Mauro Ferreira no G1

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quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Poder da música sucumbe aos excessos de musical sobre o 'Rock in Rio'

Resenha de musical
Título: Rock in Rio - O musical
Texto: Rodrigo Nogueira
Direção: João Fonseca
Direção musical e arranjos: Délia Fischer
Elenco: Hugo Bonemer, Yasmim Gomlevsky, Lucinha Lins, Guilherme Leme, Ícaro Silva,
           Kacau Gomes, Emilio Dantas, Luiz Pacini, Caike Luna, Marcelo Varzea, Bruno
           Sigrist, Lyv Ziese, Romulo Neto, Karen Junqueira, Juliane Bodini, Stephanie
           Serrat, Danieke Falcone, Sheila Matos, Alessandro Brandão, Chris Penna,
           Bruno Fraga, Marcelo Carvalho, Marcelo Nogueira, Bruno Narchi e Marina Palha
Fotos: Divulgação / Guga Melgar
Cotação: * * 1/2
Musical em cartaz na Grande Sala da Cidade das Artes, no Rio de Janeiro (RJ)

Ode juvenil ao poder aglutinador e transformador da música, o espetáculo Rock in Rio - O musical peca pelo excesso. Ao longo das três horas de duração do musical orçado em R$ 12 milhões, o elenco de 25 atores - dirigido por João Fonseca e movido a uma energia jovial que é o próprio motor da encenação - dribla como pode as armadilhas do texto irregular de Rodrigo Nogueira, jovem dramaturgo que vem dando expressiva contribuição ao teatro carioca, mas derrapa na construção dos diálogos de trama que entrelaça a história política do Brasil com a idealização de um festival pelo ex-cantor Orlando (Guilherme Leme), personagem obviamente inspirado na saga do empresário Roberto Medina ao montar o primeiro Rock in Rio em 1985. Filhos de supostas vítimas fatais da ditadura instaurada no Brasil em 1964, os protagonistas Alef (Hugo Bonemer, ótimo ator revelado ao protagonizar em 2010 a segunda montagem brasileira de Hair) e Sofia (Yasmin Gomlevsky) se envolvem afetivamente nesse universo pop ao som de números musicais que nem sempre contribuem para ilustrar ou fazer avançar a narrativa. Alef é rapaz traumatizado que se refugia na música. Sofia é a rebelde que, embora tenha sua causa, soa inconvincente no começo do musical por conta das falas artificiais escritas para a personagem. De início, Sofia somente cospe erudição e arrogância da boca para fora. A personagem somente começa a se tornar real a partir da cena em que propõe a invasão da reitoria da faculdade pela turma à qual tenta se integrar. É quando o tom de suas falas começa a se tornar mais verossímil. No papel de Gloria, mãe de Alef, Lucinha Lins também sofre em suas cenas iniciais por conta da mesma artificialidade das falas de sua personagem. Aos poucos, contudo, sua personagem também entra no tom e tem um bom momento musical ao expor seu amor incondicional ao filho ao som de You've got a friend (Carole King, 1971), sucesso de James Taylor, uma das atrações da primeira das quatro edições do Rock in Rio realizadas na cidade natal do Rio de Janeiro (RJ). Infelizmente, Nogueira optou por verter para o português o hit de Taylor e outras músicas estrangeiras como Wonderwall (Noel Gallagher, 1995), balada do grupo inglês Oasis entoada pelo casal Alef e Sofia. Falta fluência às versões de Nogueira, com exceção da escrita para Don't let the sun go down on me (Elton John e Bernie Taupin, 1974), canção que representa momento de emoção real ao fim do (longo) primeiro ato. Aliás, na escolha de músicas que traduzam em cena os sentimentos das personagens, Primeiros Erros (Kiko Zambianchi, 1985) merece menção honrosa. O harmonioso dueto de Alef e Sofia na canção resulta especialmente bonito. Como cantores, nem todos os atores têm cacife vocal para figurar num musical. Uma das exceções é Kacau Gomes, que encarna Diana - vendedora da loja de discos na qual está ambientada parte da história - e que aproveita sua chance ao soltar a voz em Pessoa Nefasta (Gilberto Gil, 1984), em número dividido com o núcleo de personagens da loja. Alguns personagens, aliás, são totalmente dispensáveis, como Alice (Sheila Matos), fã de Roberto Carlos que passa a peça soltando frases sem graça sobre o Rei. Quem consegue soar engraçado de forma natural é Ícaro Silva, grata revelação no papel de Marvin, o melhor amigo de Alef. De todo modo, há excesso de subtramas no texto. Talvez pela inexperiência na escrita de um musical de grande porte, Nogueira caiu na tentação de tentar desenvolver todas as personagens. O resultado é um segundo ato que praticamente anula a presença do casal protagonista em cena para dar voz a todas as personagens secundárias que compõem o painel de jovens apresentado no primeiro ato - com o agravante de que muitas personagens não ostentam a concretude de personagens. São somente tipos estereotipados, como o maconheiro Raul (Romulo Neto), o metaleiro Anthony (Alessandro Brandão) e o produtor homossexual Geraldo, papel com o qual Caike Luna arranca risos contínuos da plateia ao explorar com eficiência a caricatura gay (sobretudo no segundo ato) em linha zorra total. Mesmo pecando pelos excessos, Rock in Rio - O musical tem lá seus bons momentos. Cantado pelos alunos da faculdade, o vibrante medley com músicas da banda Legião Urbana - Tempo perdido (Renato Russo, 1986), Será (Renato Russo, Dado Villa-Lobos e Marcelo Bonfá, 1985 ) e Geração Coca-cola (Renato Russo, 1985) - resulta em cena como a mais perfeita tradução da indignação juvenil que move a galera retratada no palco por Nogueira. Da mesma forma, a ânsia jovem de se libertar do jugo dos pais e do status quo está muito bem traduzida por Freedom 90 (George Michael, 1990), número entoado por Alef com o elenco masculino caracterizado como o próprio Alef (como pode ser visto na foto de Guga Melgar que ilustra a resenha). Mesmo sem qualquer liga com o espetáculo, o número coletivo que abre o primeiro ato, Pro Dia Nascer Feliz (Frejat e Cazuza, 1983), tem força e impacto visual porque o elenco aparece caracterizado como cantores que figuraram no elenco das quatro edições cariocas do Rock in Rio, festival que sempre quebrou fronteiras estilísticas ao ir além do rock que lhe dá nome. Por isso, faz sentido também o imenso medley Todas as tribos que abre o segundo ato. Neste segundo ato, Lucinha Lins tira hit de Ivete Sangalo do universo carnavalesco - Sorte grande (Lourenço Olegário), e não Poeira como creditado erroneamente no programa do musical - e Emilio Dantas protagoniza, na pele de Roger, o número musical mais dramático do espetáculo. Trata-se do medley que une um sucesso de Cazuza (1958 - 1990) - Vida Louca Vida (Lobão e Bernardo Vilhena, 1987) - com outro de Freddie Mercury (1946 - 1991) à frente do grupo Queen, Bohemiam rhapsody (Freddie Mercury, 1975). A junção não é aleatória: embora a palavra aids não seja mencionada ao longo do musical, fica subentendido que a personagem Roger se contaminou com o vírus HIV por conta do uso de drogas. O número tem impacto. No fim, outro sucesso de Mercury lançado no mesmo ano de 1975, Love of my life, embala o previsível final romântico do casal protagonista com a tentativa de reproduzir, com o reforço da plateia, o coro histórico da canção na primeira edição do festival. Enfim, Rock in Rio - O musical tem seus méritos. Diretor de musicais bem-sucedidos como Vale tudo, sobre Tim Maia (1942 - 1998), João Fonseca orquestra bem a monumental produção. Délia Fischer também se sai bem na direção musical do espetáculo. O (grave) problema do espetáculo reside no tom artificial de parte do texto de Rodrigo Nogueira - titubeante na condução da história - e no próprio excesso de duração do musical. O fato de o segundo ato - situado durante a realização do fictício festival organizado por Orlando - praticamente ter outro tom e outra linha narrativa é um indício da inexperiência do autor para encarar empreitada de tal porte sem diluir a unidade do texto. Ao longo do desfile de 50 sucessos nacionais e estrangeiros, de variados gêneros e épocas, é permanente a sensação de que o poder da música às vezes sucumbe aos excessos da produção.

9 comentários:

Mauro Ferreira disse...

Ode juvenil ao poder aglutinador e transformador da música, o espetáculo Rock in Rio - O musical peca pelo excesso. Ao longo das três horas de duração do musical orçado em R$ 12 milhões, o elenco de 25 atores - dirigido por João Fonseca e movido a uma energia jovial que é o próprio motor da encenação - dribla como pode as armadilhas do texto irregular de Rodrigo Nogueira, jovem dramaturgo que vem dando expressiva contribuição ao teatro carioca, mas derrapa na construção dos diálogos de trama que entrelaça a história política do Brasil com a idealização de um festival pelo ex-cantor Orlando (Guilherme Leme), personagem obviamente inspirado na saga do empresário Roberto Medina ao montar o primeiro Rock in Rio em 1985. Filhos de supostas vítimas fatais da ditadura instaurada no Brasil em 1964, os protagonistas Alef (Hugo Bonemer, ótimo ator revelado ao protagonizar em 2010 a segunda montagem brasileira de Hair) e Sofia (Yasmin Gomlevsky) se envolvem afetivamente nesse universo pop ao som de números musicais que nem sempre contribuem para ilustrar ou fazer avançar a narrativa. Alef é rapaz traumatizado que se refugia na música. Sofia é a rebelde que, embora tenha sua causa, soa inconvincente no começo do musical por conta das falas artificiais escritas para a personagem. De início, Sofia somente cospe erudição e arrogância da boca para fora. A personagem somente começa a se tornar real a partir da cena em que propõe a invasão da reitoria da faculdade pela turma à qual tenta se integrar. É quando o tom de suas falas começa a se tornar mais verossímil. No papel de Gloria, mãe de Alef, Lucinha Lins também sofre em suas cenas iniciais por conta da mesma artificialidade das falas de sua personagem. Aos poucos, contudo, sua personagem também entra no tom e tem um bom momento musical ao expor seu amor incondicional ao filho ao som de You've got a friend (Carole King, 1971), sucesso de James Taylor, uma das atrações da primeira das quatro edições do Rock in Rio realizadas na cidade natal do Rio de Janeiro (RJ). Infelizmente, Nogueira optou por verter para o português o hit de Taylor e outras músicas estrangeiras como Wonderwall (Noel Gallagher, 1995), balada do grupo inglês Oasis entoada pelo casal Alef e Sofia. Falta fluência às versões de Nogueira, com exceção da escrita para Don't let the sun go down on me (Elton John e Bernie Taupin, 1974), canção que representa momento de emoção real ao fim do (longo) primeiro ato. Aliás, na escolha de músicas que traduzam em cena os sentimentos das personagens, Primeiros Erros (Kiko Zambianchi, 1985) merece menção honrosa. O harmonioso dueto de Alef e Sofia na canção resulta especialmente bonito. Como cantores, nem todos os atores têm cacife vocal para figurar num musical. Uma das exceções é Kacau Gomes, que encarna Diana - vendedora da loja de discos na qual está ambientada parte da história - e que aproveita sua chance ao soltar a voz em Pessoa Nefasta (Gilberto Gil, 1984), em número dividido com o núcleo de personagens da loja. Alguns personagens, aliás, são totalmente dispensáveis, como Alice (Sheila Matos), fã de Roberto Carlos que passa a peça soltando frases sem graça sobre o Rei. Quem consegue soar engraçado de forma natural é Ícaro Silva, grata revelação no papel de Marvin, o melhor amigo de Alef. De todo modo, há excesso de subtramas no texto. Talvez pela inexperiência na escrita de um musical de grande porte, Nogueira caiu na tentação de tentar desenvolver todas as personagens. O resultado é um segundo ato que praticamente anula a presença do casal protagonista em cena para dar voz a todas as personagens secundárias que compõem o painel de jovens apresentado no primeiro ato - com o agravante de que muitas personagens não ostentam a concretude de personagens. São somente tipos estereotipados, como o maconheiro Raul (Romulo Neto), o metaleiro Anthony (Alessandro Brandão) e o produtor homossexual Geraldo, papel com o qual Caike Luna arranca risos contínuos da plateia ao explorar com eficiência a caricatura gay (sobretudo no segundo ato) em linha zorra total.

Mauro Ferreira disse...

Mesmo pecando pelos excessos, Rock in Rio - O musical tem lá seus bons momentos. Cantado pelos alunos da faculdade, o vibrante medley com músicas da banda Legião Urbana - Tempo perdido (Renato Russo, 1986), Será (Renato Russo, Dado Villa-Lobos e Marcelo Bonfá, 1985 ) e Geração Coca-cola (Renato Russo, 1985) - resulta em cema como a mais perfeita tradução da indignação juvenil que move a galera retratada no palco por Nogueira. Da mesma forma, a ânsia jovem de se libertar do jugo dos pais e do status quo está muito bem traduzida por Freedom 90 (George Michael, 1990), número entoado por Alef com o elenco masculino caracterizado como o próprio Alef (como pode ser visto na foto de Guga Melgar que ilustra a resenha). Mesmo sem qualquer liga com o espetáculo, o número coletivo que abre o primeiro ato, Pro Dia Nascer Feliz (Frejat e Cazuza, 1983), tem força e impacto visual porque o elenco aparece caracterizado como cantores que figuraram no elenco das quatro edições cariocas do Rock in Rio, festival que sempre quebrou fronteiras estilísticas ao ir além do rock que lhe dá nome. Por isso, faz sentido também o imenso medley Todas as tribos que abre o segundo ato. Neste segundo ato, Lucinha Lins tira hit de Ivete Sangalo do universo carnavalesco - Sorte grande (Lourenço Olegário), e não Poeira como creditado erroneamente no programa do musical - e Emilio Dantas protagoniza, na pele de Roger, o número musical mais dramático do espetáculo. Trata-se do medley que une um sucesso de Cazuza (1958 - 1990) - Vida Louca Vida (Lobão e Bernardo Vilhena, 1987) - com outro de Freddie Mercury (1946 - 1991) à frente do grupo Queen, Bohemiam rhapsody (Freddie Mercury, 1975). A junção não é aleatória: embora a palavra aids não seja mencionada ao longo do musical, fica subentendido que a personagem Roger se contaminou com o vírus HIV por conta do uso de drogas. O número tem impacto. No fim, outro sucesso de Mercury lançado no mesmo ano de 1975, Love of my life, embala o previsível final romântico do casal protagonista com a tentativa de reproduzir, com o reforço da plateia, o coro histórico da canção na primeira edição do festival. Enfim, Rock in Rio - O musical tem seus méritos. Diretor de musicais bem-sucedidos como Vale tudo, sobre Tim Maia (1942 - 1998), João Fonseca orquestra bem a monumental produção. Délia Fischer também se sai bem na direção musical do espetáculo. O (grave) problema do espetáculo reside no tom artificial de parte do texto de Rodrigo Nogueira - titubeante na condução da história - e no próprio excesso de duração do musical. O fato de o segundo ato - situado durante a realização do fictício festival organizado por Orlando - praticamente ter outro tom e outra linha narrativa é um indício da inexperiência do autor para encarar empreitada de tal porte sem diluir a unidade do texto. Ao longo do desfile de 50 sucessos nacionais e estrangeiros, de variados gêneros e épocas, é permanente a sensação de que o poder da música às vezes sucumbe aos excessos da produção.

Rafael disse...

Musical puramente e comercialmente feito para ganhar dinheiro. nada contra os atores, mas é perda de tempo ver uma bobagem dessas. Essa família Medina já não sabe o que faz mais para ganhar dinheiro. Estranho é ver Lucinha Lins participar disso.

Luca disse...

todo musical é feito pra ganhar dinheiro, é uma indústria como qualquer outra... agora tem musical bom e temmusical ruim, parece que esse é ruim, li numa coluna da Veja que eles vão encurtar a peça quando ela vier pra São Paulo, sabe quando será Mauro?

Rafael disse...

Logicamente que um musical é feito para ganhar dinheiro, mas se viesse aliado ao bom gosto, ao bom senso e escolhas corretas, aí o papo seria outro. Esse sobre o Rock In Rio não tem significado nenhum, senão pelo motivo da família Medina querer propagar a marca deles para ganho fácil.

Larinha disse...

Ótima resenha do Mauro.
Ele valoriza todos os pontos positivos da peça, dando valor ao que foi bem pensado, à boas atuações e músicas - não uma perda de tempo e "bobagem dessas", como se referiu o comentário do Rafael M, que provavelmente nem assistiu ao musical.

Eu sim assisti ao musical e fiquei encantada, pq sempre fui uma super fã dos musicais e acompanho a maioria das produções do Rio e de São Paulo. Mesmo assim, também achei o texto um pouco cansativo e arrastado no primeiro ato. Muitas mudanças de cena e de cenários sem acrescentar muita coisa à história...ela demora para enredar e os momentos marcantes ficam mesmo para o segundo ato.

Amanda Cunha disse...

Gostei muito da crítica. Tudo faz muito sentido. Algumas cenas são muito tocantes e algumas atuações fazem o musical. Porém, o tempo de espetáculo e a superprodução realmente apagam o poder das músicas que deveriam ser, na minha opinião, o motivo de tudo. Ótimos comentários. Parabéns!

Unknown disse...

Péssima peça ! Não perca seu tempo nem dinheiro, parece mais um episodio de malhação que um musical. Quer ver um musical descente?Vá ver Familia Adans ou o incrível Tiim Maia , ai sim vocês verão o que é uma peça bem feita.

Unknown disse...

Peça que não deveria ser chamada de musical, muito ruim! Parece mais um episódio de malhação! Não perca seu dinheiro e nem o seu tempo! Estacionamento cárissimo, R$ 20,00 para colocar seu carro em um canteiro de obra. Quer ver um musical de verdade, vá ver Tim Maia ou Familia Adams.