Mauro Ferreira no G1

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sábado, 7 de maio de 2016

Criolo ajusta foco de 'Ainda há tempo' e revigora álbum lançado há dez anos

Resenha de álbum
Título: Ainda há tempo (versão 2016)
Artista: Criolo
Gravadora: Oloko Records
Cotação: * * * *
Disco disponível para download gratuito no site oficial do artista

Criolo era lúcido mesmo quando adotava o nome artístico de Criolo Doido. Foi como Criolo Doido que o rapper paulistano lançou há dez anos o primeiro álbum, Ainda há tempo (SkyBlue Music, 2006), com distribuição (de minguadas 500 cópias) e repercussão restritas ao universo do hip hop. Mais comentado do que propriamente ouvido, o disco está sendo relançado pelo artista neste mês de maio de 2016. Mas não se trata de reedição. O álbum disponibilizado ontem - 6 de maio de 2016 - nas plataformas digitais é uma nova versão do disco, sintonizada com o som adotado por Criolo desde que o rapper se uniu aos produtores Daniel Ganjaman e Marcelo Cabral para moldar o álbum, Nó na orelha (Oloko Records, 2011), que lhe deu projeção nacional e o tirou do gueto do hip hop. Criolo foi além do rap desde então e chegou a lançar álbum gravado com uma das maiores estrelas da axé music, Ivete Sangalo, com abordagens do repertório do cantor e compositor carioca Tim Maia (1942 - 1998). Sucessora de Convoque seu Buda (Oloko Records, 2014) na discografia solo de Criolo, a versão 2016 de Ainda há tempo ajusta o foco do álbum ao reapresentar somente oito das 22 músicas do repertório original. Feita por Daniel Ganjaman e por Marcelo Cabral, a inebriante repaginação da música-título Ainda há tempo (Criolo, 2006) já foi apresentada como o primeiro single do álbum em 8 de abril de 2016. A faixa deu a pista certeira de como Criolo revigorou o som deste disco de 2006, mais voltado para o rap. Só que, mesmo sob a direção musical de Ganjaman, Criolo convocou outros produtores para dar forma às outras sete músicas da versão redux de Ainda há tempo. A releitura resultou excelente porque os produtores beatmakers lapidaram e encorparam o som sem diluir a essência do rap de Criolo. A lucidez do Criolo que se autodenominava Doido reverbera já na primeira música da versão 2016 de Ainda há tempo, É o teste (Criolo, 2006), repaginada por Nave. Na letra, Criolo versa sobre os perigos das quebradas e prega a perseverança no caminho do bem. "É o teste, é a febre, é a glória / Não se corromper, pra nós, já é vitória", sentencia o rapper no refrão insistente. Música revitalizada por Sala 70, Chuva ácida (Criolo, 2006) recai forte por ter tido a atualidade da pregação ecológica acentuada pela inserção, na abertura da faixa, de fala de trecho de reportagem sobre o desastre ambiental que devastou e enlameou a cidade mineira de Mariana (MG) em novembro de 2015, acabando com o Rio Doce. Música reciclada pela produção de Grou e gravada com a adesão do rapper Rael, Tô pra ver (Criolo, 2006) prega o rap como arma na luta cotidiana pela sobrevivência digna nas quebradas da vida. Bréaco (Criolo, 2016) cai levemente no suingue - com a produção de Deryck Cabrera - sem diluir a secura do rap. Música repaginada por Sem Grana, Até me emocionei (Criolo, 2006) exalta o rap como veículo salvador - "No hip hop não tem rei / Eu não fiz o rap / Foi o rap que me fez" - e escancara a sensibilidade do rapper diante da realidade. Com produção de Papatinho e discurso autoconfiante ("Ninguém vai me frear / Ninguém vai me dizer o que eu devo fazer nessa porra"), Demorô (Criolo, 2006) é um dos melhores exemplos de como Criolo soube revigorar a pegada e a batida dos raps de Ainda há tempo. Faixa recriada pela dupla Tropkilazz, Vasilhame (Criolo, 2006) derrama crítica ao alcoolismo autodestrutivo sem o verso impoliticamente correto que aludia aos travestis de forma esnobe, machista. Enfim, Criolo sempre foi lúcido. Mas agora tem mais munição para veicular a lucidez do discurso positivista de obra que já dizia a que veio no álbum quase ignorado de 2006. "As pessoas não estão más / Elas só estão perdidas", argumenta, crente, em versão da música-título. Ainda há tempo para ouvir o primeiro álbum de Criolo e comprovar que a explosão de 2011 foi meritória, ainda que até tardia para quem já estava há anos nas duras batalhas da vida das rimas.

3 comentários:

Mauro Ferreira disse...

♪ Criolo era lúcido mesmo quando adotava o nome artístico de Criolo Doido. Foi como Criolo Doido que o rapper paulistano lançou há dez anos o primeiro álbum, Ainda há tempo (SkyBlue Music, 2006), com distribuição (de minguadas 500 cópias) e repercussão restritas ao universo do hip hop. Mais comentado do que propriamente ouvido, o disco está sendo relançado pelo artista neste mês de maio de 2016. Mas não se trata de reedição. O álbum disponibilizado ontem - 6 de maio de 2016 - nas plataformas digitais é uma nova versão do disco, sintonizada com o som adotado por Criolo desde que o rapper se uniu aos produtores Daniel Ganjaman e Marcelo Cabral para moldar o álbum, Nó na orelha (Oloko Records, 2011), que lhe deu projeção nacional e o tirou do gueto do hip hop. Criolo foi além do rap desde então e chegou a lançar álbum gravado com uma das maiores estrelas da axé music, Ivete Sangalo, com abordagens do repertório do cantor e compositor carioca Tim Maia (1942 - 1998). Sucessora de Convoque seu Buda (Oloko Records, 2014) na discografia solo de Criolo, a versão 2016 de Ainda há tempo ajusta o foco do álbum ao reapresentar somente oito das 22 músicas do repertório original. Feita por Daniel Ganjaman e por Marcelo Cabral, a inebriante repaginação da música-título Ainda há tempo (Criolo, 2006) já foi apresentada como o primeiro single do álbum em 8 de abril de 2016. A faixa deu a pista certeira de como Criolo revigorou o som deste disco de 2006, mais voltado para o rap. Só que, mesmo sob a direção musical de Ganjaman, Criolo convocou outros produtores para dar forma às outras sete músicas da versão redux de Ainda há tempo. A releitura resultou excelente porque os produtores beatmakers lapidaram e encorparam o som sem diluir a essência do rap de Criolo. A lucidez do Criolo que se autodenominava Doido reverbera já na primeira música da versão 2016 de Ainda há tempo, É o teste (Criolo, 2006), repaginada por Nave. Na letra, Criolo versa sobre os perigos das quebradas e prega a perseverança no caminho do bem. "É o teste, é a febre, é a glória / Não se corromper, pra nós, já é vitória", sentencia o rapper no refrão insistente. Música revitalizada por Sala 70, Chuva ácida (Criolo, 2006) recai forte por ter tido a atualidade da pregação ecológica acentuada pela inserção, na abertura da faixa, de fala de trecho de reportagem sobre o desastre ambiental que devastou e enlameou a cidade mineira de Mariana (MG) em novembro de 2015, acabando com o Rio Doce. Música reciclada pela produção de Grou e gravada com a adesão do rapper Rael, Tô pra ver (Criolo, 2006) prega o rap como arma na luta cotidiana pela sobrevivência digna nas quebradas da vida. Bréaco (Criolo, 2016) cai levemente no suingue - com a produção de Deryck Cabrera - sem diluir a secura do rap. Música repaginada por Sem Grana, Até me emocionei (Criolo, 2006) exalta o rap como veículo salvador - "No hip hop não tem rei / Eu não fiz o rap / Foi o rap que me fez" - e escancara a sensibilidade do rapper diante da realidade. Com produção de Papatinho e discurso autoconfiante ("Ninguém vai me frear / Ninguém vai me dizer o que eu devo fazer nessa porra"), Demorô (Criolo, 2006) é um dos melhores exemplos de como Criolo soube revigorar a pegada e a batida dos raps de Ainda há tempo. Faixa recriada pela dupla Tropkilazz, Vasilhame (Criolo, 2006) derrama crítica ao alcoolismo autodestrutivo sem o verso impoliticamente correto que aludia aos travestis de forma esnobe, machista. Enfim, Criolo sempre foi lúcido. Mas agora tem mais munição para veicular a lucidez do discurso positivista de obra que já dizia a que veio no álbum quase ignorado de 2006. "As pessoas não estão más / Elas só estão perdidas", argumenta, crente, em versão da música-título. Ainda há tempo para ouvir o primeiro álbum de Criolo e comprovar que a explosão de 2011 foi meritória, ainda que até tardia para quem já estava há anos nas duras batalhas da vida das rimas.

Unknown disse...

Vou ouvir as outras faixas mais o single ainda ha tempo eu prefiro a versão original

BIGODE disse...

Sinal claro de desgaste criativo, reeditar album de dez anos atrás....mesmo com novos arranjos não vale 10% do Nó na orelha, esse sim um grande album....
Infelizmente vejo que o Criolo não fará nada tão bom/relevante/impactante/incrivel como o disco Nó na orelha....pena mesmo