Mauro Ferreira no G1

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domingo, 31 de julho de 2011

Reeditado, 'Alvoroço' mostra Leny moderna às voltas com outras bossas

Resenha de CD
Título: Alvoroço
Artista: Leny Andrade
Gravadora da edição original de 1973:  Odeon
Gravadora da reedição de 2011: Joia Moderna
Cotação: * * * * 1/2

Belchior e Fagner não são compositores associados ao canto de Leny Andrade. Contudo, um ano após eles terem sido lançados por Elis Regina (1945 - 1982) com a gravação de Mucuripe, Leny fez afiada gravação de Moto 1, outra seminal parceria dos artistas cearenses. O registro de Moto 1 por Leny foi lançado em 1973 no seu álbum Alvoroço, um dos títulos mais cultuados da discografia da cantora e até então um dos mais raros. De volta às lojas neste mês de julho de 2011 em oportuna reedição produzida por Thiago Marques Luiz para a gravadora Joia Moderna, Alvoroço ainda resulta moderno e atípico na obra de Leny. Alvoroço foi um disco em que Leny se permitiu sair do círculo às vezes vicioso da Bossa Nova para experimentar outras bossas, outros tons. Sem scats. Defendida pela cantora com o habitual suingue, a faixa-título - Alvoroço, samba de Ivor Lancellotti e João de Aquino - de certa forma está em sintonia com a obra de Leny, apesar de o fluente arranjo de Orlando Silveira trilhar caminhos harmônicos bem inusitados para a época. Já a apaixonada canção Visita Permanente (Dora Lopes e Jean Pierre) - emoldurada por cordas suntuosas arranjadas pelo maestro Francis Hime - fecha o disco indicando outros caminhos que, por opção ou pela visão estreita dos comandantes da indústria da música, Leny Andrade acabou não seguindo. E chega a ser sintomático que, 38 anos após a edição original de Alvoroço, seu fino repertório permaneça obscuro, até então esquecido nos porões das gravadoras. Tema romântico orquestrado por Wagner Tiso, Bolero sai do baú como uma das joias mais reluzentes de Alvoroço. O tema é assinado por ninguém menos do que Milton Nascimento, em parceria com Robertinho Silva, Tavito, Luiz Alves e o próprio Tiso. Valorizado por arranjo de Arthur Verocai, o samba Não Tem Perdão (Ivan Lins e Ronaldo Monteiro de Souza) é também belo título da fase inicial do cancioneiro de Ivan Lins. E, para quem gosta de boas melodias, há também Sou o Amor, Faço a Vida, parceria de dois compositores - Paulo Midosi e Armando Henrique - que logo sumiram na poeira da estrada (Henrique reaparece também como autor de outra faixa menos inspirada, O Lobo no Estepe). Em linha mais descontraída, Partido Rico é partido alto de João Nogueira (1941 - 2000) e Paulo César Pinheiro, cuja letra cita o empresário Sérgio Dourado, donatário do mercado imobiliário dos anos 70. Enfim, pelo vigor da cantora (a voz estava tinindo) e pelo brilho dos arranjos e da maior parte de seu repertório, Alvoroço permanece como um dos álbuns mais arejados e modernos da discografia de Leny Andrade. A bossa era outra - e também era nova.

4 comentários:

Mauro Ferreira disse...

Belchior e Fagner não são compositores associados ao canto de Leny Andrade. Contudo, um ano após eles terem sido lançados por Elis Regina (1945 - 1982) com a gravação de Mucuripe, Leny fez afiada gravação de Moto 1, outra seminal parceria dos artistas cearenses. O registro de Moto 1 por Leny foi lançado em 1973 no seu álbum Alvoroço, um dos títulos mais cultuados da discografia da cantora e até então um dos mais raros. De volta às lojas neste mês de julho de 2011 em oportuna reedição produzida por Thiago Marques Luiz para a gravadora Joia Moderna, Alvoroço ainda resulta moderno e atípico na obra de Leny. Alvoroço foi um disco em que Leny se permitiu sair do círculo às vezes vicioso da Bossa Nova para experimentar outras bossas, outros tons. Defendida pela cantora com seu habitual suingue, a faixa-título - Alvoroço, samba de Ivor Lancellotti e João de Aquino - de certa forma está em sintonia com a obra de Leny, apesar de o fluente arranjo de Orlando Silveira trilhar caminhos harmônicos bem inusitados para a época. Já a apaixonada canção Visita Permanente (Dora Lopes e Jean Pierre) - emoldurada por cordas suntuosas arranjadas pelo maestro Francis Hime - fecha o disco indicando outros caminhos que, por opção ou pela visão estreita dos diretores da indústria da música, Leny Andrade acabou não seguindo. E chega a ser sintomático que, 38 anos após a edição original de Alvoroço, seu repertório permaneça obscuro, até então esquecido nos porões das gravadoras. Tema romântico orquestrado por Wagner Tiso, Bolero sai do baú como uma das joias mais reluzentes de Alvoroço. O tema é assinado por ninguém menos do que Milton Nascimento, em parceria com Robertinho Silva, Tavito, Luiz Alves e o próprio Tiso. Valorizado por arranjo de Arthur Verocai, o samba Não Tem Perdão (Ivan Lins e Ronaldo Monteiro de Souza) é também belo título da fase inicial do cancioneiro de Ivan Lins. E, para quem gosta de boas melodias, há também Sou o Amor, Faço a Vida, parceria de dois compositores - Paulo Midosi e Armando Henrique - que logo sumiram na poeira da estrada (Henrique reaparece também como autor de outra faixa menos inspirada, O Lobo no Estepe). Em linha mais descontraída, Partido Rico é partido alto de João Nogueira (1941 - 2000) e Paulo César Pinheiro, cuja letra cita o empresário Sérgio Dourado, donatário do mercado imobiliário dos anos 70. Enfim, pelo vigor da cantora (a voz estava tinindo) e pelo brilho dos arranjos e da maior parte de seu repertório, Alvoroço permanece como um dos álbuns mais arejados e modernos da discografia de Leny Andrade. A bossa era outra - e também era nova.

Luca disse...

Mauro, certamento o disco é melhor que essa sua análise dele, que diminui a bossa nova e os trabalhos da Leny nesse ritmo para falar bem do Alvoroço.

KL disse...

mauro,
o tal "círculo vicioso da Bossa Nova" ao qual você se refere talvez seja o mesmo "cículo do bom gosto" ao qual sr. Veloso se referia ao dimnuir a BN para que o som dele(s) aparecesse. Sem BN, não haveria nada do que conhecemos hoje como boa música, e os álbuns pós-bossa nova de bossanovistas (como esse de Leny) não rompem com a estética da bn, mas, na minha opinião, procuram uma saída criativa diante da massificação da mpb, que começou a partir de 1968. Diante disso eu diria, sem exagero, de que se trata de um disco de (nova) bossa nova. O que só faz aumentar mais ainda o valor do conceito e do resultado deslumbrantes desse álbum sete estrelas.
Item obrigatório.

Eduardo Cáffaro disse...

Para mim Leny é uma cantora que deveria ser mais valorizada no Brasil. Seu canto é marcante, e nas poucas vezes que consegui assistir seus shows, ela se mostrou muito segura no palco. Uma artista que leva seu oficio a sério, com beleza e musicalidade. Que bom que aos poucos seus albuns voltam ao mercado.