Mauro Ferreira no G1

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sexta-feira, 23 de maio de 2014

Bola rola redonda em musical sobre futebol que marca golaço na cena do Rio

Resenha de musical de teatro
Título: Samba futebol clube
Direção e roteiro: Gustavo Gasparani
Elenco:  Alan Rocha, Cristiano Gualda, Daniel Carneiro, Gabriel Manita,
              Jonas Hammar, Luiz Nicolau, Pedro Lima e Rodrigo Lima
Direção musical: Nando Duarte
Foto: Leo Aversa
Cotação: * * * * *
  Espetáculo em cartaz no Teatro II do CCBB, no Rio de Janeiro (RJ), até 14 de julho de 2014

 Musical que entrou em campo esta semana no Centro Cultural Banco do Brasil do Rio de Janeiro (RJ), Samba futebol clube marca gol de placa logo nos primeiros minutos do primeiro tempo quando os oito craques de seu elenco simulam a prosódia e os tiques dos locutores de futebol ao dizer texto didático sobre o surgimento no Brasil do esporte mais popular do país. Com esse certeiro lance inicial, o time posto em campo pelo técnico Gustavo Gasparani - Alan Rocha, Cristiano Gualda, Daniel Carneiro, Gabriel Manita, Jonas Hammar, Luiz Nicolau, Pedro Lima e Rodrigo Lima - começa a ganhar um jogo cênico que se desenvolve lúdico no primeiro tempo e que ganha densidade no segundo. Musical de linguagem brasileira que põe o nome de Gasparani na linha de frente da cena teatral carioca, Samba futebol clube joga brilhantemente com a paixão nacional despertada por dois temas - futebol e samba - capazes de mobilizar torcidas no país. Ao longo de duas horas, a bola rola redonda entre o timão de atores, hábeis na execução de roteiro que entrelaça textos sobre futebol e situações vividas pelos torcedores mais passionais - retratadas com leveza e humor espirituoso - em roteiro musical que prioriza o samba, mas que põe em campo outros ritmos. Tanto que o placar musical é aberto com o choro Um a zero (Pixinguinha e Benedito Lacerda, 1919), ouvido nas voz de Pedro Lima com a letra escrita em 1994 pelo compositor Nelson Ângelo. Os vocais vibrantes do elenco valorizam o tema. A ginga dos atores domina a cena no palco-campo. Muito da vivacidade do musical reside no jogo de corpo do elenco - um gol finalizado pelos atores, mas preparado por Renato Vieira, responsável pelas coreografias e pela direção de movimento dos craques. É com essa ginga que os oito atores se alternam na apresentação de roteiro que inclui Só se não for brasileiro nessa hora (Moraes Moreira e Luiz Galvão, 1973) - número apresentado em apropriado clima novo baiano - e Praia e sol (Maracanã futebol) (Bebeto e Adilson Silva, 1981), samba pop que amplifica o alto astral reinante no primeiro tempo do musical. Construído com base na extensa pesquisa musical de Alfredo Del-Penho, o roteiro tem lances surpreendentes como um drible do craque fluminense Mané Garrincha (1933 - 1983), casos de Futebol para principiantes (Kleber Albuquerque, 2007) - canção entoada na forma terna de um acalanto - e dos temas rurais Futebol na roça (Manezinho Araújo , 1941) e Futebol (Alvarenga, Ranchinho e Capitão Furtado, 1936), apresentados à moda das antigas duplas caipiras. Ainda dentro das linhas desse Brasil rural, Futebol cervejada e viola (Marcos, Paulo Gaúcho e Pedro Paulo, 2009) é veículo para sátira da duplas de sertanejo universitário. Entre marchas dos mais populares times de futebol do Rio de Janeiro, compostas pelo craque carioca Lamartine Babo (1904 - 1963) e habilmente usadas em cena para despertar as paixões da plateia, o musical põe em campo temas de outro craque na criação de sambas sobre futebol, o compositor fluminense Wilson Baptista (1913 - 1968), lembrado com joias como ...E o juiz apitou (Wilson Baptista, Antonio Almeida e J. Batista, 1942) e o Samba rubro negro (Wilson Baptista e Jorge de Castro, 1955), alocados lado a lado em set de vozes e violões. A direção musical de Nando Duarte acerta ao alternar climas e ritmos, impedindo o jogo de cair no marasmo. Se Cristiano Gualda interioriza a desilusão amorosa de Gol anulado (João Bosco e Aldir Blanc, 1976) em solo inspirado, o timão põe a ginga para fora para sustentar o pancadão funk de Eu quero ver gol (Marcelo Falcão, Xandão, Marcelo Lobato, Lauro Farias e Marcelo Yuka), música do grupo carioca O Rappa turbinada com dança de capoeira. Na sequência, Fio Maravilha (Jorge Ben Jor, 1972) entra em campo de forma esfuziante, encerrando primeiro tempo focado nos torcedores, assunto de textos escritos por cronistas craques como o escritor pernambucano Nelson Rodrigues (1912 - 1980), autor de Sofrer pelo Botafogo, um dos textos selecionados por João Pimentel (jornalista carioca que deu a ideia a Gasparani de criar musical que entrelaçasse futebol e samba). No segundo tempo, mais dramático e crítico, Samba futebol clube expõe jogadores que marcaram época. A abertura deste segundo tempo - com vídeo em que os atores parodiam locutores e comentaristas esportivos da TV Globo - exemplifica a habilidade de Gasparani de jogar com as projeções sem perda da teatralidade. Na sequência, hilária execução do Hino Nacional Brasileiro (Francisco Manoel da Silva e Joaquim Osório Duque Estrada, 1822 - com letra de 1909), tal como ele é cantado na abertura de jogos importantes, reitera o tom geralmente lúdico do musical, precedendo ode romantizada a Edson Arantes do Nascimento, o Pelé, eternizado em temas como Pelé (Luiz Tatit e Zé Tatit, 1998) e o engajado samba E por falar no rei Pelé (1975), no qual o compositor carioca Luiz Gonzaga do Nascimento Jr. (1945 - 1991), o Gonzaguinha, conclui que craque mesmo é o povo brasileiro, que joga nas onze para driblar as injustiças sociais cotidianas. Esse viés social que encorpa o segundo tempo é sublinhado por Aqui é o país do futebol (Milton Nascimento e Fernando Brant, 1970) e por outro (grande) samba de Gonzaguinha, Geraldinos e Arquibaldos (1975), posto em campo para lembrar que a guerra insana de torcidas por vezes passa dos limites e vira caso de polícia. Antes, número em que o ator Cristiano Gualda encarna cantor kitsch ao entoar a Balada nº 7 (Mané Garrincha) (Alberto Luís, 1970), em tons exaltados, mostra que as glórias do campo são efêmeras. Nesse número de emoção mais compacta, imagens de craques do passado são projetadas em cena. Mas como diz título de um samba do rapper paulista Rappin' Hood, Futebol alegria da cidade (2010), o esporte mais popular do Brasil traz sobretudo felicidade. E é no clima vibrante de É uma partida de futebol (Samuel Rosa e Nando Reis, 1996) - com arranjo similar ao da gravação original do grupo mineiro Skank - que Samba futebol clube sai de campo após ter ganhado o público de goleada desde os primeiros lances. Com criativa teatralidade, o musical marca um golaço na cena do Rio de Janeiro.

9 comentários:

Mauro Ferreira disse...

Musical que entrou em campo esta semana no Centro Cultural Banco do Brasil do Rio de Janeiro (RJ), Samba futebol clube marca gol de placa logo nos primeiros minutos do primeiro tempo quando os oito craques de seu elenco simulam a prosódia e os tiques dos locutores de futebol ao dizer texto didático sobre o surgimento no Brasil do esporte mais popular do país. Com esse certeiro lance inicial, o time posto em campo pelo técnico Gustavo Gasparani - Alan Rocha, Cristiano Gualda, Daniel Carneiro, Gabriel Manita, Jonas Hammar, Luiz Nicolau, Pedro Lima e Rodrigo Lima - começa a ganhar um jogo cênico que se desenvolve lúdico no primeiro tempo e que ganha densidade no segundo. Musical de linguagem brasileira que põe o nome de Gasparani na linha de frente da cena teatral carioca, Samba futebol clube joga brilhantemente com a paixão nacional despertada por dois temas - futebol e samba - capazes de mobilizar torcidas no país. Ao longo de duas horas, a bola rola redonda entre o timão de atores, hábeis na execução de roteiro que entrelaça textos sobre futebol e situações vividas pelos torcedores mais passionais - retratadas com leveza e humor espirituoso - em roteiro musical que prioriza o samba, mas que põe em campo outros ritmos. Tanto que o placar musical é aberto com o choro Um a zero (Pixinguinha e Benedito Lacerda, 1919), ouvido nas voz de Pedro Lima com a letra escrita em 1994 pelo compositor Nelson Ângelo. Os vocais vibrantes do elenco valorizam o tema. A ginga dos atores domina a cena no palco-campo. Muito da vivacidade do musical reside no jogo de corpo do elenco - um gol finalizado pelos atores, mas preparado por Renato Vieira, responsável pelas coreografias e pela direção de movimento dos craques. É com essa ginga que os oito atores se alternam na apresentação de roteiro que inclui Só se não for brasileiro nessa hora (Moraes Moreira e Luiz Galvão, 1973) - número apresentado em apropriado clima novo baiano - e Praia e sol (Maracanã futebol) (Bebeto e Adilson Silva, 1981), samba pop que amplifica o alto astral reinante no primeiro tempo do musical. Construído com base na extensa pesquisa musical de Alfredo Del-Penho, o roteiro tem lances surpreendentes como um drible do craque fluminense Mané Garrincha (1933 - 1983), casos de Futebol para principiantes (Kleber Albuquerque, 2007) - canção entoada na forma terna de um acalanto - e dos temas rurais Futebol na roça (Manezinho Araújo , 1941) e Futebol (Alvarenga, Ranchinho e Capitão Furtado, 1936), apresentados à moda das antigas duplas caipiras. Ainda dentro das linhas desse Brasil rural, Futebol cervejada e viola (Marcos, Paulo Gaúcho e Pedro Paulo, 2009) é veículo para sátira da duplas de sertanejo universitário. Entre marchas dos mais populares times de futebol do Rio de Janeiro, compostas pelo craque carioca Lamartine Babo (1904 - 1963) e habilmente usadas em cena para despertar as paixões da plateia, o musical põe em campo temas de outro craque na criação de sambas sobre futebol, o compositor fluminense Wilson Baptista (1913 - 1968), lembrado com joias como ...E o juiz apitou (Wilson Baptista, Antonio Almeida e J. Batista, 1942) e o Samba rubro negro (Wilson Baptista e Jorge de Castro, 1955), alocados lado a lado em set de vozes e violões. A direção musical de Nando Duarte acerta ao alternar climas e ritmos, impedindo o jogo de cair no marasmo. Se Cristiano Gualda interioriza a desilusão amorosa de Gol anulado (João Bosco e Aldir Blanc, 1976) em solo inspirado, o timão põe a ginga para fora para sustentar o pancadão funk de Eu quero ver gol (Marcelo Falcão, Xandão, Marcelo Lobato, Lauro Farias e Marcelo Yuka), música do grupo carioca O Rappa turbinada com dança de capoeira.

Mauro Ferreira disse...

Na sequência, Fio Maravilha (Jorge Ben Jor, 1972) entra em campo de forma esfuziante, encerrando primeiro tempo focado nos torcedores, assunto de textos escritos por cronistas craques como o escritor pernambucano Nelson Rodrigues (1912 - 1980), autor de Sofrer pelo Botafogo, um dos textos selecionados por João Pimentel (jornalista carioca que deu a ideia a Gasparani de criar musical que entrelaçasse futebol e samba). No segundo tempo, mais dramático e crítico, Samba futebol clube expõe jogadores que marcaram época. A abertura deste segundo tempo - com vídeo em que os atores parodiam locutores e comentaristas esportivos da TV Globo - exemplifica a habilidade de Gasparani de jogar com as projeções sem perda da teatralidade. Na sequência, hilária execução do Hino Nacional Brasileiro (Francisco Manoel da Silva e Joaquim Osório Duque Estrada, 1822 - com letra de 1909), tal como ele é cantado na abertura de jogos importantes, reitera o tom geralmente lúdico do musical, precedendo ode romantizada a Edson Arantes do Nascimento, o Pelé, eternizado em temas como Pelé (Luiz Tatit e Zé Tatit, 1998) e o engajado samba E por falar no rei Pelé (1975), no qual o compositor carioca Luiz Gonzaga do Nascimento Jr. (1945 - 1991), o Gonzaguinha, conclui que craque mesmo é o povo brasileiro, que joga nas onze para driblar as injustiças sociais cotidianas. Esse viés social que encorpa o segundo tempo é sublinhado por Aqui é o país do futebol (Milton Nascimento e Fernando Brant, 1970) e por outro (grande) samba de Gonzaguinha, Geraldinos e Arquibaldos (1975), posto em campo para lembrar que a guerra insana de torcidas por vezes passa dos limites e vira caso de polícia. Antes, número em que o ator Cristiano Gualda encarna cantor kitsch ao entoar a Balada nº 7 (Mané Garrincha) (Alberto Luís, 1970), em tons exaltados, mostra que as glórias do campo são efêmeras. Nesse número de emoção mais compacta, imagens de craques do passado são projetadas em cena. Mas como diz título de um samba do rapper paulista Rappin' Hood, Futebol alegria da cidade (2010), o esporte mais popular do Brasil traz sobretudo felicidade. E é no clima vibrante de É uma partida de futebol (Samuel Rosa e Nando Reis, 1966) - com arranjo similar ao da gravação original do grupo mineiro Skank - que Samba futebol clube sai de campo após ter ganhado o público de goleada. Com criativa teatralidade, o musical marca um golaço em cena.

Fabio Gomes disse...

Mauro, o ano de "É uma Partida de Futebol" foi grafado como sendo 1966, e não 1996.

Mauro Ferreira disse...

Grato pelo toque, Fábio. Abs, MauroF

Blog do Luiz Nicolau disse...

Super obrigado pelas palavras Mauro!
Encheu-nos de alegria!
Volte sempre!
abraços
Nicolau (Nico Madruga, o jogador do Segundo Tempo de #sambafutebolclube)

Maria disse...

Mauro, esse musical vai percorrer o restante do Brasil?
Além de gostar de futebol e samba, pelo seu texto fiquei curiosa em assistir.

Mauro Ferreira disse...

Não tem do que agradecer, Nicolau. O musical é primoroso. Maria, acredito que o espetáculo não vai percorrer o Brasil. No máximo, fará uma temporada em São Paulo. Abs, MauroF

Maria disse...

Que pena! Valeu.

EDGAR CAMPOS disse...

Espetacular...Um verdadeiro Show de Bola mesmooooo!