Mauro Ferreira no G1

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segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Obra já cristalizada de Paulinho ganha movimentos sutis em show no Rio

Resenha de show
Título: 50 anos de carreira
Artista: Paulinho da Viola (em foto de Rodrigo Goffredo)
Local: Vivo Rio (Rio de Janeiro, RJ)
Data: 6 de setembro de 2014
Cotação: * * * * 1/2

Construída desde 1964, a obra de Paulinho da Viola já está cristalizada. É um trabalho de ourives, desenvolvido em ritmo próprio, com a paciência e o requinte dos melhores marceneiros, ofício também exercido por este cantor, compositor e músico carioca. Mas esse cancioneiro - resumido por Paulinho no show comemorativo de seus 50 anos de carreira - permanece em sutis movimentos, como perceberam os espectadores mais atentos da apresentação que lotou a casa Vivo Rio, no Rio de Janeiro (RJ), cidade natal do artista, na noite de 6 de setembro de 2014. Um exemplo desse movimento permanente, talvez imperceptível para quem espera a novidade na forma de um álbum de inéditas que suceda o já distante Bebadosamba (BMG-Ariola, 1996), reside na genialidade do arranjo de Sinal fechado (Paulinho da Viola, 1969), uma das canções mais inventivas do ourives por seu flerte com signos da música erudita e por jamais explicitar as tradições do samba e do choro que pautam a obra autoral de Paulinho. Pois o arranjo - do pianista Cristóvão Bastos, arranjador do show e integrante da banda calcada na percussão de músicos como André, Celsinho Silva, Hércules e Paulinho - abre novos caminhos harmônicos para Sinal fechado no toque da flauta de Mário Sève, em movimento sutil de show cujo bis foi ousadamente encerrado pelo cantor com tema instrumental, Um sarau para Raphael (Paulinho da Viola, 2001), gravado pelo grupo Nó em Pingo d´Água em disco dividido com Cristóvão Bastos. Raphael é - claro - Raphael Rabello (1962 - 1995), às do violão que também bebeu da fonte rica que abastece a obra de Paulinho há cinco décadas. Contudo, a rigor, Paulinho oferece em cena o que seu público quer, apresentando um best of de sua carreira no roteiro autoral que totalizou 29 músicas na apresentação do Vivo Rio. Anunciado pela mídia carioca com ares de estreia oficial da turnê nacional com que o artista festeja seus 50 anos de carreira, o show - a rigor - já vem rodando algumas capitais do Brasil desde o primeiro semestre de 2014. Aberto com set solo de voz e violão, em que o cantor amalgama músicas seminais como 14 anos (Paulinho da Viola, 1966) e Coisas do mundo, minha nega (Paulinho da Viola, 1967), o show ganha o reforço da elegante cozinha quando, na sequência desse bloco inicial, Paulinho pega o cavaquinho para reviver Botafogo, chão de estrelas (Paulinho da Viola e Aldir Blanc, 1988), samba fornecido para o primeiro álbum do cantor e compositor carioca Walter Alfaiate (1930 - 2010). A partir daí, Paulinho começa a enfileirar sambas antológicos de sua autoria e - eventualmente - de compositores que conheceu nas rodas de samba dos anos 1960, caso do carioca Zé Kétti (1921 - 1999), de cuja obra o cantor desencava Jaqueira da Portela, samba de 1963. Cabe ressaltar que, embora jamais ignore hits obrigatórios como Foi um rio que passou em minha vida (1970) e Pecado capital (1975), Paulinho soube pescar pérolas em seu próprio baú para montar o roteiro deste show em que, como de hábito, o artista se alterna entre o violão e o cavaquinho. Samba que compôs com Elton Medeiros e que gravou no álbum Zumbido (EMI-Odeon, 1979), Recomeçar volta à cena, se confirmando um dos títulos mais belos do repertório autoral do artista. Veículo para as dissonâncias do arranjo inventivo, Roendo as unhas (1973) é outra pérola mais rara nos shows do artista. Tema de maior densidade, Tudo se transformou (1970) reitera que tudo ainda pode se transformar em cena, embora tudo pareça sempre igual porque Paulinho bebe sempre do samba e do choro mais nobres, solto no seu próprio tempo e à vontade no seu próprio espaço. Bebadosamba (1996), aliás, é outra grata lembrança do roteiro desse show que mostra a riqueza da fonte do samba - e do choro - de Paulinho da Viola.

Um comentário:

Mauro Ferreira disse...

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