Mauro Ferreira no G1

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quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Ácido, Montenegro transita por universo particular no autoral 'De passagem'

Resenha de CD
Título: De passagem
Artista: Oswaldo Montenegro
Gravadora: Ape Music
Cotação: * * *

 "Pra ser feliz / Não dá pra olhar pra trás", conclui Oswaldo Montenegro em verso de Pra ser feliz, canção da lavra de Montenegro que encerra De passagem, primeiro álbum de inéditas do contemporâneo  trovador desde A partir de agora (2006). Na contramão de tal conclusão, o menestrel volta e meia olha para trás para recriar a própria criação. Em De passagem, disco produzido e arranjado pelo próprio Montenegro, o artista transita por universo particular a reboque de inéditas majoritariamente autorais. A seu modo, o menestrel reflete sobre as transformações globais e individuais impostas pela passagem incessante do tempo. "O tal socialismo morreu / A pura inocência eu perdi", rumina em versos de Não importa por quê (Oswaldo Montenegro), baião elétrico cuja levada inicial pode remeter à pegada da obra de Lenine para quem não é íntimo do universo particular de Montenegro. Montenegro tem o que dizer. E o faz de forma direta ao longo do disco, recorrendo eventualmente ao canto falado, marca forte deste contundente De passagem, perceptível em passagens da balada Eu quero ser feliz agora (Oswaldo Montenegro), em Todo mundo tá falando (Oswaldo Montenegro) - tema pontuado por violões ásperos em que o artista disserta em tom crítico sobre a necessidade quase doente de todo mundo querer opinar sobre tudo em redes sociais ou na vida real - e em Quem é que sabe? (Oswaldo Montenegro). De passagem se insinua de cara um bom disco, mas, ao longo das 12 faixas, salta aos ouvidos a supremacia da primeira metade do álbum em relação à segunda, de inspiração mais irregular. Da lavra de Mongol, velho amigo de Montenegro, a melodiosa balada A vida quis assim - banhada em teclados - se impõe como provável hit se tiver chance de ser ouvida. E, falando em amizades e canções, Velhos amigos (Oswaldo Montenegro) é outra amostra da sensibilidade que escorre por entre a acidez recorrente em parte das músicas gravadas em De passagem. Tema lúdico que vai crescer nos shows, Palma (Ulysses Machado) versa metalinguisticamente sobre o próprio ritmo da música. Em contrapartida, Asas (Oswaldo Montenegro) evoca - pela disposição do coro - antigo sucesso do menestrel, O condor (1985), sem alçar voo na mesma altura. E o fato é que, por mais que enfileire alguns temas menos sedutores, caso em especial de Sem susto (Oswaldo Montenegro e José Alexandre), De passagem expõe a honestidade e a coerência de Oswaldo Montenegro, artista que, por conta de alguns excessos estilísticos, tem sido injustamente subestimado por parte da crítica musical que segue a cartilha hype com fidelidade cega. Mas Montenegro transcende o hype.

Um comentário:

Mauro Ferreira disse...

"Pra ser feliz / Não dá pra olhar pra trás", conclui Oswaldo Montenegro em verso de Pra Ser Feliz, canção da lavra de Montenegro que encerra De Passagem, primeiro álbum de inéditas do contemporâneo trovador desde A Partir de Agora (2006). Na contramão de tal conclusão, o Menestrel volta e meia olha para trás para recriar a própria criação. Em De Passagem, disco produzido e arranjado pelo próprio Montenegro, o artistra transita por seu universo particular a reboque de inéditas majoritariamente autorais. A seu modo, o artista reflete sobre as transformações globais e individuais impostas pela passagem incessante do tempo. "O tal socialismo morreu / A pura inocência eu perdi", rumina em versos de Não Importa Por Quê (Oswaldo Montenegro), baião elétrico cuja levada inicial pode remeter à pegada da obra de Lenine para quem não é íntimo do universo particular de Montenegro. Montenegro tem o que dizer. E o faz de forma direta ao longo do disco, recorrendo eventualmente ao canto falado, marca forte deste contundente De Passagem, perceptível em passagens da balada Eu Quero Ser Feliz Agora (Oswaldo Montenegro), em Todo Mundo Tá Falando (Oswaldo Montenegro) - tema pontuado por violões ásperos em que o artista disserta em tom crítico sobre a necessidade quase doente de todo mundo querer opinar sobre tudo em redes sociais ou na vida real - em Quem É que Sabe? (Oswaldo Montenegro). De Passagem se insinua de cara um bom disco, mas, ao longo de suas 12 faixas, salta aos ouvidos a supremacia da primeira metade do álbum em relação à segunda, de inspiração mais irregular. Da lavra de Mongol, velho amigo de Montenegro, a melodiosa balada A Vida Quis Assim - banhada em teclados - se impõe como um provável hit se tiver chance de ser ouvida. E, falando em amizades e canções, Velhos Amigos (Oswaldo Montenegro) é outra amostra da sensibilidade que escorre por entre a acidez recorrente em parte das músicas gravadas em De Passagem. Tema lúdico que vai crescer nos shows, Palma (Ulysses Machado) versa metalinguisticamente sobre o próprio ritmo da música. Em contrapartida, Asas (Oswaldo Montenegro) evoca - pela disposição do coro - antigo sucesso do Menestrel, O Condor (1985), sem alçar voo na mesma altura. E o fato é que, por mais que enfileire alguns temas menos sedutores, caso em especial de Sem Susto (Oswaldo Montenegro e José Alexandre), De Passagem expõe a honestidade e a coerência de Oswaldo Montenegro, artista que, por conta de alguns reais excessos estilísticos, tem sido injustamente subestimado por parte da crítica musical que segue a cartilha hype com fidelidade quase cega.