Mauro Ferreira no G1

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quarta-feira, 21 de outubro de 2015

Franco, álbum 'Vanusa Santos Flores' exala o cheiro forte das emoções reais

Resenha de CD
Título: Vanusa Santos Flores
Artista: Vanusa
Gravadora: Saravá Discos
Cotação: * * * *

Precedido pelo titubeante EP Vanusa Santos Flores, lançado em maio de 2014, o primeiro álbum de músicas inéditas da cantora e compositora paulista em 21 anos soa mais inteiro - em todos os sentidos - do que o disco do ano passado. Arquitetado e sonhado por seu produtor, Zeca Baleiro, o álbum Vanusa Santos Flores marca o feliz renascimento da artista. Por mais que essa sentença soe clichê, ela faz sentido. Assim como faz sentido este pulsante e sincero disco que traz a cantora de volta ao mercado fonográfico neste mês de outubro de 2015 depois de período de depressão, motivada por questões pessoais e amplificada pelo fato de a artista ter virado motivo de piadas impiedosas na web em 2009 por conta da propagação de vídeo no qual a cantora se atrapalhava com a letra caudalosa do Hino Nacional Brasileiro (Francisco Manoel da Silva e José Osório Duque Estrada, 1822 / 1909) em solenidade pública. "Como dói viver / Como demora pra ser / Verdade", conclui Vanusa ao fim dos versos de Traição (Vanusa, 1994), música que lançou em seu último álbum de repertório inédito, Hinos ao amor (Leblon Records, 1994) e que ora reapresenta em arranjo mais apurado, pautado pelas cordas orquestradas por Adriano Magoo. A propósito, Vanusa Santos Flores é disco de produção bem cuidada. Um disco gravado desde 2013 que demorou dois anos para se tornar verdade, entre retomadas e interrupções das gravações. A voz da cantora de 68 anos - é fato - já perdeu parte da potência, do alcance e o rigor estilístico detectados nas interpretações de seus LPs da áurea década de 1970, como sinalizam os registros de músicas como Tapete da sala (Luis Vagner, Antonio Luis e Vanusa, 2014), uma das quatro faixas do álbum adiantadas pelo EP do ano passado. Contudo, há força e há verdade no canto de Vanusa. Parafraseando verso de Compasso (Angela RoRo e Ricardo McCord, 2006), música que abre o disco na pegada roqueira da guitarra de Tuco Marcondes, o sangue da cantora pulsa no compasso quente de Vanusa Santos Flores. "Embora a vida seja um estandarte / Da maldade / Bem ou mal / Eu prefiro a verdade", ressalta Vanusa no delicado dueto com Baleiro na primeira parceria de ambos, Tudo aurora, canção enquadrada em apropriada moldura pop folk e composta por Baleiro a partir de poema lhe entregue por Vanusa. Há verdade - cabe repetir - nas dez gravações do álbum. E há sintonia com a fase mais popular da discografia da artista. A Vanusa que avisa em Mistérios (Zé Geraldo e Mário Marcos, 1981) que vai "cantar no meio do povo e sair para a vida de novo", salvando "esse pouco que ainda resta da minha juventude", evoca aquela cantora de Manhãs de setembro (Vanusa e Mário Campanha, 1973) que queria sair, falar, ensinar o vizinho a cantar após ter se fechado no muro em tardes de tristeza. Música que fecha o álbum, Mistérios foi uma das faixas adiantadas pelo EP de 2014 no qual Vanusa apresentou também Era disso que eu tava falando (Renata Fausti e Mário Marcos) e sua gravação de uma das mais belas baladas de Zé Ramalho, O silêncio dos inocentes, lançada pelo cantor e compositor paraibano no álbum O gosto da criação (BMG, 2002). Embora exista já há 13 anos, a canção soa como inédita na voz da cantora que em 1977 lançou Avohai, um dos clássicos do cancioneiro viajante de Ramalho. A voz de Vanusa em O silêncio dos inocentes parece mais límpida do que no registro do EP (consta que ela refez algumas vozes ao retomar as gravações do álbum neste álbum de 2015). Mas, no fim das contas, a qualidade da voz é o que menos conta neste disco em que Vanusa acerta com exatidão o tom melancólico de Esperando aviões (2003) - uma das canções mais pungentes da lavra do cantor e compositor mineiro Vander Lee - e grava a música mais famosa do repertório do grupo português Madredeus. Haja o que houver (Pedro Ayres Magalhães, 1997) soa como ato de resistência de Vanusa, recado que a cantora parece dar a si mesma. Haja o que houver, ela estará lá, à espera da mão amiga. A de Zeca Baleiro a fez sair para a vida de novo. "Alivia a minha história / O mundo anda em linha reta / Eu ando em linha torta", parece rogar nos versos de Abre aspas (Nô Stopa e Marcelo Bucoff, 2002). Em era de discos fakes, estrategicamente arquitetados para receber elogios da crítica robotizada, Vanusa Santos Flores é CD franco que exala o cheiro forte das emoções reais, mixando dores, solidões, superações e - acima de tudo! - a verdade dessa resistente cantora.

16 comentários:

Mauro Ferreira disse...

♪ Precedido pelo titubeante EP Vanusa Santos Flores, lançado em maio de 2014, o primeiro álbum de músicas inéditas da cantora e compositora paulista em 21 anos soa mais inteiro - em todos os sentidos - do que o disco do ano passado. Arquitetado e sonhado por seu produtor, Zeca Baleiro, o álbum Vanusa Santos Flores marca o feliz renascimento da artista. Por mais que essa sentença soe clichê, ela faz sentido. Assim como faz sentido este pulsante e sincero disco que traz a cantora de volta ao mercado fonográfico neste mês de outubro de 2015 depois de período de depressão, motivada por questões pessoais e amplificada pelo fato de a artista ter virado motivo de piadas impiedosas na web em 2009 por conta da propagação de vídeo no qual a cantora se atrapalhava com a letra caudalosa do Hino Nacional Brasileiro (Francisco Manoel da Silva e José Osório Duque Estrada, 1822 / 1909) em solenidade pública. "Como dói viver / Como demora pra ser / Verdade", conclui Vanusa ao fim dos versos de Traição (Vanusa, 1994), música que lançou em seu último álbum de repertório inédito, Hinos ao amor (Leblon Records, 1994) e que ora reapresenta em arranjo mais apurado, pautado pelas cordas orquestradas por Adriano Magoo. A propósito, Vanusa Santos Flores é disco de produção bem cuidada. Um disco gravado desde 2013 que demorou dois anos para se tornar verdade, entre retomadas e interrupções das gravações. A voz da cantora de 68 anos - é fato - já perdeu parte da potência, do alcance e o rigor estilístico detectados nas interpretações de seus LPs da áurea década de 1970, como sinalizam os registros de músicas como Tapete da sala (Luis Vagner, Antonio Luis e Vanusa, 2014), uma das quatro faixas do álbum adiantadas pelo EP do ano passado. Contudo, há força e há verdade no canto de Vanusa. Parafraseando verso de Compasso (Angela RoRo e Ricardo McCord, 2006), música que abre o disco na pegada roqueira da guitarra de Tuco Marcondes, o sangue da cantora pulsa no compasso quente de Vanusa Santos Flores. "Embora a vida seja um estandarte / Da maldade / Bem ou mal / Eu prefiro a verdade", ressalta Vanusa no delicado dueto com Baleiro na primeira parceria de ambos, Tudo aurora, canção enquadrada em apropriada moldura pop folk e composta por Baleiro a partir de poema lhe entregue por Vanusa. Há verdade - cabe repetir - nas dez gravações do álbum. E há sintonia com a fase mais popular da discografia da artista. A Vanusa que avisa em Mistérios (Zé Geraldo e Mário Marcos, 2014) que vai "cantar no meio do povo e sair para a vida de novo", salvando "esse pouco que ainda resta da minha juventude", evoca aquela cantora de Manhãs de setembro (Vanusa e Mário Campanha, 1973) que queria sair, falar, ensinar o vizinho a cantar após ter se fechado no muro em tardes de tristeza.

Mauro Ferreira disse...

Música que fecha o álbum, Mistérios foi uma das faixas adiantadas pelo EP de 2014 no qual Vanusa apresentou também Era disso que eu tava falando (Renata Fausti e Mário Marcos) e sua gravação de uma das mais belas baladas de Zé Ramalho, O silêncio dos inocentes, lançada pelo cantor e compositor paraibano no álbum O gosto da criação (BMG, 2002). Embora exista já há 13 anos, a canção soa como inédita na voz da cantora que em 1977 lançou Avohai, um dos clássicos do cancioneiro viajante de Ramalho. A voz de Vanusa em O silêncio dos inocentes parece mais límpida do que no registro do EP (consta que ela refez algumas vozes ao retomar as gravações do álbum neste álbum de 2015). Mas, no fim das contas, a qualidade da voz é o que menos conta neste disco em que Vanusa acerta com exatidão o tom melancólico de Esperando aviões (2003) - uma das canções mais pungentes da lavra do cantor e compositor mineiro Vander Lee - e grava a música mais famosa do repertório do grupo português Madredeus. Haja o que houver (Pedro Ayres Magalhães, 1997) soa como ato de resistência de Vanusa, recado que a cantora parece dar a si mesma. Haja o que houver, ela estará lá, à espera da mão amiga. A de Zeca Baleiro a fez sair para a vida de novo. "Alivia a minha história / O mundo anda em linha reta / Eu ando em linha torta", parece rogar nos versos de Abre aspas (Nô Stopa e Marcelo Bucoff, 2002). Em era de discos fakes, estrategicamente arquitetados para receber elogios da crítica robotizada, Vanusa Santos Flores é CD franco que exala o cheiro forte das emoções reais, mixando dores, solidões, superações e - acima de tudo! - a verdade dessa resistente cantora.

Rafael disse...

Curioso para ouvir esse trabalho novo da Vanusa... Já havia gostado das 4 faixas que ela tinha lançado no EP do ano passado... E agora esse disco parece estar sensacional...

Carlos Almeida disse...

Mauro,
A música "Mistérios" não é inédita. Foi lançada por seu autor Zé Geraldo em 1981, no disco que leva o seu nome.

Anderson Lopes disse...

A Vanusa é uma vítima dessa internet maldosa que não respeita os seus artistas de verdade. É ótimo ver o renascer de uma cantora que é a cara da música pop de outros tempos( e deste tempo também!). O ano segue feliz para a nossa música!!

Unknown disse...

Quem gravou Paralelas,de Belchior com tanta propriedade e beleza ,merece e precisa ser reverenciada sempre.É óbvio que a obra de Vanusa não se resume apenas a uma canção,contudo,se fosse,já seria motivo suficiente para respeitá-la.Tenho pena daqueles que conhecem apenas a cantora que erra O Hino Nacional.

Mauro Ferreira disse...

Carlos Almeida, grato pelo toque. De fato, pesquisei e constatei que 'Mistérios' foi lançada em 1981 por Geraldo. Já consertei a informação. Abs, MauroF

Unknown disse...

Esse disco é muito bem feito! A capa, todo o conceito de arte, a foto lindaaaa ,este tom azul...a produção, as músicas..enfim...tudo muito bem colocado. Vanusa merece toda esta beleza feita em torno deste álbum e nós também merecemos. Viva Vanusa :)

Unknown disse...

Eu estava pra ler a resenha mais por causa da produçao do Baleiro, por que nao conheço a carreira e trabalho de Vanusa (aliás Baleiro esta a mil por hora fazendo mil coisas) me interessei mais a ler a resenha a partir de sua postagem no Facebook sobre o disco, quero deixar aqui meus parabéns a você Mauro por seu profissionalismo e por saber reconhecer e voltar atrás e rever suas opiniões no caso sobre o disco da Vanusa. Muitos vão dizer que vc esta em cima do muro e blá blá blá.. mais uma vez aqui minha admiração pelo seu trabalho que ao meu ver é sempre justo e fiel aos seus princípios, pois o blog é um meio de sempre sabermos das novidades a nós que amamos a musica brasileira
Obs: Vanusa deve estar feliz pelo texto. E pra quem nao entender meu comentário vá no Facebook do Mauro que vao ver o motivo do mesmo, Abç..

Unknown disse...

Aah o disco tem uma bela capa

Unknown disse...

Mauro, alguma previsão de lançamento no Spotify? Estou curioso para ouvir! :-)
Abraço, parabéns pelo trabalho!

Mauro Ferreira disse...

Bruno, até o fim do mês, em tese, o disco de Vanusa vai estar nas plataformas digitais. Abs, MauroF

ADEMAR AMANCIO disse...

As cordas ou pregas vocais por ser um músculo envelhece naturalmente com o tempo.Há tantos recursos hoje pra melhorar a voz que a verdade maior do disco talvez seja essa,a passagem do tempo.

Paulo Sanches disse...

Vejo a coisa da seguinte maneira: comprei o disco em respeito à Vanusa pelo ocorrido a fim de prestigiá-la, porém, para ouvir a obra, decidi não ligar nada a coisa alguma, como se fosse tudo completamente desconhecido, novo, e o que encontrei? Músicas agradáveis, bem produzidas, letras modernas, arranjos atuais, musícas belíssimas, voz que fala ao meu coração - limpa, linda, bem pronunciada, entoada no tanto certo. Desafio: coloque o CD no modo repeat às 8 horas da manhã e deixa rodar até encher o saco. Você não irá desligar porque não vai encher o saco. Não cobrem ela para que queira ser a Rainha, a última bolacha do pacote, pois ela é o que é, e talvez seja isso, mas a vejo como uma cantora de altíssima qualidade e cada lar brasileiro deveria ter um CD dela em seu player. Talvez o mundo fosse um pouco melhor.

ELIEL SILVA disse...

Vanusa, uma das minhas paixões, em se tratando de cantora brasileira. Tenho as duas caixas que foram lançadas e agora já fiz o pedido desse último trabalho. Já estou amando antes mesmo de ouvir. Essa resenha tão franca que acabo de ler já me disse tudo.

Leo2505 disse...

Vanusa Bloody Vanusa