Mauro Ferreira no G1

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terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Amelinha segue, com afeto, a trilha interiorana e lírica de 'Janelas do Brasil'

Resenha de CD
Título: Janelas do Brasil
Artista: Amelinha
Gravadora: Joia Moderna
Cotação: * * * * 1/2

Ai, que saudades de Amelinha! Citando graciosamente o título do clássico samba de Ataulfo Alves (1909 - 1969) e Mário Lago (1911 - 2002), a frase com que o DJ Zé Pedro abre o texto escrito para o encarte do CD de Amelinha ora editado por sua gravadora Joia Moderna - Janelas do Brasil, primeiro disco da cantora desde 2002 - pode bem ser dita por quem seguiu a trilha nordestina do Brasil do fim dos anos 70 e início dos 80, período em que a voz afetuosa da intérprete cearense ecoou com força pelo país, lançando sucessos como Frevo Mulher (Zé Ramalho, 1979) e Foi Deus que Fez Você (Luiz Ramalho, 1980). Símbolo de doçura na corrente migratória que deslocou vozes agrestes de artistas nordestinos para o eixo Rio-São Paulo, em busca de oportunidades fonográficas, o canto de Amelinha conserva seu brilho neste álbum que se alinha com os melhores títulos de discografia que foi ficando progressivamente espaçada a partir da segunda metade dos anos 80 e - pior - voltada para o forró mais populista por exigência tacanha da indústria da música. Por entre as frestas abertas no mercado independente por Janelas do Brasil, disco produzido por Thiago Marques Luiz, a voz singular da intéprete destila lirismo e melancolia em repertório de ótimo nível, adornado por violões, violas e guitarras de Dino Barioni, diretor musical e arranjador do disco. A sonoridade interiorana do disco resulta apropriada para lustrar pérolas como O Silêncio (Zeca Baleiro, 2005), balada do asfalto que Amelinha traz para o universo musical do Brasil rural, longe demais das Capitais. É o Brasil em que resplandece Planície de Prata (Almir Sater e Paulo Solimões, 2005) com sua porteira aberta por onde passam angústias sentimentais (Quando Fugias de Mim, Alceu Valença e Emmanoel Cavalcanti, 2001), dores tão profundas quanto silenciosas (Asa Partida, Fagner e Abel Silva, 1976 - tema bonito com Amelinha, mas que pede intérprete de maior carga emocional) e o orgulho da origem cearense, exposta no terno registro de Terral (Ednardo, 1973), única música já gravada pela cantora. Pontuada pela guitarra de Barioni, a voz de Amelinha eleva os tons para sublinhar as urgências existenciais de Algum Lugar (Marília Medalha e Vinicius de Moraes, 1972), lembrança afetiva do repertório, já que o Poetinha se encantou com a voz de Amelinha antes de o Brasil a ouvir com a devida atenção. Aos 61 anos, essa voz preserva o mesmo frescor dos tempos áureos, com a vantagem de a sonoridade minimalista e íntima de Janelas do Brasil ter tom atemporal, sem perseguir mudernices e maravilhas contemporâneas. É o fato é que o disco se revela à altura do histórico da cantora. Pela doçura natural, a voz da artista esbanja o afeto preciso em É Necessário (Geraldo Espíndola, 1978), revolve reminiscências de tempos mais alegres em Galos, Noites e Quintais (Belchior, 1977), segue com alguma fidelidade a receita pop de Felicidade (Marcelo Jeneci e Chico César, 2010), celebra as belezas naturais de Ponta do Seixas (Cátia de França, 1980) e se embrenha pelas matas atrás das cantorias da paixão que envolvem Olhos Profundos (Renato Teixeira, 1978). Nessa trilha interiorana, a voz da intérprete reitera ao fim do disco a firme disposição de cantar sonhos e esperanças alimentadas nas praças de seu país, itinerário certeiro de Pra Seguir um Violeiro (Amaro Penna, 2011), única música inédita de repertório que se ajusta bem ao canto afetuoso da intérprete. Janelas do Brasil é belo álbum que mata a saudade do canto afetuoso de Amelinha. 

10 comentários:

Mauro Ferreira disse...

Ai, que saudades de Amelinha! Citando graciosamente o título do clássico samba de Ataulfo Alves (1909 - 1969) e Mário Lago (1911 - 2002), a frase com que o DJ Zé Pedro abre o texto escrito para o encarte do CD de Amelinha ora editado por sua gravadora Joia Moderna - Janelas do Brasil, primeiro disco da cantora desde 2002 - pode bem ser dita por quem seguiu a trilha nordestina do Brasil do fim dos anos 70 e início dos 80, período em que a voz afetuosa da intérprete cearense ecoou com força pelo país, lançando sucessos como Frevo Mulher (Zé Ramalho, 1979) e Foi Deus que Fez Você (Luiz Ramalho, 1980). Símbolo de doçura na corrente migratória que deslocou vozes agrestes de artistas nordestinos para o eixo Rio-São Paulo, em busca de oportunidades fonográficas, o canto de Amelinha conserva seu brilho neste álbum que se alinha com os melhores títulos de discografia que foi ficando progressivamente espaçada a partir da segunda metade dos anos 80 e - pior - voltada para o forró mais populista por exigência tacanha da indústria da música. Por entre as frestas abertas no mercado independente por Janelas do Brasil, disco produzido por Thiago Marques Luiz, a voz singular da intéprete destila lirismo e melancolia em repertório de ótimo nível, adornado por violões, violas e guitarras de Dino Barioni, diretor musical e arranjador do disco. A sonoridade interiorana do disco resulta apropriada para lustrar pérolas como O Silêncio (Zeca Baleiro, 2005), balada do asfalto que Amelinha traz para o universo musical do Brasil rural, longe demais das Capitais. É o Brasil em que resplandece Planície de Prata (Almir Sater e Paulo Solimões, 2005) com sua porteira aberta por onde passam angústias sentimentais (Quando Fugias de Mim, Alceu Valença e Emmanoel Cavalcanti, 2001), dores tão profundas quanto silenciosas (Asa Partida, Fagner e Abel Silva, 1976 - tema bonito com Amelinha, mas que pede intérprete de maior carga emocional) e o orgulho da origem cearense, exposta no terno registro de Terral (Ednardo, 1973), única música já gravada pela cantora. Pontuada pela guitarra de Barioni, a voz de Amelinha eleva os tons para sublinhar as urgências existenciais de Algum Lugar (Marília Medalha e Vinicius de Moraes, 1972), lembrança afetiva do repertório, já que o Poetinha se encantou com a voz de Amelinha antes de o Brasil a ouvir com a devida atenção. Aos 61 anos, essa voz preserva o mesmo frescor dos tempos áureos, com a vantagem de a sonoridade minimalista de Janelas do Brasil ter tom atemporal, sem perseguir mudernices e maravilhas contemporâneas. É o fato é que o disco se revela à altura do histórico da cantora. Pela doçura natural, a voz da artista esbanja o afeto preciso em É Necessário (Geraldo Espíndola, 1978), revolve reminiscências de tempos mais alegres em Galos, Noites e Quintais (Belchior, 1977), segue com alguma fidelidade a receita pop de Felicidade (Marcelo Jeneci e Chico César, 2010), celebra as belezas naturais de Ponta do Seixas (Cátia de França, 1980) e se embrenha pelas matas atrás das cantorias da paixão que envolvem Olhos Profundos (Renato Teixeira, 1978). Nessa trilha interiorana, a voz da intérprete reitera ao fim do disco a firme disposição de cantar sonhos e esperanças alimentadas nas praças de seu país, itinerário certeiro de Pra Seguir um Violeiro (Amaro Penna, 2011), única música inédita de repertório que se ajusta bem ao canto afetuoso da intérprete. Belo CD que mata a saudade de Amelinha!

Mauro Ferreira disse...

Aviso prévio aos navegantes: por ora, o disco de Amelinha somente se encontra à venda em algumas lojas do Centro de São Paulo, situadas na Rua Augusta e arredores. A distribuição mais regular vai ser feita a partir de janeiro de 2012. Abs, MauroF

CN disse...

Já comprei o meu e considero um dos melhores cd´s do ano. Sou super fã da Amelinha e ela estava fazendo falta. O álbum é um acerto (concepção, repertório). Parabéns especiais ao Dino Barioni, músico sensível , do mais alto nivel, que adoro, e , claro, a Amelinha, nossa trovadora dos tempos mais felizes. Carlos Navas

Marcelo disse...

Amelinha é muito mais do que esse universo que insistem em colocá-la...

lurian disse...

Como acontece com todo bom disco, inicialmente tive sensação de estranheza, afinal a Amelinha que estamos acostumados não é a dos minimalismos, mas dos baiões, frevos e galopes. Mas ela reencontra neste grande disco a poesia trovada cearense, dos tempos de uma calçada e um violão por meio do reencontro com canções de seus conterrâneos Fagner, Ednardo, Belchior, e de suas memórias afetivas com Vinícius de Moraes/Marília medalha (de quem sinto falta). É um disco que vai crescendo com as audições!!!
A voz mais grave, madura, calma e serena. Logo de cara nos reporta ao universo que dá o tom do disco em "Galos, noites e quintais" que teve excelente versão. Mais ainda estão ali a interprete ritmada na levada de "Quando fugias de mim"; a que canta provocando em nós as sinestesias de toda a beleza da "Ponta do Seixas". Mas um dos maiores momentos do disco é a menos conhecida "É necessário", a faixa ficou de uma beleza sem igual ao juntar a voz de Amelinha ao arranjo de Dino Barioni.
O disco canta memórias afetivas de um Brasil lírico (Olhos profundos, Planície de prata) e, sim Mauro, atemporal! É um disco com garimpadas composições que resistirá às décadas. Amelinha mostra que 'Pra seguir o/a violeiro/a' tem que atravessar a idade e cantar muito mais!
Com um daqueles onde 'menos pode ser mais', Amelinha fez um dos melhores discos do ano! Que seja bem-vinda sua volta!

KL disse...

Certa vez, meu pai - fazendo as vezes de produtor e empresário - tinha duas opções para contratar para um show em praça pública Anastácia (de "Eu só quero um xodó") e Amelinha. Daí me consultou para saber qual das duas seria a melhor opção. Claro que, sem pestanejar, eu disse "Amelinha, sem dúvida!" E ele aceitou a sugestão na hora, e o show foi sensacional. Ela é uma das intérpretes com repertório e concepção sonora das mais originais, escolhe canções que a maioria jamais teria em mente gravar ou regravar; o timbre de voz é inconfundível, enfim, tudo nela tem um detalhe interessante.
No dia do supracitado show, pouco antes, Amelinha esteve em nossa casa, elegantemente vestida de crepe em tons rosados e com um longo écharpe transparente, que, mais tarde, esvoaçou no palco enquanto ela perfilava seus clássicos para espanto de uma plateia magnetizada que lotou a praça e a aplaudiu com entusiasmo. Num dado momento, houve uma queima de fogos que durou milênios, e Amelinha, já em São Paulo, ligou para meu pai para agradecê-lo e, sobretudo, pelos fogos (ideia dele): "Fiquei muito emocionada naquela hora", não me esqueço da vozinha dela pelo telefone falando com meu pai, e eu também bastante emocionado de ter feito a escolha certa.
Um grande Viva! para Amelinha

Gilmar disse...

Mauro,

Espero um novo disco de Amelinha Há anos e ainda tenho que esperar até janeiro pela distribuição em algumas lojas virtuais!
Moro em Itabuna-BA e a Av. Paulista fica um pouco distante daqui!...
Mas tenho certeza absoluta que mais essa espera valerá à pena, pois o canto de Amelinha - junto com o de Gal - é o meu preferido desde início dos 80.
Que este retorno de Amelinha seja pra valer; que ela grave mais frequentemente pois sua voz é especial e tem uma identidade bastante singular - pode parecer redundante - mas isso tem que ser registrado neste momento em que tantas "novas" cantoras parecem ter a mesma voz, cantar a mesma coisa, serem mais do mesmo!
Amelinha é essencial !!!!

Cláudio disse...

Que disco!!

Vi alguns discos muito bons este ano mas, para mim, este foi O DISCO. O MELHOR DISCO DO ANO. NOTA MÁXIMA.

Esta cantora não pode ficar sem gravar tanto tempo. Torço para que Amelinha restabeleça uma carreira contínua com disco anuais.

Johnny Cesar disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Johnny Cesar disse...

Mais uma vez temos que agradecer ao Zé Pedro e ao Thiago Marques por nos proporcionarem boa música! Valeu Mauro, feliz 2012! Sucesso sempre!!!