Mauro Ferreira no G1

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sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Tensões com som atrapalham bela evolução de Gulin na avenida carioca

Resenha de show
Título: ôÔÔôôÔôÔ
Artista: Thaís Gulin (em foto de Rodrigo Amaral)
Local: Teatro Rival (Rio de Janeiro, RJ)
Data: 4 de agosto de 2011
Cotação: * * * 

"Putz!...", exclamou espontaneamente uma já tensa Thaís Gulin quando teve que interromper logo no início o samba-enredo que dá título ao seu segundo disco e ao show que estreou no Rio de Janeiro (RJ) em 4 de agosto de 2011, ôÔÔôôÔôÔ. Necessária para que fosse afinada a guitarra de Alexandre Prol, a breve interrupção de ôÔÔôôÔôÔ (Thaís Gulin) foi mais uma tensão administrada com garra por Gulin em estreia atribulada. A tensão chegara ao seu ponto máximo quando os então já recorrentes problemas no cabo do microfone da cantora a fizeram decidir interromper a canção Se Eu Soubesse (Chico Buarque) e sair de cena para resolver a questão técnica enquanto o trombonista Marlon Sette, com (aguçada) presença de espírito, começou a improvisar com os demais músicos um número instrumental que culminou com Cinema Americano (Rodrigo Bittencourt), música que Gulin já havia cantado e que tinha sido alvo dos primeiros aplausos realmente entusiasmados da plateia de convidados. Tantas tensões com o som acabaram atrapalhando a bela evolução da cantora na avenida carioca, mas não a ponto de tornar imperceptível o fato de que o show é muito bom - assim como o disco que o inspirou, desde já com presença garantida na lista dos melhores CDs de 2011. O diretor musical Bruno Migliari conseguiu transpor para o palco a sonoridade moderna e eventualmente quase artesanal do álbum produzido por Kassin e Alê Siqueira - êxito perceptível já no número instrumental que abre o roteiro, The Glory Hole (Kassin, Thaís Gulin e Alê Siqueira), e explicitado quando a afiadíssima banda pontua a valsa Horas Cariocas (Thaís Gulin) com barulhinhos bons. Se Revendo Amigos (Jards Macalé e Waly Salomão) tendeu mais para o rock do que para o baioque,  Ali Sim, Alice (Tom Zé) teve sua atmosfera onírica sugerida pelos acordes da guitarra de Alexandre Prol em número que terminou com Gulin solicitando a participação da plateia em clima lúdico coerente com a música inspirada em Alice no País das Maravilhas, a obra surrealista de Lewis Carroll (1832 - 1898). Se o carimbó Água (Kassin) escorreu com mais naturalidade e leveza no bis, História de Fogo (Otto e Alessandra Negrini) se sustentou com o peso kitsch de um tango estilizado e tão passional como a canção pop radiofônica Quantas Bocas, parceria de Gulin com Ana Carolina, alocada no bis. Mesmo tendo sido apresentada no pico dos problemas do som, a valsa-canção Se Eu Soubesse (Chico Buarque) já se insinua como uma das obras-primas da lavra recente de Chico. Envolto em atmosfera delicada, o tema teve sua beleza acentuada no solitário registro ao vivo de Gulin. Entre a apropriada  abordagem country de Little Boxes (Malvina Reynolds) e a (oportuna) lembrança de A Vida Es un Carnaval (Victor Daniel), sucesso da cantora cubana Célia Cruz (1925 - 2003), Gulin se jogou em Cama e Mesa (Roberto e Erasmo Carlos) - alternando pulsações neste sucesso do Rei de 1981, já revivido pela cantora no show de lançamento de seu primeiro CD, Thaís Gulin (2006) - e rebobinou seu belo registro de Garoto de Aluguel (Taxi Boy) (Zé Ramalho). A crueza da guitarra interagiu com a delicadeza sugerida pelo piano de Chiquinho Chagas, em primoroso arranjo que ilustra musicalmente o jogo armado entre o michê e seu cliente. No fim, as guitarras-foliãs de Alexandre Prol e Fernando Monteiro (Frado) foram atrás do trio elétrico e fizeram o Carnaval com Frevinho (Thaís Gulin e Moreno Veloso). Em seu primeiro desfile realmente importante na avenida carioca, Thaís Gulin evoluiu com desenvoltura e segurança vocal  nas suas interpretações, mas também com certa tensão pelos lamentáveis problemas de som e pela consciência de estar sob julgamento em estreia carioca povoada mais por convidados do que pelo público da artista. Contudo, mesmo visivelmente tensa, a cantora jamais deixou atravessar seu samba-enredo. O show ôÔÔôôÔôÔ é muito bom e vai ficar melhor quando chegar mais descontraído em outras praças - e em outros Carnavais.

4 comentários:

Mauro Ferreira disse...

"Putz!...", exclamou espontaneamente uma já tensa Thaís Gulin quando teve que interromper logo no início o samba-enredo que dá título ao seu segundo disco e ao show que estreou no Rio de Janeiro (RJ) em 4 de agosto de 2011, ôÔÔôôÔôÔ. Necessária para que fosse afinada a guitarra de Alexandre Prol, a breve interrupção de ôÔÔôôÔôÔ (Thaís Gulin) foi mais uma tensão administrada com garra por Gulin em estreia atribulada. A tensão chegara ao seu ponto máximo quando recorrentes problemas no cabo do microfone da cantora a fizeram interromper a canção Se Eu Soubesse (Chico Buarque) e sair de cena para resolver a questão técnica enquanto o trombonista Marlon Sette, com aguçada presença de espírito, começou a improvisar com os demais músicos um número instrumental que culminou com Cinema Americano (Rodrigo Bittencourt), música que Gulin já havia cantado e que tinha sido alvo dos primeiros aplausos realmente entusiasmados da plateia de convidados. Tantas tensões com o som acabaram atrapalhando a bela evolução da cantora na avenida carioca, mas não a ponto de tornar imperceptível o fato de que o show é muito bom - assim como o disco que o inspirou, desde já com presença garantida na lista dos melhores CDs de 2011. O diretor musical Bruno Migliari conseguiu transpor para o palco a sonoridade moderna e eventualmente quase artesanal do álbum produzido por Kassin e Alê Siqueira - êxito perceptível já no número instrumental que abre o roteiro, The Glory Hole (Kassin, Thaís Gulin e Alê Siqueira), e explicitado quando a afiadíssima banda pontua a valsa Horas Cariocas (Thaís Gulin) com barulhinhos bons. Se Revendo Amigos (Jards Macalé e Waly Salomão) tendeu mais para o rock do que para o baioque, Ali Sim, Alice (Tom Zé) teve sua atmosfera onírica sugerida pelos acordes da guitarra de Alexandre Prol em número que terminou com Gulin solicitando a participação da plateia em clima lúdico coerente com a música inspirada em Alice no País das Maravilhas, a obra surrealista de Lewis Carroll (1832 - 1898). Se o carimbó Água (Kassin) escorreu com mais naturalidade e leveza no bis, História de Fogo (Otto e Alessandra Negrini) se sustentou com o peso kitsch de um tango estilizado e tão passional como a canção pop radiofônica Quantas Bocas, parceria de Gulin com Ana Carolina, alocada no bis. Mesmo tendo sido apresentada no pico dos problemas do som, a valsa-canção Se Eu Soubesse (Chico Buarque) já se insinua como uma das obras-primas da lavra recente de Chico. Envolto em atmosfera delicada, o tema teve sua beleza acentuada no solitário registro ao vivo de Gulin. Entre a apropriada abordagem country de Little Boxes (Malvina Reynolds) e a (oportuna) lembrança de A Vida Es un Carnaval (Victor Daniel), sucesso da cantora cubana Célia Cruz (1925 - 2003), Gulin se jogou em Cama e Mesa (Roberto e Erasmo Carlos) - alternando pulsações neste sucesso do Rei de 1981, já revivido pela cantora no show de lançamento de seu primeiro CD, Thaís Gulin (2006) - e rebobinou seu belo registro de Garoto de Aluguel (Taxi Boy) (Zé Ramalho). A crueza da guitarra interagiu com a delicadeza sugerida pelo piano de Chiquinho Chagas, em primoroso arranjo que ilustra musicalmente o jogo armado entre o michê e seu cliente. No fim, as guitarras-foliãs de Alexandre Prol e Fernando Monteiro (Frado) foram atrás do trio elétrico e fizeram o Carnaval com Frevinho (Thaís Gulin e Moreno Veloso). Em seu primeiro desfile realmente importante na avenida carioca, Thaís Gulin evoluiu com desenvoltura e desenvoltura nas suas interpretações, mas também com certa tensão pelos lamentáveis problemas de som e pela consciência de estar sob julgamento em estreia carioca povoada mais por convidados do que pelo público da artista. Contudo, mesmo visivelmente tensa, a cantora jamais deixou atravessar seu samba-enredo. O show ôÔÔôôÔôÔ é muito bom e vai ficar melhor quando chegar mais descontraído em outras praças - e em outros Carnavais.

Marcelo disse...

Eis que surge mais uma cantora da mídia!! Se não fosse a "namorada" do Chico, passariam batido...É tanta gente meia boca surgindo que hoje você acaba não sabendo quem é quem!!!

Luca disse...

Marcelo, você tem razão, em qualquer nota que se lê sobre ela falam que é a 'namorada do Chico'. Tão armando o circo mesmo! Mas o Mauro, e isso eu tenho que dizer pra não ser injusto com ele, já ia aos shows da Gulín desdeo primeiro disco dela, antes do Chico entrar na história (se já tava ninguém sabia).

Mauro, você repete duas vezes a palavra desenvolvura no fim da crítica.

Mauro Ferreira disse...

Obrigado, Luca, por me alertar sobre a repetição de palavras (já consertei a frase). E também por lembrar que Notas Musicais acompanha a trajetória de Thaís Gulin nos palcos cariocas desde que ela começou a fazer show.

A propósito, Marcelo e Luca: Gulin não está usando o namoro com o Chico para se promover. O que acontece é que parte expressiva da mídia está voltada para essa questão e o namoro acaba sendo associado ao trabalho com Gulin - algo prejudicial para ela, na minha opinião, já que o foco recai sobre o envolvimento com Chico quando deveria estar somente no disco e no show.

Grato pela participação, MauroF