de Holanda, Marcos Portinari e Diogo Nogueira, 2014) /
9. Tá (Hamilton de Holanda e Thiago da Serrinha, 2014)
10. Doce flor (Hamilton de Holanda, Marcos Portinari, Diogo Nogueira, André Vasconcellos e Thiago da Serrinha, 2014)
11. Vatapá (Dorival Caymmi, 1942)
12. O que é o amor (Arlindo Cruz , Maurição e Fred Camacho, 2007)
13. Risque (Ary Barroso, 1952)
14. Mineira (João Nogueira e Paulo César Pinheiro, 1975) /
15. Samba de Arerê (Arlindo Cruz, Xande de Pilares e Mauro Jr., 1999)
16. Mundo melhor (Pixinguinha e Vinícius de Moraes, 1962)
Bis:
17. Canto de Ossanha (Baden Powell e Vinicius de Moraes, 1966) /
18. Berimbau (Baden Powell e Vinicius de Moraes, 1964)
19. Sem compromisso (Nelson Trigueiro e Geraldo Pereira, 1954)
20. Bossa negra (Hamilton de Holanda, Marcos Portinari e Diogo Nogueira, 2014)

Coral infantil 'Bossinha negra' valoriza show de Diogo e Hamilton no Rio

Tal como no disco Bossa negra (Universal Music), lançado por Diogo Nogueira com Hamilton de Holanda neste mês de agosto de 2014, o show Bossa negra ganha o reforço de coro infantil no samba Brasil de hoje, composto pelo cantor carioca e o bandolinista também carioca (mas de criação brasiliense) em afinada parceria com Arlindo Cruz e com Marcos Portinari. Tirada na apresentação de 27 de agosto, a foto de Rodrigo Goffredo capta o momento em que Diogo Nogueira sentou no palco do Theatro Net Rio e direcionou o microfone para o coral infantil formado por Antônio Portinari, Davi Nogueira, Gabriel de Holanda,  Rafaela de Holanda, Theo Carvalho e Yuri Carvalho - filhos dos artistas e de integrantes da produção do espetáculo. É o coral Bossinha negra, como batizou Diogo em cena. A turnê nacional do show Bossa negra estreou no Theatro Net Rio, no Rio de Janeiro (RJ), de 25 a 27 de agosto, no embalo da ótima receptividade obtida pelo disco homônimo. Já há uma quarta apresentação programada na cidade para 10 de setembro, no Imperator, a casa de shows do Centro Cultural João Nogueira.

Senise segue passos do jazz em 'Danças', CD em que toca Baden e Alf

 O saxofonista e flautista Mauro Senise está lançando via Biscoito Fino um álbum, Danças, em que segue os passos do jazz em músicas como Miles, tema de autoria de Sueli Costa. No CD, Senise toca temas compostos por músicos como Antonio Adolfo (Chorosa blues), Cristóvão Bastos (Choro do mestres e Sem palavras) e Gilson Peranzzetta (Casa de Marimbondo e Levitando) entre abordagens dos sucessos Ilusão à toa (Johnny Alf, 1961) e Vou deitar e rolar (Baden Powell e Paulo César Pinheiro, 1970). O CD tem um complemento visual, vindo com DVD que exibe clipes de quatro músicas, filmados pelo diretor Walter Carvalho com requinte e acabamento cinematográfico. Garoto de POA (Jota Moraes), Choro dos mestres (Cristóvão Bastos), Casa de marimbondo (Gilson Peranzzetta) e Harmonia das esferas (Gabriel Geszti) são as quatro músicas que ganharam tratamento visual no DVD que junta música, dança e cinema. 

Astro do nicho pop sertanejo, Lucco lança primeiro registro ao vivo de show

 Jovem astro do segmento pop sertanejo que tem a máquina da gravadora Sony Music acionada a seu favor, Lucas Lucco - nome artístico do cantor e compositor mineiro Lucas Corrêa Oliveira, de 23 anos - está lançando seu primeiro registro ao vivo de show. Produzida por Dudu Borges, a gravação ao vivo de Lucco foi feita em 7 de abril deste ano de 2014 em apresentação realizada pelo cantor em sua cidade natal, a mineira e interiorana Patrocínio. O CD e DVD O destino - Ao vivo em Patrocínio / MG sucede os álbuns de estúdio Nem te conto (Damasceno Music, 2013) e Tá diferente (Sony Music, 2014). O DVD exibe o clipe da atual música de trabalho do artista, 11 vidas, composição do próprio Lucco. Ao longo do roteiro que totaliza 21 músicas, o cantor recebe convidados como Anitta - que bisa ao vivo o dueto na música Beijar à queima-roupa (Lucas Lucco, Flavinho do Kadet, Tierry Coringa e Rafinha RSQ), feito originalmente no álbum Tá diferente - e a dupla Fernando & Sorocaba, presente na faixa Foi daquele jeito. Lucco rebobina no CD e DVD seu sucesso autoral Mozão, lançado em 2013, quando o cantor ainda despontava no universo sertanejo.

quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Livro 'Pavões misteriosos' refaz voo da MPB rumo ao pop dos anos 1980

Resenha de livro
Título: Pavões misteriosos 1974 - 1983: a explosão da música pop no Brasil
Autor: André Barcinski
Editora: Três Estrelas
Cotação: * * * 1/2

O grande mérito do livro Pavões misteriosos é enfocar um período pouco analisado da evolução da música brasileira. De 1974 a 1983, a MPB surgida na era dos festivais dos anos 1960 - e até então cristalizada e consolidada no mercado fonográfico brasileiro, em que pesem as modestas vendas dos discos de seus ícones - foi ganhando progressivo sotaque pop. Big bang que detonou essa explosão pop, o aparecimento do trio Secos & Molhados em 1973 - com imediato sucesso nacional - é o ponto de partida desse livro-reportagem escrito por André Barcinski, um dos melhores jornalistas musicais do Brasil. Com texto envolvente e cheio de estilo, Barcinski mapeia os principais acontecimentos do período 1974 - 1983, parando no surgimento da geração pop roqueira dos anos 1980 que deu uma blitz na MPB e a empurrou progressivamente para os guetos e nichos do mercado fonográfico nacional. A divisão dos capítulos e temas por ano resulta por vezes incerta - porque o estouro de um artista ou movimento geralmente tem ramificações em anos anteriores e gera consequências em anos futuros - mas ajuda a ordenar a linha evolutiva traçada pelo autor no livro recém-lançado pela editora Três Estrelas. A profusão de nomes e assuntos envolvidos em Pavões misteriosos impede um maior aprofundamento dos temas, mas o que conta é a maneira como Barcinski organiza os fatos e os movimentos para mostrar a progressiva imersão da música brasileira no universo pop com consequências artísticas que ainda hoje gera debates calorosos. No fim de Pavões misteriosos, o autor exemplifica a guinada pop da MPB ao lembrar como cantores do gênero, como Gal Costa, aderiram a um repertório mais popular em discos de tom mais comercial. Por seu valor documental, um dos capítulos mais interessantes do livro - situado pelo autor no ano de 1975 - é o que historia a onda de cantores brasileiros que adotaram nomes estrangeiros e repertório em inglês e, se passando por gringos, gravaram canções que escalaram rapidamente as paradas, algumas com a ajuda providencial de sua inclusão em trilhas de novelas da TV Globo. Uma das mais famosas, Feelings, foi gravada em 1974 pelo carioca Maurício Alberto Kaiserman, mais conhecido na época como Morris Albert. No mesmo capítulo, o livro aborda o sucesso comercial feito pelo legítimo roqueiro baiano Raul Seixas (1945 - 1989), fazendo breve análise da trajetória do Maluco Beleza. Na sequência, Barcinski historia a explosão do cantor e compositor paulista Guilherme Arantes - cuja gravação da balada Meu mundo e nada mais em 1976 é marco do pop nacional - e mostra de relance as regras do jogo entre artistas prestigiados e artistas considerados cafonas pela popularidade de sua música pop. Estigma sofrido por Arantes, a quem Elis Regina (1945 - 1982) recorreria em busca de um hit que oxigenasse sua carreira do ponto de vista comercial.  "A Elis me ligou, ela queria um sucesso de qualquer jeito", lembra Arantes, que forneceu o hit Aprendendo a jogar (1980) para a Pimentinha. Sucesso não faltou para cantores populares como o goiano Odair José e o carioca Sidney Magalhães, transformado pelo produtor, compositor e empresário argentino Roberto Livi no cigano Sidney Magal em 1976. Assunto principal do capítulo situado por Barcinski em 1978, Magal reinou em pleno apogeu da disco music, tema iniciado no capítulo de 1977 e desenvolvido ao longo do livro porque o estouro mundial das discotecas mudaram momentaneamente os rumos da indústria fonográfica, afetando a MPB. Aliás, no capítulo intitulado Quanto mais purpurina melhor, Pavões misteriosos mostra como ícones da MPB - como Fagner, a já mencionada Gal Costa, Gilberto Gil e Rita Lee, entre outros - foram se rendendo às exigências do mercado a partir de 1979. E vieram então os anos 1980 com a produção de teclados, jabás, grupos infantis e hitmakers em escala industrial. A propósito, o livro termina sintomaticamente em 1983, ano do primeiro sucesso - Me dê motivo, hit nacional no vozeirão soul de Tim Maia (1942 - 1998) - da dupla de hitmakers formada por Michael Sullivan com Paulo Massadas. Começava a era Sullivan & Massadas, dupla à qual gigantes da MPB recorreram para não serem abafados pela explosão comercial do rock brasileiro dos anos 1980. Com narrativa ágil e bem estruturada, típica mais das grandes reportagens do que das teses acadêmicas, o livro Pavões misteriosos merece atenção por mostrar que o voo pop da música brasileira - que alcançaria altitudes impensáveis ao longo dos implacáveis anos 1980 - foi progressivamente arquitetado entre corujas, pirilampos e a purpurina da década de 1970.

Voz do pop funk, Ludmilla lança 'Hoje', álbum que reúne Belo e Buchecha

No rastro do sucesso comercial obtido com a aposta em Anitta, a gravadora Warner Music joga suas fichas em outra cantora e compositora de estilo pop funk, Ludmilla, nome artístico da carioca Ludmila Oliveira da Silva. Anteriormente conhecida como MC Beyoncé, Ludmilla está lançando aos 19 anos seu primeiro álbum, Hoje. No iTunes desde 11 de agosto de 2014, o álbum chega esta semana às lojas com 14 músicas. Uma delas, Fala mal de mim, é a música que projetou Ludmilla em escala nacional ao ter seu áudio postado no YouTube em maio de 2012. Pelo mesmo canal de vídeo, a cantora está promovendo atualmente Sem querer, uma das faixas do disco. Hoje tem as participações dos cantores Belo e Buchecha, convidados de Não quero mais e Tudo vale a pena, respectivamente. Garota recalcada e Morrer de viver são outras músicas do disco autoral lançado pela Warner Music no mesmo estilo pop funk de Anitta.

Selo Slap anuncia a contratação de Céu, que vai lançar 'best of' em DVD

Vinculado à gravadora carioca Som Livre, o selo Slap anunciou a contratação da cantora e compositora paulistana Céu. A artista vai debutar no selo com a edição em CD e DVD da gravação ao vivo captada em 30 de julho de 2014 no show feito por Céu no Centro Cultural Rio Verde, em São Paulo (SP). Embora Céu já tenha revelado a intenção de fazer o registro audiovisual do show em que canta o repertório de Catch a fire (Island Records, 1973), álbum clássico da discografia do cantor e compositor jamaicano de reggae Bob Marley (1945-1981), a apresentação gravada foi um show de caráter retrospectivo, no estilo best of. Na foto acima, extraída da página do Centro Cultural Rio Verde no Facebook, Céu aparece na gravação do show em que dá voz a sucessos como Lenda (Céu, Alec Haiat e Graziella Moretto, 2005), Malemolência (Céu e Alec Haiat, 2005) e 10 Contados (Céu e Alec Haiat, 2005). Sai este ano.

Roupa Nova relança, em formato digital, o EP embalado em caixa de 2013

Em 2013, quando relançou cinco DVDs na caixa Roupa Nova Music,  o grupo carioca Roupa Nova adicionou ao produto um EP com seis músicas inéditas. Esse EP está sendo relançado no iTunes de forma avulsa, via Sony Music, neste mês de agosto de 2014. O disco traz as músicas O meu pensamento voa muito mais, Perdi tanto tempo, Sonho impossível, Ser melhor, Segredos do coração - versão em português de Ricardo Feghali para Happy man (Peter Cetera), sucesso do grupo norte-americano Chicago em 1974 - e A festa. O EP já está à venda.

Patricia Marx estende retrospectiva dos 30 anos de carreira em sextapes

Patricia Marx dá sequência à retrospectiva de suas três décadas de carreira - iniciada com o CD Trinta (Lab 344, 2013) e o DVD Trinta ao vivo (Lab 344, 2013) - com série de quatro sextapes. Já em pré-venda no iTunes, o primeiro - intitulado Te cuida meu bem (Sextape, pt. 1) - tem lançamento programado para 16 de setembro de 2014. Neste EP editado somente em formato digital, a cantora e compositora paulista reprocessa duas músicas da fase infanto-juvenil de sua discografia. Além da música-título Te cuida meu bem (Michael Sullivan e Paulo Massadas, 1987), do primeiro LP solo, Marx revisa - com seu olhar contemporâneo - Destino (Marcos Valle e Paulo Sérgio Valle, 1991), sucesso de seu álbum Incertezas (BMG-Ariola, 1991).

terça-feira, 26 de agosto de 2014

Eis a capa de 'Caymmi Centenário', disco que junta Caetano, Chico e Gil

Esta é a capa de Dorival Caymmi - Centenário, álbum lançado pela Biscoito Fino neste mês de agosto de 2014. Idealizado para festejar o centenário de nascimento de Dorival Caymmi (1914 - 2008), o disco tem arranjos sinfônicos divididos entre Dori Caymmi e Mario Adnet. Diferentemente de Caymmi (Som Livre, 2013), álbum de raridades do cancioneiro lapidar de Dorival, gravado por Dori com seus irmãos Danilo e Nana Caymmi, Dorival Caymmi - Centenário está centrado nos grandes sucessos do compositor e reúne os três irmãos com Caetano Veloso, Chico Buarque e Gilberto Gil. Juntos, Caetano, Chico e Gil se unem na abordagem do samba O que é que a baiana tem? (Dorival Caymmi, 1939), faixa que abre o CD. Sozinho, Caetano dá voz ao samba-canção Sábado em Copacabana (Dorival Caymmi e Carlos Guinle, 1951) e ao samba Saudade da Bahia (Dorival Caymmi, 1957). Solo, Gil cai no Samba da minha terra (Dorival Caymmi, 1940) e canta Rosa Morena (Dorival Caymmi, 1942). Já Chico sola Dora (Dorival Caymmi, 1945) e Marina (Dorival Caymmi, 1947). Por sua vez, Danilo canta sozinho Nem eu (Dorival Caymmi, 1952) e remexe no Vatapá (Dorival Caymmi, 1942) enquanto Nana reconta A lenda do Abaeté (Dorival Caymmi, 1948) e se embrenha no Sargaço mar (Dorival Caymmi, 1985). Além de arranjar metade do disco, Dori canta João Valentão (Dorival Caymmi, 1953) e O bem do mar (Dorival Caymmi, 1952) assim como Adnet dá voz ao samba A vizinha do lado (Dorival Caymmi, 1946). Juntos, os três irmãos Caymmi entoam a Canção da partida (Dorival Caymmi, 1957). O CD já está no iTunes.

Álbum da Banda do Mar irradia luzes da cidade nova de Camelo e Mallu

Resenha de CD
Título: Banda do Mar
Artista: Banda do Mar
Gravadora: Sony Music
Cotação: * * * * 1/2

A rigor, a Banda do Mar é um trio luso-brasileiro formado pelo carioca Marcelo Camelo (voz, guitarra, violão, baixo e percussão) e a paulistana Mallu Magalhães (voz, guitarra e violão) com o português Fred Pinto Ferreira (bateria e percussão). Mas a Banda do Mar é também - e sobretudo, como mostra o álbum Banda do Mar - uma dupla formada por Camelo e Mallu. Por mais que a bateria de Fred ajude a construir a arquitetura pop do disco, o ótimo músico lusitano é coadjuvante sem força para chegar a formar a terceira ponta do triângulo neste álbum de casal. Lançado hoje (26 de agosto de 2014) pela Sony Music, o CD Banda do Mar é exatamente o que haviam sinalizado as músicas - Hey Nana (Marcelo Camelo), Mais ninguém (Mallu Magalhães) e Muitos chocolates (Mallu Magalhães) - previamente disponibilizadas nas plataformas de música digital. Trata-se de um disco pop, de vibe roqueira, que expõe a harmonia musical e conjugal do casal Camello e Mallu, ora residente em Lisboa. Na contramão da introspecção melancólica que pautou discos anteriores dela e (sobretudo) dele, o som da Banda do Mar é extrovertido, exteriorizado, um desfolhar de rosa, como diz verso de Cidade nova (Marcelo Camelo), a música que abre o disco produzido e arranjado pela própria Banda do Mar. O repertório é formado por 12 músicas inéditas. Sete são de autoria solitária de Camelo. As outras cinco são assinadas por Mallu sem parceiros. Cada um sola a sua música, embora Mallu faça vocais em músicas de Camelo como Pode ser e Vamo embora. Em essência, o álbum Banda do Mar é uma declaração de amor de Camelo para Mallu e vice-versa. "(...) Olha, menininha, tudo que eu faço é pelo seu amor", derrete-se ele em versos de sua canção autoral Faz tempo, de constituição melódica típica do hermano"Meu bem, você para mim é privilégio / Sorte grande de uma vez na vida / Minha chance de ter alegria/ (...) / Somos nosso próprio rei", retribui Mallu em sua canção Seja como for. O título de outra música de Mallu - Me sinto ótima, rock de acento country - reitera a atmosfera de felicidade zen e o leve estado de espírito que permeiam o álbum e que evocam o clima desencanado do som do trio Tribalistas. Com tanto mel, o disco poderia soar adocicado, mas se desvia da trilha sentimental no toque de suas guitarras e, além do mais, tem um frescor pop que anula qualquer eventual resquício de sentimentalismo. Acima de tudo, o álbum Banda do Mar soa sincero e cativa porque a safra de inéditas do casal é de ótima qualidade e se afina harmoniosamente. O clima do disco é solar mesmo nas canções mais melodiosas, conduzidas pelo violão, caso de Dia clarear (Marcelo Camelo). Em contrapartida, Mia (Mallu Magalhães) tem pegada. É a faixa em que a Banda do Mar mais soa como um trio porque o toque percussivo de Fred Ferreira é fundamental para a sonoridade mais agitada da faixa. De todo modo, Banda do Mar - o trio e o disco - é projeto de um casal. O álbum Banda do Mar faz a festa do amor correspondido, feliz, sempre em paz, irradiando as luzes da cidade nova de Marcelo Camelo e Mallu Magalhães.

'Box' com CDs e DVD de Raul apresenta dois inéditos registros de shows

 Dois inéditos registros de shows de Raul Seixas (1945 - 1989) vêm à tona no mês em que a morte do cantor e compositor baiano completa 25 anos. As gravações podem ser ouvidas em CDs da caixa Raul Seixas - 25 anos sem o Maluco Beleza - Toca Raul, produzida por Sylvio Passos, presidente do fã-clube Raul Rock Club, para a Eldorado. A caixa embala seis CDs e um DVD do artista. O supra-sumo são os inéditos CDs ao vivo Eu não sou hippie - Ao vivo no Cine Patrocínio 1974 e Isso aqui não é Woodstock, mas um dia pode ser. O primeiro reproduz áudio de show feito por Raul há 40 anos, no auge do sucesso adquirido com o álbum Gita (Philips, 1974). O segundo traz a gravação da apresentação feita por Raul em setembro de 1981 na segunda edição do lendário Festival de Águas Claras, realizada no interior de São Paulo.

Elba finaliza álbum em que vai de Pedro Luís a Cordel, Ambrósio e Nação

Embora esteja às voltas com a recém-iniciada turnê nacional do show Cordas, Gonzaga e afins, em cartaz de agosto a novembro por sete capitais do Brasil, Elba Ramalho pretende finalizar e lançar ainda em 2014 o álbum que vem gravando desde maio sob produção de Luã Mattar e Yuri Queiroga. Falta somente gravar as vozes definitivas. O disco segue a linha pop contemporânea do elogiado Qual o assunto que mais lhe interessa? (Ramax / BrazilMúsica!), lançado em 2007. Elba - vista em foto de Alex Ribeiro - dá voz a músicas de três grupos pernambucanos que emergiram na cena do Recife (PE) dos anos 1990. Projetada há 20 anos, a Nação Zumbi está representada por Risoflora (Chico Science), música de seu primeiro álbum, Da lama ao caos (Chaos / Sony Music, 1994), pedra fundamental do movimento Mangue Beat. Desativado há dez anos, o grupo Mestre Ambrósio (1992 - 2004) é lembrado com Pé-de-calçada, música de Siba gravada pela banda em seu primeiro álbum, Mestre Ambrósio (Rec Beat Discos, 1996). Do Cordel do Fogo Encantado (1999 - 2010), grupo surgido no fim dos anos 1990, Elba revive Nossa Senhora da Paz (Ou o trapézio do sonho) (Lirinha, Clayton Barros, Emerson Calado e Nego Henrique), música do segundo álbum do Cordel, O palhaço do circo sem futuro (Trama, 2002). Do compositor carioca Pedro Luís, nome recorrente na ficha técnica do CD Qual o assunto que mais lhe interessa?, a cantora regrava Fazê o quê?, música do primeiro álbum de Pedro Luís e a Parede, Astronauta tupy (Dubas Música, 1997). Entre inédita de Dani Black com Zélia Duncan (Só pra lembrar) e regravação de parceria de Lenine com Dudu Falcão (É o que me interessa, música de 2008), Elba também dá voz a três músicas do compositor pernambucano Dominguinhos (1941 - 2013). Duas - o fado Passarinho enganador (parceria com Fausto Nilo) e o xote Olhando o coração - são inéditas, sendo que a primeira tem a participação da cantora portuguesa Carminho. A terceira é a canção Contrato de separação (Dominguinhos e Anastácia), lançada em disco de 1979 na voz de Nana Caymmi.

Sacramento migra do samba para o pop em álbum autoral, 'Autorretrato'

"Quis viver o samba / Ir com ele pela estrada / Nem ser mestre, nem ser bamba / Me barraram na entrada / Por aí, foi por um triz / Eu quis o samba / Mas o samba não me quis". Ouvidos já na abertura do nono álbum de Marcos Sacramento, Autorretrato, os versos resignados de O samba não me quis - parceria de Marcos Sacramento com Luiz Flávio Alcofra - dão a pista da guinada do cantor e compositor carioca neste disco previsto para ser lançado em setembro de 2014 pela Superlativa. Em Autorretrato, disco gravado no estúdio Tenda da Raposa no Rio de Janeiro (RJ), Sacramento migra do samba para o pop, fazendo caminho que não irá surpreender quem sabe que o artista iniciou sua carreira, há 30 anos, como vocalista de um grupo carioca de pop rock, Cão sem Dono. Em Autorretrato, Sacramento - visto na capa do disco em foto de Edu Monteiro, da Fotonauta - dá ênfase à sua produção autoral como compositor, até então presente de forma bissexta em álbuns como Sacramentos (Biscoito Fino, 2006) e Na cabeça (Biscoito Fino, 2009). Sacramento assina todas as 13 músicas inéditas do disco produzido e mixado por Daniel Vasques, saxofonista do grupo Brasov que debuta na função de produtor musical com Autorretrato. Das 13 músicas, dez foram compostas pelo artista sem parceiros. As exceções são Carnaval (Zé Paulo Becker e Marcos Sacramento), Dois rios (de Marcos Sacramento com Tiago Torres da Silva) e a já mencionada parceria com Luiz Flávio Alcofra em O samba não me quis, faixa de abertura do primeiro disco gravado por Sacramento com guitarra e bateria. Eis - na ordem do CD, já em processo de fabricação - as 13 músicas autorais do nono título da discografia de Sacramento, Autorretrato:

1. O samba não me quis (Luiz Flávio Alcofra e Marcos Sacramento)
2. Labirinto (Marcos Sacramento)
3. Bichos (Marcos Sacramento)
4. Na rua (Marcos Sacramento)
5. Sacada (Marcos Sacramento)
6. Pá! (Marcos Sacramento)
7. Dois rios (Marcos Sacramento e Tiago Torres da Silva)
8. Três horas da noite (Marcos Sacramento)
9. Sem sal (Marcos Sacramento)
10. Enigma (Marcos Sacramento)
11. Qualquer um (Marcos Sacramento)
12. Carnaval (Zé Paulo Becker e Marcos Sacramento)
13. Sereia na avenida (Marcos Sacramento)

segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Samuel Rosa faz sua 'Saideira' em DVD que Santana lança em setembro

O cantor e compositor mineiro Samuel Rosa figura no elenco de convidados de Corazón Live from México - Live it to believe it, kit de CD e DVD a ser lançado pelo guitarrista mexicano Carlos Santana em setembro de 2014 via Sony Music. Tal como no irregular álbum de estúdio Corazón (Sony Music, 2014), lançado por Santana em 6 de maio, o vocalista, guitarrista e compositor do grupo mineiro Skank faz com seu colega uma versão em espanhol de Saideira (Samuel Rosa e Rodrigo Leão, 1998) no show gravado ao vivo em 14 de dezembro de 2013, na arena VFG, em Guadalajara, no México. Além do show em si, o DVD exibe documentário de 30 minutos sobre o projeto em que Santana faz conexões e duos com cantores da América Latina.

Expressiva capa do CD 'Bossa negra' vai poder ser vista na forma de LP

A expressiva capa criada por Gê Alves Pinto e Thiago Fontin - a partir de foto de Rafaê Silva - para o CD Bossa negra vai poder ser apreciada na forma expandida de LP. Lançado neste mês de agosto pela Universal Music, o álbum de Diogo Nogueira e Hamilton de Holanda vai ganhar edição em vinil até o fim deste ano de 2014. No primeiro semestre de 2015, o cantor e compositor carioca faz mais um registro ao vivo de show - para sua carreira solo - antes de entrar em estúdio para gravar um álbum de inéditas com repertório (essencialmente) autoral.

Ana Cañas prepara álbum em conjunto com Nando Reis em São Paulo

A cantora e compositora Ana Cañas prepara disco com o cantor e compositor Nando Reis, em São Paulo (SP). Não será um disco de duetos, mas um álbum de Cañas produzido por Nando, ainda em fase de pré-produção. Os dois artistas paulistanos já estão se encontrando para escolher repertório e idealizar arranjos. A previsão é de que o disco seja gravado em fevereiro de 2015, no Rio de Janeiro (RJ). O CD expande a cumplicidade musical dos artistas paulistanos - iniciada quando Nando convidou Cañas para fazer dueto na canção Pra você guardei o amor, bonita música do oitavo álbum solo do ex-Titã, Drês (Universal Music, 2009).

Voz de Elba ainda arde no sertão de Gonzaga, afins e 'paixões jagunças'

Resenha de show
Título: Cordas, Gonzaga e afins
Artista: Elba Ramalho (em foto de Alex Ribeiro)
Local: Teatro Castro Alves (Salvador, BA)
Data: 23 de agosto de 2014
Cotação: * * * * *

 "Na voz que canta tudo ainda arde". Espetáculo de arquitetura teatral, Cordas, Gonzaga e afins está em sintonia com o histórico honroso de Elba Ramalho em palcos brasileiros, repondo a carreira da intérprete paraibana nos trilhos após discos e shows pautados por menor ambição artística. A criação de um espetáculo centrado na obra seminal de Luiz Gonzaga (1912 - 1989) - a mais perfeita tradução das alegrias e tristezas do Nordeste do Brasil - pode até sugestionar paralelismo com o show derivado do álbum Elba canta Luiz (BMG, 2002) e perpetuado no DVD e CD Elba ao vivo (BMG, 2003). Mas nada é do jeito que já foi um dia porque - tal como mentalizado pela jornalista e produtora cultural Margot Rodrigues, idealizadora do espetáculo patrocinado pelo projeto Natura Musical - Elba divide a bela cena com o grupo pernambucano SaGRAMA e com as cordas do também pernambucano Quarteto Encore. O uso dessa formação clássica na abordagem do cancioneiro popular de Gonzaga - e dos compositores afinados com sua obra - dá frescor a todo o repertório costurado pelo diretor André Brasileiro com textos do dramaturgo pernambucano Newton Moreno em roteiro sagaz que faz o sertão virar mar na transposição do primeiro para o segundo ato. Não são apenas cordas - e elas já seriam muito. Elba canta Gonzaga com arranjos calcados em mix renovador de cordas, percussões, sopros e a sanfona de Beto Hortis. De certa maneira, a temática do primeiro ato de Cordas, Gonzaga e afins remete a um dos melhores espetáculos da carreira da cantora, Leão do Norte (1996), por focar as agruras do sertanejo que precisa ser um forte para vencer a batalha cotidiana de sua vida seca - como cantou o rei da nação nordestina no baião Algodão (Luiz Gonzaga e Zé Dantas, 1983), uma das músicas de Gonzaga selecionadas para o roteiro repleto de novidades na voz valente de Elba, ora ouvida nos tons mais graves da maturidade. Leoa, Elba também teve que ser forte na travessia Paraíba-Rio de Janeiro feita em 1974, há 40 longos anos. Por isso, há verdade quando ela entra em cena, da plateia, dando voz a Pau de arara (Luiz Gonzaga e Guio de Moraes, 1952)  Por isso, também, poucas vozes têm - como a de Elba - credibilidade para cantar um repertório de paixões jagunças, para citar termo usado em um dos imagéticos textos de Newton Moreno salpicados no roteiro bem urdido. Quando o telão exibe imagens de Elba no início da carreira, enquanto a intérprete revive Não sonho mais (Chico Buarque, 1979), tudo faz sentido porque Cordas, Gonzaga e afins é - também - o espetáculo comemorativo dos 35 anos de carreira fonográfica da leoa. Brava, Elba não se deixa dominar e apagar em cena pela imponência das orquestrações do SaGRAMA - grupo pernambucano criado em 1995 pelo flautista e maestro Sérgio Campelo, diretor musical do espetáculo - e do Quarteto Encore. A introdução e as passagens villa-lobianas do arranjo de Súplica cearense (Gordurinha e Nelinho, 1967) exemplificam a maestria dos grupos no tratamento orquestral da obra de Gonzaga. Súplica cearense é o primeiro grande momento do show, cuja estreia nacional foi realizada em 23 de agosto de 2014 em apresentação que lotou o Teatro Castro Alves, em Salvador (BA). Mas outros grandes momentos se seguiram - como o link inteligente de Assum branco (José Miguel Wisnik e Tom Zé, 1994) com Assum preto (Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira, 1950). Esta toada dolente é pungentemente cantada por Elba com os olhos vendados por suas mãos, em belo efeito cênico e de interpretação. Surte efeito também a ação de Elba abrir um livro ou um envelope ao dizer os textos de Newton Moreno. Sem inventar moda, o diretor André Brasileiro - ligado ao teatro do Recife (PE) - conduz Elba com delicadeza e sensibilidade por roteiro de músicas como O ciúme (Caetano Veloso, 1987), majestosamente emoldurada pelas cordas do Encore e entoada com Elba sentada em caixote que complementa o cenário construído com elementos de tom apropriadamente rústico. O tom de Béradêro (Chico César, 1995), número-vinheta em que Elba reproduz os tons agrestes de seu canto nos anos 1970. Na sequência, Ave Maria sertaneja (Júlio Ricardo e Osvaldo de Oliveira, 1964) abre bloco de clima sacro em que vida, religião e morte se entrelaçam, culminando com Funeral de um lavrador (Chico Buarque sobre texto de João Cabral de Melo Neto, 1964). A propósito, a lembrança do poeta recifense João Cabral de Melo Neto (1920 - 1999) - cujo texto da cigana em sua obra-prima Morte e vida severina (1955) é dito em cena por Elba - é oportuna porque a obra de João Cabral também retrata com fidelidade e poesia esse universo de paixões jagunças. Balaio de sementes, como poetizado por Elba em outro texto de Cordas, Gonzaga e afins, o cancioneiro do Rei do Baião frutifica em cena ao som dos compositores afins como o cantor e compositor pernambucano Accioly Neto (1950 - 2000) - de quem Elba revive A natureza das coisas (2000) em número de empatia popular - e o cantor e compositor pernambucano Alceu Valença, representado por Tomara (Alceu Valença e Rubem Valença Filho, 1990). Mas o eixo do roteiro reside na obra de Gonzagão, cuja pouco ouvida toada Adeus, Iracema (Luiz Gonzaga e Zé Dantas, 1962) faz o sertão virar mar a partir do segundo ato, iniciado com a itinerante A violeira (Antonio Carlos Jobim e Chico Buarque, 1983). Esse mar fundo abarca a Ciranda praieira (1998) de Lenine e Paulo César Pinheiro, remexendo em águas de Pernambuco, terra do frevo de bloco Aquela rosa (Geraldo Azevedo e Carlos Fernando, 1979) e de maracatus como Braia dengosa (Luiz Gonzaga e Guio de Moraes, 1952), outro título pouco ouvido do cancioneiro de um rei que extrapolou o universo do baião. Para quem acompanha a trajetória de Elba, Cordas, Gonzaga e afins mostra músicas nunca encaradas pela leoa, que, mesmo insegura com a letra de Domingo no parque (Gilberto Gil, 1967), oferece boa interpretação deste clássico da fase tropicalista da obra do compositor baiano Gilberto Gil. Nessa música, o SaGRAMA se guia pela orquestração emblemática do maestro Rogério Duprat (1932 - 2006) sem deixar de pôr seu toque pessoal no tema. Na sequência, Sanfona sentida (Dominginhos e Anastácia, 1973) e Sete meninas (Dominguinhos e Toinho Alves, 1975) reiteram a salutar intenção de renovação do repertório de Elba que pareceu pautar os criadores de Cordas, Gonzaga e afins, espetáculo que culmina com bloco de temas juninos em arremate que ainda pode ficar mais espontaneamente animado à medida em que o show ganhar chão na turnê nacional que vai passar por mais seis capitais do Brasil até novembro de 2014. No todo, Cordas, Gonzaga e afins devolve a Elba Ramalho o status de grande intérprete dos palcos. "Tanta gente canta, tanta gente cala". Sobre toda a estrada, pavimentada no Rio de Janeiro há 40 anos, paira a monstruosa força dessa voz que ainda arde.

Elba faz seu sertão virar mar no roteiro do show 'Cordas, Gonzaga e afins'

Em sintonia com a profecia atribuída ao cearense Antônio Vicente Mendes Maciel (1830 - 1897), o líder sertanejo conhecido como Antônio Conselheiro, o sertão vira mar ao longo do roteiro criado pelo diretor pernambucano André Brasileiro para Cordas, Gonzaga e afins, belo espetáculo de natureza teatral feito pela cantora e atriz paraibana Elba Ramalho com o grupo SaGRAMA e o quarteto de cordas Encore. Idealizado pela produtora cultural Margot Rodrigues e patrocinado pelo projeto Natura Musical, o show foca as vidas secas do sertanejo nordestino em seu primeiro ato, mas deságua no mar (de)cantado nos cancioneiros de compositores como os pernambucanos como Luiz Gonzaga (1912 - 1989) - eixo central do roteiro - e Lenine (Ciranda praieira, parceria com Paulo César Pinheiro, de 2008). E é com natural teatralidade que o sertão de Elba vira mar - como visto em 23 de agosto de 2014 na estreia nacional do espetáculo, no Teatro Castro Alves, em Salvador (BA), ponto inicial da turnê que vai passar pelas cidades de Fortaleza (CE), Rio de Janeiro (RJ), Recife (PE), Curitiba (PE), Belo Horizonte (MG) e São Paulo (SP). Costurado por textos imagéticos do dramaturgo pernambucano Newton Moreno, o roteiro de Cordas, Gonzaga e afins inclui temas pouco ouvidos de Gonzaga, como a toada Adeus, Iracema (Luiz Gonzaga e Zé Dantas, 1962) e o maracatu Braia dengosa (Luiz Gonzaga e Zé Dantas, 1956), entre músicas de Alceu Valença (Tomara, parceria com Rubem Valença Filho, de 1990), Caetano Veloso (O ciúme, 1987) e Gilberto Gil (Domingo no parque, 1967). Eis o roteiro seguido por Elba Ramalho - em foto de Alex Ribeiro - na estreia nacional do show Cordas, Gonzaga e afins no Teatro Castro Alves, em Salvador (BA), em 23 de agosto:

Primeiro ato:
1. Pau de arara (Luiz Gonzaga e Guio de Moraes, 1952)
2. Algodão (Luiz Gonzaga e Zé Dantas, 1953)
3. Não sonho mais (Chico Buarque, 1979)
*  Toda paixão é jagunça - Texto de Newton Moreno
4. Qui nem jiló (Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira, 1950)
*  Aboio mudo - Texto de Newton Moreno
5. Súplica cearense (Gordurinha e Nelinho, 1967)
6. Assum branco (José Miguel Wisnik e Tom Zé, 1994)
7. Assum preto (Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira, 1950)
8. O ciúme (Caetano Veloso, 1987)
9. Béradêro (Chico César, 1995)
10. Ave Maria sertaneja (Júlio Ricardo e Osvaldo de Oliveira, 1964)

*    Ave Maria - Texto de Newton Moreno
11. Ave Maria (Bach e Charles Gounoud, 1853) - em latim
*    Texto da cigana (João Cabral de Melo Neto in Morte e vida severina, 1955)
12. Funeral de um lavrador (Chico Buarque sobre texto de João Cabral de Melo Neto, 1964)

*    Poema para seu lua - Texto de Newton Moreno
13. A natureza das coisas (Accioly Neto, 2000)
14. Tomara (Alceu Valença e Rubem Valença Filho, 1990)
Interlúdio:
15. Mundo do lua - tema instrumental com SaGRAMA
     (Medley com composições de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira gravado pelo grupo em álbum de 2008)
Segundo ato:

16. A violeira (Antonio Carlos Jobim e Chico Buarque, 1983)
17. Adeus, Iracema (Luiz Gonzaga e Zé Dantas, 1962)
18. Ciranda praieira (Lenine e Paulo César Pinheiro, 2008)
19. Aquela rosa (Geraldo Azevedo e Carlos Fernando, 1979)
20. Braia dengosa (Luiz Gonzaga e Guio de Moraes, 1952)
 *   Fantasmas que migrou - Texto de Newton Moreno
21. Chão de giz (Zé Ramalho, 1978)
22. Sabiá (Luiz Gonzaga e Zé Dantas, 1951)
23. Domingo no parque (Gilberto Gil, 1967)
24. Sanfona sentida (Dominginhos e Anastácia, 1973)
25. Sete meninas (Dominguinhos e Toinho Alves, 1975)
26. São João na roça (Luiz Gonzaga e Zé Dantas, 1952)
27. Olha pro céu (Luiz Gonzaga e José Fernandes, 1951)
28. Pagode russo (Luiz Gonzaga, 1946)
Bis:
29. Asa branca (Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira, 1947)
30. Canta Luiz (Dominguinhos e Oliveira, 1997)
31. A vida do viajante (Luiz Gonzaga e Hervê Cordovil, 1953)