Mauro Ferreira no G1

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quarta-feira, 8 de outubro de 2014

Aos 63 anos, Luiz Melodia cai em senhor suingue no maturado show 'Zerima'

Resenha de show
Título: Zerima
Artista: Luiz Melodia (em foto de Mauro Ferreira)
Local: Theatro Net Rio (Rio de Janeiro)
Data: 7 de outubro de 2014
Cotação: * * * 1/2

"Já sou um senhor de idade", brincou Luiz Melodia no palco do Theatro Net Rio, fazendo troça de seus 63 anos. Na noite de 7 de outubro de 2014, a idade interferiu no veludo da voz, que perdeu o viço e o alcance no fim da estreia carioca do show Zerima, a ponto de o cantor e compositor somente ter voltado para o bis - para cantar Magrelinha (Luiz Melodia, 1973) e Estácio, holy Estácio (Luiz Melodia, 1972), músicas de seu emblemático primeiro álbum, Pérola negra (Philips, 1973) - por insistência da plateia. Público generoso que reforçou o coro nestes dois sucessos de Melodia, ajudando o cantor carioca a finalizar o bis. Voz à parte, a apresentação mostrou que Melodia continua caindo em senhor suingue, escorado - no caso do show Zerima - nos arranjos do saxofonista Humberto Araújo, destaque da banda que também põe em evidência o guitarrista Renato Piau e o pianista Fernando Merlino. Azeitado, o show é inspirado no primeiro disco de inéditas lançado por Melodia em 13 anos, Zerima (Som Livre, 2014), cuja produção é assinada por Líber Gadelha e Humberto Araújo. Zerima é disco de tons eventualmente mais serenos, melancólicos, às vezes até nostálgicos. Um disco sobre amores e sobre dores de amores. Zerima, o show, incorporou um pouco destes matizes do delicado tempo da maturidade. Sobretudo no início, na música-título Zerima (Luiz Melodia, 2014) e no samba Dor de Carnaval (Luiz Melodia, 2014), que evoluiu em cena no compasso do samba-canção. Mas a dor bluesy na música de Melodia sempre foi temperada com aquele suingue personalíssimo, apr(e)endido pelo artista na sua vivência no Morro do Estácio, berço do samba e de Melodia na partida cidade do Rio de Janeiro (RJ). Esse molejo ficou exposto na arquitetura sincopada de Cheia de graça (Luiz Melodia e Ricardo Augusto, 2014) - uma das melhores músicas do disco que originou o show - e na manemolência que pauta Ébano (Luiz Melodia, 2014), único sucesso alocado na metade inicial do roteiro, inteiramente dedicada ao repertório do álbum Zerima. Se Papai do céu (Luiz Melodia, 2014) tendeu para o ritmo do reggae, a recriação funky do samba Maracangalha (Dorival Caymmi, 1956) ganhou a adesão do rap de Mahal Reis, filho de Melodia, enquanto Frágil força (Luiz Melodia e Ricardo Augusto, 1985) se revigorou no toque do baixo largo de Rômulo Duarte. Forte na essência, a reluzente Pérola negra (Luiz Melodia, 1971) - música lançada por Gal Costa em show apresentado em 1971 no mesmo palco em que Melodia fez a estreia carioca do show Zerima - foi entortada com direito a acento mais bluesy. O número antecedeu exuberante abordagem instrumental de Nanã (Coisa nº 5) (1962), obra-prima do maestro pernambucano Moacir Santos (1926 - 2006). O tema instrumental entrou em cena para fazer Melodia ganhar tempo e recuperar a voz, que deu sinais de cansaço notados mais pelo cantor do que pelo público (exceto no bis). Na volta ao palco, o Negro Gato reiterou a afeição pelo cancioneiro da Jovem Guarda, entoando com a devida ternura Parei... olhei (Rossini Pinto, 1965), música esquecida do repertório de Roberto Carlos. Na sequência, Congênito (Luiz Melodia, 1976) restaurou o suingue que norteia a obra de Melodia, senhor cantor, artista que vale mais do que pesa...

Um comentário:

Mauro Ferreira disse...

♪ "Já sou um senhor de idade", brincou Luiz Melodia no palco do Theatro Net Rio, fazendo troça de seus 63 anos. Na noite de 7 de outubro de 2014, a idade interferiu no veludo da voz, que perdeu o viço e o alcance no fim da estreia carioca do show Zerima, a ponto de o cantor e compositor somente ter voltado para o bis - para cantar Magrelinha (Luiz Melodia, 1973) e Estácio, holy Estácio (Luiz Melodia, 1972), músicas de seu emblemático primeiro álbum, Pérola negra (Philips, 1973) - por insistência da plateia. Público generoso que reforçou o coro nestes dois sucessos de Melodia, ajudando o cantor carioca a finalizar o bis. Voz à parte, a apresentação mostrou que Melodia continua caindo em senhor suingue, escorado - no caso do show Zerima - nos arranjos do saxofonista Humberto Araújo, destaque da banda que também põe em evidência o guitarrista Renato Piau e o pianista Fernando Merlino. Azeitado, o show é inspirado no primeiro disco de inéditas lançado por Melodia em 13 anos, Zerima (Som Livre, 2014), cuja produção é assinada por Líber Gadelha e Humberto Araújo. Zerima é disco de tons eventualmente mais serenos, melancólicos, às vezes até nostálgicos. Um disco sobre amores e sobre dores de amores. Zerima, o show, incorporou um pouco destes matizes do delicado tempo da maturidade. Sobretudo no início, na música-título Zerima (Luiz Melodia, 2014) e no samba Dor de Carnaval (Luiz Melodia, 2014), que evoluiu em cena no compasso do samba-canção. Mas a dor bluesy na música de Melodia sempre foi temperada com aquele suingue personalíssimo, apr(e)endido pelo artista na sua vivência no Morro do Estácio, berço do samba e de Melodia na partida cidade do Rio de Janeiro (RJ). Esse molejo ficou exposto na arquitetura sincopada de Cheia de graça (Luiz Melodia e Ricardo Augusto, 2014) - uma das melhores músicas do disco que originou o show - e na manemolência que pauta Ébano (Luiz Melodia, 2014), único sucesso alocado na metade inicial do roteiro, inteiramente dedicada ao repertório do álbum Zerima. Se Papai do céu (Luiz Melodia, 2014) tendeu para o ritmo do reggae, a recriação funky do samba Maracangalha (Dorival Caymmi, 1956) ganhou a adesão do rap de Mahal Reis, filho de Melodia, enquanto Frágil força (Luiz Melodia e Ricardo Augusto, 1985) se revigorou no toque do baixo largo de Rômulo Duarte. Forte na essência, a reluzente Pérola negra (Luiz Melodia, 1971) - música lançada por Gal Costa em show apresentado em 1971 no mesmo palco em que Melodia fez a estreia carioca do show Zerima - foi entortada com direito a acento mais bluesy. O número antecedeu exuberante abordagem instrumental de Nanã (Coisa nº 5) (1965), obra-prima do maestro pernambucano Moacir Santos (1926 - 2006). O tema instrumental entrou em cena para fazer Melodia ganhar tempo e recuperar a voz, que deu sinais de cansaço notados mais pelo cantor do que pelo público (exceto no bis). Na volta ao palco, o Negro Gato reiterou sua afeição pelo cancioneiro da Jovem Guarda, entoando com a devida ternura Parei... olhei (Rossini Pinto, 1965), música pouco lembrada do repertório de Roberto Carlos. Na sequência, Congênito (Luiz Melodia, 1976) restaurou o suingue que norteia a obra de Melodia, um senhor cantor, artista que vale mais do que pesa...