Mauro Ferreira no G1

Aviso aos navegantes: desde 6 de julho de 2016, o jornalista Mauro Ferreira atualiza diariamente uma coluna sobre o mercado fonográfico brasileiro no portal G1. Clique aqui para acessar a coluna. O endereço é http://g1.globo.com/musica/blog/mauro-ferreira/


segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Sem formalidades, 'Jam Session' expõe a face mais chique de Alcione

Resenha de CD e DVD
Título: Duas Faces - Jam Session
Artista: Alcione
Gravadora: Marrom Music / Biscoito Fino
Cotação: * * * 1/2

De anos em anos, Alcione grava um projeto que foge do tom populista de sua discografia recente. Um deles foi o irretocável disco ao vivo Nos Bares da Vida (2000). Primeiro dos dois títulos que festejam os 40 anos de carreira da cantora, o CD / DVD Duas Faces - Jam Session se enquadra nessa linha mais chique por conta da seleção (boa e nada óbvia) do repertório garimpado na memória afetiva da cantora. Captado na casa da Marrom, em informal clima de confraternização, o registro costura depoimentos com números musicais, alguns feitos em duetos pautados por essa mesma afetividade. O encontro de Áurea Martins com Alcione em Pela Rua (Dolores Duran e J. Ribamar) é destaque pelo canto nobre de Áurea, aplaudida em cena por Maria Bethânia, que, por sua vez, não se mostra na melhor de sua forma ao reviver com Alcione Sem Mais Adeus (Francis Hime e Vinicius de Moraes) em clima seresteiro. Aliás, Bethânia quase nunca brilha em trabalhos alheios gravados fora de seu universo musical (embora sua faixa tenha sido arranjada por seu fiel maestro Jaime Alem). Samba de Djavan, regravado por Alcione com o compositor, Capim é veículo para a intérprete mostrar o suingue exercitado desde os tempos em que cantava na noite carioca. Colega destes tempos de crooner, Emílio Santiago junta sua voz aveludada à da Marrom em outro samba, 40 Anos (Altay Veloso e Paulo César Feital), inserido no roteiro pela alusão indireta às quatro décadas de carreira fonográfica da artista. Que extrapola as fronteiras brasileiras em sua Jam Session. Após apresentar inédita de Ivor Lancellotti e Paulo César Pinheiro, Quem Já Esteve Só, até então guardada no baú da cantora, Alcione cai com gosto em boleros como Estate (Bruno Martino e Bruno Brighetti) e Todavía (Armando Manzanero). No fim, a veia nordestina da cantora maranhense salta em Evolução (José Cavalcante de Albuquerque) - sucesso do cantor paraense Ary Lobo (1930 - 1980) que a anfitriã reaviva com Lenine - e na baianíssima Ilha de Maré (Walmir Lima e Lupa) que deságua na Roda Ciranda, música de Martinho da Vila (lançada por Alcione em 1984), convidado do medley que expõe a face mais brasileira do repertório da cantora. Face que poderia ter sido mais explorada nesta informal e afetiva Jam Session que prioriza um (fino) repertório apaixonado, bem ao gosto da Marrom, geralmente mais sedutora nos discos em que mostra todas as cores musicais do Brasil, como os gravados nos anos 80. No todo, Duas Faces - Jam Session representa upgrade na discografia multifacetada de Alcione.

11 comentários:

Mauro Ferreira disse...

De anos em anos, Alcione grava um projeto que foge do tom populista de sua discografia recente. Um deles foi o irretocável disco ao vivo Nos Bares da Vida (2000). Primeiro dos dois títulos que festejam os 40 anos de carreira da cantora, o CD / DVD Duas Faces - Jam Session se enquadra nessa linha mais chique por conta da seleção (nada óbvia) do repertório garimpado na memória afetiva da cantora. Captado na casa da Marrom, em informal clima de confraternização, o registro costura depoimentos com números musicais, alguns feitos em duetos pautados por essa mesma afetividade. O encontro de Áurea Martins com Alcione em Pela Rua (Dolores Duran e J. Ribamar) é destaque pelo canto nobre de Áurea, aplaudida em cena por Maria Bethânia, que, por sua vez, não se mostra na melhor de sua forma ao reviver com Alcione Sem Mais Adeus (Francis Hime e Vinicius de Moraes) em clima seresteiro. Aliás, Bethânia quase nunca brilha em trabalhos alheios gravados fora de seu universo musical (embora sua faixa tenha sido arranjada por seu fiel maestro Jaime Alem). Samba de Djavan, regravado por Alcione com o compositor, Capim é veículo para a intérprete mostrar o suingue exercitado desde os tempos em que cantava na noite carioca. Colega destes tempos de crooner, Emílio Santiago junta sua voz aveludada à da Marrom em outro samba, 40 Anos (Altay Veloso e Paulo César Feital), inserido no roteiro pela alusão indireta às quatro décadas de carreira fonográfica da artista. Que extrapola as fronteiras brasileiras em sua Jam Session. Após apresentar inédita de Ivor Lancellotti e Paulo César Pinheiro, Quem Já Esteve Só, até então guardada no baú da cantora, Alcione cai com gosto em boleros como Estate (Bruno Martino e Bruno Brighetti) e Todavía (Armando Manzanero). No fim, a veia nordestina da cantora maranhense salta em Evolução (José Cavalcante de Albuquerque) - sucesso do cantor paraense Ary Lobo (1930 - 1980) que a anfitriã reaviva com Lenine - e na baianíssima Ilha de Maré (Walmir Lima e Lupa) que deságua na Roda Ciranda, música de Martinho da Vila (lançada por Alcione em 1984), convidado do medley que expõe a face mais brasileira do repertório da cantora. Face que poderia ter sido mais explorada nesta informal e afetiva Jam Session que prioriza um (fino) repertório apaixonado, bem ao gosto da Marrom, geralmente mais sedutora nos discos em que mostra todas as cores musicais do Brasil, como os gravados nos anos 80. No todo, Duas Faces - Jam Session representa upgrade na discografia multifacetada de Alcione.

leitordomauro disse...

Por que artistas como Maria Bethânia e Alcione lançam essa quantidade de discos ? Não dá tempo nem de avaliar a importância desses álbuns. Disco bom não sai a toda hora precisa de algum tempo para ser feito, analisado e posto no mercado.

Unknown disse...

Bethânia lança sempre discos sim,coisas que só nós fãs apreciamos,quem fala mal só pode ser fã de Calypso.

Unknown disse...

Duas faces ao vivo na mangueira sai em janeiro,conforme e-mail da biscoito fino

KL disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anônimo disse...

Nao sou uma conhecedora do mundo da musica, apenas ouço porque amo musica, agora tenho que concordar com KL e LeitordoMauro, essas cantoras lançam muita coisa é um desespero, fica vago, antigamente o artista era lembrado por aquele tal album, sua influencia, suas mudanças e tantos fatores. Hoje em dia é só soltando videos misteriosos na internet, poe qualquer nome que ninguem imaginava e lança no mercado. Depois fica dando entrevista falando do passado. Eu nem faço questao de ficar ouvindo muito, respeito pois sao artista, mas enche esse desepero por lançamentos.

KL disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Káyon disse...

Véio, me amarro muito no vozeirão blues dessa negona. Prefiro seu lado B, mas seu lado A também carrega uma assinatura marcante e verdadeira. Sinto falta disso nas cantoras bonitinhas, floridinhas e cool que surgem aos montes por aí.
Agora, achei a sua resenha fraquinha, meu.

Abraço.

Eduardo Cáffaro disse...

Opiniões ... em parte concordo com KL, que muita gente usa do artificio de estar lançando algo, para não sair da mídia. Mas tb me lembro que entre os anos 70 , 80 e 90, os contratos eram de 1 album por ano, e tinha de gravar por causa do contrato, fosse bom ou ruim. Hoje acho que os artistas ( alguns ) tem mais liberdade e podem ( e devem ) lançar vários trabalhos. Para mim Bethânia fez otimos trabalhos na Biscoito Fino- por exemplo. Cabe ao consumidor escolher se vai querer aquele projeto ou não. Uma música boa é absorvida de imediato, não leva 1 ou 3 anos para que o artista faça outra coisa interessante. A inspiração pode vir jorrando num ano, e minguar no próximo. Se Whitney Houston tivesse gravado 1 album por ano, hoje teríamos mais gravações com sua linda voz. Mas infelizmente seu intervalo era de 4 ou 5 anos, e agora não canta mais. Quem perdeu fomos nós, os fãs que temos de nos contentar com o que deu tempo de gravar. Concluindo : deixa o(a) cara gravar e produzir ! A seleção quem faz é quem tá afim de ouvir, comprar ... ou simplesmente deixar lá ... Bom Natal e otimo fim de ano a todos ! Mauro valeu por mais um ano de NOTAS MUSICAIS ! Adoro seu Blog !

douglascigarramarron disse...

Alcione é uma cantora a moda antiga ,isso faz dela esse sucesso,veste o contemporâneo com roupas de Alcione,fora a voz que é um colosso.

RURIK VARDA disse...

Penso que há poucas cantoras capazes de cantar bem samba, bolero, chanson, jazz, forró, balada, toada de boi, a ponto de passar de um gênero ao outro com a mesma organicidade e desenvoltura. E melhor: sem soar como mero exibicionismo desnecessário. Alcione seguramente é uma dessas cantoras.

É curioso observar que nos últimos anos algumas jovens cantoras se aventuraram no universo do samba, gravando CDs dedicados ao gênero. Em geral, essas mesmas cantoras quase se desculpam ao dizerem “gravo samba mas não sou sambista”, como se não estivessem à altura de tal empreitada. No caso de Alcione ocorre justamente o contrário. É comum ouvirmos “ela não é ‘apenas’ sambista”, ou “apenas cantora de baladas”, ou “cantora de músicas regionais”. Ela subverte os rótulos, para alegria de alguns e desgosto dos puristas. E para um certo desgosto meu, confesso. Habito o lugar comum daqueles que adorariam desassociar seu timbre tão particular das baladas românticas que rechearam seus trabalhos nas últimas décadas. Muito embora reconheça que há muita verdade no seu canto, seja ele qual for.

Quanto ao seu novo trabalho, Jam Session, acabo de ouvi-lo e gostei bastante. Primeiro porque, concordando com o blogueiro, o repertório não é nada óbvio. A começar pela inclusão da bela e melancólica composição de Paulo César Pinheiro e Ivor Lancelloti ‘Quem já esteve só’, que, na verdade, já havia sido gravada anteriormente pela cantora Beth Nazar no pouco conhecido álbum ‘Dia a Dia’, produzido por Eduardo Gudin, se não me engano, no início dos anos 2000.

Os registros em espanhol, italiano e francês atestam as qualidades da grande cantora e intérprete que Alcione é. Destaco a bela canção ‘Comme ils disent’ de Aznavour, que conta a história de um homossexual que mora com a mãe num apartamento em Paris e se traveste à noite. Um achado que a Marrom interpreta de forma elegante e emocional. Com grande categoria e vigor, a Marrom defende também a canção napolitana ‘Passione eterna’, num arranjo caloroso e sensual.

Entre os duetos, não há como não destacar a presença de Áurea Martins. Com seu canto denso e profundo, ela valoriza cada palavra da poesia de Dolores Duran. Bonito de ver o momento em que Bethânia, fora de cena, acompanha as duas sussurrando compenetrada a música. Bonito de ver também a generosidade de Alcione cedendo praticamente toda a música para o canto de Áurea. Momentos de emoção verdadeira e admiração mútua. Lindo de ver.

Só lamentei o fato de não ter havido espaço para que algumas histórias da época em que os quatro (Alcione, Djavan, Áurea e Emílio) cantavam na noite viessem à tona. Seria bacana e, creio eu, divertido trazer ao conhecimento do público algumas passagens desse período.

Do repertório do CD, deixaria de fora apenas ‘Mesa de Bar’ (já registrado eu duas outras oportunidades pela cantora). Acho que Gonzaguinha poderia ser evocado através de ‘Recado’, por exemplo, que a Marrom já registrou nos anos 80, esbanjando suingue e vigor, numa gravação que não consta de sua discografia.

‘A Voz de Uma Pessoa Vitoriosa’ feita pra Marrom sob encomenda de Bethânia talvez pudesse figurar nesse trabalho também.

No mais, entre pequenos e grandes acertos desse trabalho, fica no imaginário uma frase que Áurea Martins disse certa vez sobre Alcione: “há pelos menos dez cantoras dentro dessa mulher”. Certamente há.

Desculpe-me, Mauro, se me estendi nos comentários.

Abraço.