Mauro Ferreira no G1

Aviso aos navegantes: desde 6 de julho de 2016, o jornalista Mauro Ferreira atualiza diariamente uma coluna sobre o mercado fonográfico brasileiro no portal G1. Clique aqui para acessar a coluna. O endereço é http://g1.globo.com/musica/blog/mauro-ferreira/


sábado, 21 de maio de 2016

Nem o repertório caipira dissipa o ar colegial do musical 'Nuvem de lágrimas'

Resenha de musical de teatro
Título: Nuvem de lágrimas
Texto: Anna Toledo (com inspiração no romance Orgulho e preconceito, de Jane Austen)
Direção: Tania Nardini e Luciano Andrey
Direção musical: Carlos Bauzys
Elenco: Lucy Alves, Gabriel Sater, Adriana Del Claro, Sérgio Dalcin, Blota Filho, Rosana
           Penna, Marcelo Várzea, Letícia Maneira Zappulla e Gabriel Staufer, entre outros
Foto: Otávio Dias
Cotação: * *
Musical em cartaz no Teatro Oi Casa Grande, no Rio de Janeiro (RJ), até 29 de maio de 2016

♪ Em grande evidência dos anos 1970 à década de 1990, a dupla Chitãozinho & Xororó se tornou emblemática na história da música sertaneja por ter sido uma das primeiras a dar vozes anasaladas a um repertório romântico que, a rigor, pouco ou nada diferia do cancioneiro de cantores populares como Amado Batista. O bom repertório acaipirado dos irmãos paranaenses é matéria-prima de Nuvem de lágrimas, musical sertanejo de 2015 que estreou na cidade do Rio de Janeiro (RJ) neste mês de maio de 2016 depois de cumprir temporada em São Paulo (SP). Escrito com inspiração no romance Orgulho e preconceito (1883), best-seller da obra literária da inglesa Jane Austen (1775 - 1817), o texto de Anna Toledo encaixa as músicas do repertório de Chitãozinho & Xororó em trama folhetinesca que entrelaça três histórias de amor em ambiente rural. A ideia é tão original quanto interessante, mas resulta pálida em cena. Nem a força popular do cancioneiro da dupla dissipa o ar colegial que embala Nuvem de lágrimas. Sem vida, a direção musical de Carlos Bauzys acentua o tom esmaecido do canto da maioria do elenco e erra ao optar pela superposição das músicas Fio de cabelo (Darci Rossi e Marciano, 1982) e Porque brigamos (I am... I said) (Neil Diamond, 1971, em versão de Rossini Pinto, 1972). Nem a protagonista Lucy Alves - intérprete de Bete Borba, a caipira orgulhosa que desperta o amor do preconceituoso advogado Darcy (Gabriel Sater) - tem oportunidade de mostrar em cena a vivacidade já exibida em shows. A trama romântica do casal começa bem, mas é desenvolvida de forma superficial e inverossímil (sobretudo na cena artificial que encerra o primeiro ato). Ambientada na fictícia cidade de Santana do Ribeirão, a história serve também para propagar o orgulho do Brasil sertanejo - sentimento manifestado logo no início quando dois violeiros tocam e o elenco começa progressivamente a cantar Caipira (Joel Marques e Maracaí, 1991). Justiça seja feita, apesar do acabamento ginasial, o musical alcança momentos de empatia com a plateia por conta da força do repertório caipira. Com boa presença em cena, Blota Filho - intérprete do Doutor Jardim, padrinho de Darcy e ex-noivo da mãe de Bete (Rosana Penna, atriz que veste bem a pele da personagem) - protagoniza um desses momentos ao cantar a melancólica Se Deus me ouvisse (Almir Rogério, 1971). E por falar em melancolia, toda a tristeza que há em Saudade de minha terra (Pascoal Todarelli e Gerson Coutinho da Silva, 1966) - obra-prima caipira que completa 50 anos em 2016, tendo sido gravada há 20 anos por Chitõazinho & Xororó no álbum Clássicos sertanejos (PolyGram, 1996) - se dilui na vivacidade imposta equivocadamente ao tema no número coletivo de Nuvem de lágrimas. Tal vivacidade soa mais adequada quando é posta a serviço das músicas calcadas na batida da música country norte-americana, casos de Sistema bruto (Cacá Moraes e Gil Cardoso, 2004) - composição de letra que parece ter sido moldada para o clima de balada que tem movimentado a produção e o mercado da música sertaneja na fase universitária - e de Nasci de bota e chapéu (Gil Cardoso e Xororó, 2009), número defendido por Letícia Maneira Zappulla, intérprete de Lídia Borba, a espevitada irmã caçula de Bete. Enquadrado em moldura simplória, Nuvem de lágrimas passa batido na cena já povoada por musicais arquitetados com maior rigor estilístico. O bailão sertanejo poderia ser mais animado.

2 comentários:

Mauro Ferreira disse...

♪ Em grande evidência dos anos 1970 à década de 1990, a dupla Chitãozinho & Xororó se tornou emblemática na história da música sertaneja por ter sido uma das primeiras a dar vozes anasaladas a um repertório romântico que, a rigor, pouco ou nada diferia do cancioneiro de cantores populares como Amado Batista. O bom repertório acaipirado dos irmãos paranaenses é matéria-prima de Nuvem de lágrimas, musical sertanejo de 2015 que estreou na cidade do Rio de Janeiro (RJ) neste mês de maio de 2016 depois de cumprir temporada em São Paulo (SP). Escrito com inspiração no romance Orgulho e preconceito (1883), best-seller da obra literária da inglesa Jane Austen (1775 - 1817), o texto de Anna Toledo encaixa as músicas do repertório de Chitãozinho & Xororó em trama folhetinesca que entrelaça três histórias de amor em ambiente rural. A ideia é tão original quanto interessante, mas resulta pálida em cena. Nem a força popular do cancioneiro da dupla dissipa o ar colegial que embala Nuvem de lágrimas. Sem vida, a direção musical de Carlos Bauzys acentua o tom esmaecido do canto da maioria do elenco e erra ao optar pela superposição das músicas Fio de cabelo (Darci Rossi e Marciano, 1982) e Porque brigamos (I am... I said) (Neil Diamond, 1971, em versão de Rossini Pinto, 1972). Nem a protagonista Lucy Alves - intérprete de Bete Borba, a caipira orgulhosa que desperta o amor do preconceituoso advogado Darcy (Gabriel Sater) - tem oportunidade de mostrar em cena a vivacidade já exibida em shows. A trama romântica do casal começa bem, mas é desenvolvida de forma superficial e inverossímil (sobretudo na cena artificial que encerra o primeiro ato). Ambientada na fictícia cidade de Santana do Ribeirão, a história serve também para propagar o orgulho do Brasil sertanejo - sentimento manifestado logo no início quando dois violeiros tocam e o elenco começa progressivamente a cantar Caipira (Joel Marques e Maracaí, 1991). Justiça seja feita, apesar do acabamento ginasial, o musical alcança momentos de empatia com a plateia por conta da força do repertório caipira. Com boa presença em cena, Blota Filho - intérprete do Doutor Jardim, padrinho de Darcy e ex-noivo da mãe de Bete (Rosana Penna, atriz que veste bem a pele da personagem) - protagoniza um desses momentos ao cantar a melancólica Se Deus me ouvisse (Almir Rogério, 1971). E por falar em melancolia, toda a tristeza que há em Saudade de minha terra (Pascoal Todarelli e Gerson Coutinho da Silva, 1966) - obra-prima caipira que completa 50 anos em 2016, tendo sido gravada há 20 anos por Chitõazinho & Xororó no álbum Clássicos sertanejos (PolyGram, 1996) - se dilui na vivacidade imposta equivocadamente ao tema no número coletivo de Nuvem de lágrimas. Tal vivacidade soa mais adequada quando é posta a serviço das músicas calcadas na batida da música country norte-americana, casos de Sistema bruto (Cacá Moraes e Gil Cardoso, 2004) - composição de letra que parece ter sido moldada para o clima de balada que tem movimentado a produção e o mercado da música sertaneja na fase universitária - e de Nasci de bota e chapéu (Gil Cardoso e Xororó, 2009), número defendido por Letícia Maneira Zappulla, intérprete de Lídia Borba, a espevitada irmã caçula de Bete. Enquadrado em moldura simplória, Nuvem de lágrimas passa batido na cena já povoada por musicais arquitetados com maior rigor estilístico. O bailão sertanejo poderia ser mais animado.

Marcelo Barbosa disse...

O ano de 2016 é o ano de Lucy Alves. Puxou maravilhosamente bem o belíssimo samba da Imperatriz Leopoldinense no carnaval e tem se revelado a grande revelação do ano na novela Velho Chico.
Pena que não tenho encontrado o cd novo dela.