Mauro Ferreira no G1

Aviso aos navegantes: desde 6 de julho de 2016, o jornalista Mauro Ferreira atualiza diariamente uma coluna sobre o mercado fonográfico brasileiro no portal G1. Clique aqui para acessar a coluna. O endereço é http://g1.globo.com/musica/blog/mauro-ferreira/


quarta-feira, 29 de junho de 2011

Fróes pega pela palavra em CD em que letras se impõem sobre melodias

Resenha de CD
Título: Um Labirinto em Cada Pé
Artista: Romulo Fróes
Gravadora: YB Music
Cotação: * * * 1/2

"Só faço samba, só faço samba", avisa Romulo Fróes, com certa ironia, em verso de Muro, samba feito pelo compositor paulista com seu parceiro Clima. A ironia vem do fato de em seu disco anterior, o duplo No Chão, Sem o Chão (2011), Fróes ter precisado plugar as guitarras para criar ambiência roqueira que o dissociasse do rótulo de sambista normalmente posto no artista desde seus primeiros discos, Calado (2004) e Cão (2006). Com letra que cita Ladeira da Preguiça, samba de Gilberto Gil, Muro se impõe na coesa safra de inéditas apresentada por Fróes em seu quarto álbum, Um Labirinto em Cada Pé, já nas lojas em edição da YB Music. Fróes não é exatamente um sambista, mas é também um sambista - como prova a base percussiva (à moda do samba tradicional) que sustenta Rap em Latim, tema de Nuno Ramos, cantado por Fróes em dueto com Arnaldo Antunes. Outro sinal da presença do samba no disco é a voz veterana de Dona Inah, que abre o disco cantando a capella os versos de Olhos da Cara (Nuno Ramos) que expressam profunda solidão. Letras embebidas em poesia, aliás, se impõem sobre melodias neste denso Um Labirinto em Cada Pé. Tema sólido que dialoga com os trabalhos de Caetano Veloso com a BandaCê, Boneco de Piche (Romulo Fróes e Clima) alude no título (e apenas no título) a Boneca de Piche (Ary Barroso e Luiz Iglésias) - sucesso de Carmen Miranda (1909 - 1955) nos anos 30 - sem lançar mão do tom lúdico deste tema da primeira era de ouro da música brasileira. Se há algo lúdico no álbum são os jogos de palavras dos versos de Quero Quero (Romulo Fróes e Nuno Ramos) que aludem à cocaína e incluem palavrão pouco usual em letras de música (tomar no cu). Contudo, no todo, Um Labirinto em Cada Pé  quase nunca brinca em serviço, expondo letras contundentes que parecem não indicar saída. "A mão direita quer a esquerda, o pé que samba quer o tombo, dentro do grito tem silêncio", sentencia o artista, inquieto, na funkeada Ditado (Romulo Fróes e Nuno Ramos), faixa pontuada pela guitarra roqueira de Guilherme Held. Guitarra que se faz ouvir com mais força ainda em Jardineira, parceria de Held com a trinca de compositores que assina o repertório do disco (Fróes, Clima e Nuno Ramos). E o fato é que todas as letras do álbum são pura poesia que resistem até sem as melodias tortas dos compositores. O Filho de Deus (Nuno Ramos) - faixa que traz no coro a voz de Nina Becker, responsável também pelos backing vocals de temas como Máquina de Fumaça (Romulo Fróes e Clima) - narra história cinematográfica que remete aos enredos urbanos criados por Aldir Blanc para os sambas de João Bosco. Dentro ou fora de sua heterodoxa roda de samba, o CD Um Labirinto em Cada Pé pega o ouvinte pela palavra em época em que poucos têm o que dizer.

5 comentários:

Mauro Ferreira disse...

"Só faço samba, só faço samba", avisa Romulo Fróes, com certa ironia, em verso de Muro, samba feito pelo compositor paulista com seu parceiro Clima. A ironia vem do fato de em seu disco anterior, o duplo No Chão, Sem o Chão (2011), Fróes ter precisado plugar as guitarras para criar ambiência roqueira que o dissociasse do rótulo de sambista normalmente posto no artista desde seus primeiros discos, Calado (2004) e Cão (2006). Com letra que cita Ladeira da Preguiça, samba de Gilberto Gil, Muro se impõe na coesa safra de inéditas apresentada por Fróes em seu quarto álbum, Um Labirinto em Cada Pé, já nas lojas em edição da YB Music. Fróes não é exatamente um sambista, mas é também um sambista - como prova a base percussiva (à moda do samba tradicional) que sustenta Rap em Latim, tema de Nuno Ramos, cantado por Fróes em dueto com Arnaldo Antunes. Outro sinal da presença do samba no disco é a voz veterana de Dona Inah, que abre o disco cantando a capella os versos de Olhos da Cara (Nuno Ramos) que expressam profunda solidão. Letras embebidas em poesia, aliás, se impõem sobre melodias neste denso Um Labirinto em Cada Pé. Tema sólido que dialoga com os trabalhos de Caetano Veloso com a BandaCê, Boneco de Piche (Romulo Fróes e Clima) alude no título (e apenas no título) a Boneca de Piche (Ary Barroso e Luiz Iglésias) - sucesso de Carmen Miranda (1909 - 1955) nos anos 30 - sem lançar mão do tom lúdico deste tema da primeira era de ouro da música brasileira. Se há algo lúdico no álbum são os jogos de palavras dos versos de Quero Quero (Romulo Fróes e Nuno Ramos) que aludem à cocaína e incluem palavrão pouco usual em letras de música (tomar no cu). Contudo, no todo, Um Labirinto em Cada Pé quase nunca brinca em serviço, expondo letras contundentes que parecem não indicar saída. "A mão direita quer a esquerda, o pé que samba quer o tombo, dentro do grito tem silêncio", sentencia o artista, inquieto, na funkeada Ditado (Romulo Fróes e Nuno Ramos), faixa pontuada pela guitarra roqueira de Guilherme Held. Guitarra que se faz ouvir com mais força ainda em Jardineira, parceria de Held com a trinca de compositores que assina o repertório do disco (Fróes, Clima e Nuno Ramos). E o fato é que todas as letras do álbum são pura poesia que resistem até sem as melodias tortas dos compositores. O Filho de Deus (Nuno Ramos) - faixa que traz no coro a voz de Nina Becker, responsável também pelos backing vocals de temas como Máquina de Fumaça (Romulo Fróes e Clima) - narra história cinematográfica que remete aos enredos urbanos criados por Aldir Blanc para os sambas de João Bosco. Dentro ou fora de sua heterodoxa roda de samba, o CD Um Labirinto em Cada Pé pega o ouvinte pela palavra em época em que poucos têm o que dizer.

Luca disse...

De toda essa geração paulista que os críticos vem botando lá em cima, esse não me consegue descer pela goela, desculpa a quem gosta...

Anônimo disse...

Salve Rômulo Froés. Ares realmente novos para o surrado samba, novidades para o quase desgastado pop brasileiro. Letras imprevisíveis e melodias longe das cópias.

Raffa disse...

Mauro, o duplo "No Chão Sem o Chão" é de 2008.

Abraço.

Raffa disse...

Mauro,

O duplo "No Chão Sem o Chão" é de 2008.

Abraço.