Mauro Ferreira no G1

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quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Fina sintonia entre Leila e Faria engrandece 'tamaninho' do show 'Céu e mar'

Resenha de show
Título: Céu e mar
Artista: Leila Pinheiro e Nelson Faria (em foto de Rodrigo Amaral)
Local: Theatro Net Rio (Rio de Janeiro, RJ)
Data: 19 de agosto de 2013
Cotação: * * * *

Logo após cantar o samba-canção Sucedeu assim (1957), parceria bissexta de Antonio Carlos Jobim (1927 - 1994) com Marino Pinto (1916 - 1965), Leila Pinheiro se dirigiu ao público que foi ao Theatro Net Rio ver a estreia nacional de Céu e mar, na noite de 19 de agosto, e disse que daria com o guitarrista Nelson Faria um "mergulho profundo" na música em show "deste tamaninho". A referência à dimensão reduzida da apresentação aludia ao fato de Céu e mar ser um show mais introspectivo, eletroacústico, sem o clima expansivo de outros shows da cantora. Contudo, como o próprio Faria saudou no momento em que se dirigiu a plateia quando Leila assumiu o piano, o músico estava diante de uma cantora que se porta como um músico em cena. E foi essa total sintonia entre cantora e músico que engrandeceu Céu e mar, show baseado no disco gravado por Leila com Faria em 2010 para o mercado externo, lançado na Europa em 2012 pelo selo inglês Far Out Recordings e editado no Brasil pela gravadora Biscoito Fino em maio deste ano de 2013. Com seu domínio técnico, Leila Pinheiro é cantora especialmente vocacionada para interpretar canções do universo da MPB - como, por exemplo, Doce presença (1983), balada de Ivan Lins e Vitor Martins que marcou sua entrada em cena em registro aveludado, após dois solos de Faria em Manhã de Carnaval (Luiz Bonfá e Antônio Maria, 1959) e em All the things you are (Jerome Kern e Oscar Hammerstein II, 1939), números em que o violonista / guitarrista já mostrou sua habilidade de tocar temas alheios num misto de reverência às músicas e exploração dos caminhos harmônicos apontados por seus compositores. E é nesse mergulho pelas harmonias requintadas de uma MPB já posta à margem do mercado fonográfico que Leila e Faria conduzem Céu e mar, ora revolvendo temas antigos como a música de 1953 do antenado Johnny Alf (1929 - 2010) que desaguou na Bossa Nova e que dá título ao show, ora lustrando pérola recente que já nasceu submersa, caso de Armadilhas de um romance (2009), exemplo da sintonia entre os parceiros Dori Caymmi e Paulo César Pinheiro. Como no disco, o show revolve memórias das águas que - no caso das músicas Dos Navegantes (Edu Lobo e Paulo César Pinheiro, 1993) e Embarcação (Chico Buarque e Francis Hime, 1972) - funcionam como metáforas para reminiscências de tempestades sentimentais que turbam o mar das paixões. Aliás, toda a cumplicidade entre cantora e guitarrista salta aos ouvidos e aos olhos no fim do samba Embarcação, destaque do roteiro. Que extrapola o repertório do disco quando Leila vai para o piano cantar Brisa do mar (João Donato e Abel Silva, 1981), Acaso (Ivan Lins e Abel Silva, 2000), Clube da esquina nº 2 (Milton Nascimento, Márcio Borges e Lô Borges, 1978) e o medley que une Domingo azul do mar (Antonio Carlos Jobim e Newton Mendonça, 1961) e Fotografia (Antonio Carlos Jobim, 1959), sendo que este último número de tonalidade jazzística é reminiscência de show feito pela cantora com o violonista Oscar Castro Neves na casa Blue Note, em Tóquio, no Japão. Já fora do piano, Leila exercita seu inglês eficaz ao cantar música do repertório da cantora norte-americana Billie Holiday (1915 - 1959), That old devil called love (Doris Fisher e Alan Roberts, 1944), tema sagazmente alocado no roteiro ao lado do Bolero de satã (Guinga e Paulo César Pinheiro, 1976), propagado por Elis Regina (1945-1982) em 1979 em duo com Cauby Peixoto. Por fim, cantora e guitarrista disparam a artilharia de Bala com bala (João Bosco e Aldir Blanc, 1972) sem se ferir no tiroteio rítmico do tema. Enfim, Céu e mar é grande show, de tamaninho ideal para expor a força perene da MPB de Leila e Faria.

2 comentários:

Mauro Ferreira disse...

Logo após cantar o samba-canção Sucedeu assim (1957), parceria bissexta de Antonio Carlos Jobim (1927 - 1994) com Marino Pinto (1916 - 1965), Leila Pinheiro se dirigiu ao público que foi ao Theatro Net Rio ver a estreia nacional de Céu e mar, na noite de 19 de agosto, e disse que daria com o guitarrista Nelson Faria um "mergulho profundo" na música em show "deste tamaninho". A referência à dimensão reduzida da apresentação aludia ao fato de Céu e mar ser um show mais introspectivo, eletroacústico, sem o clima expansivo de outros shows da cantora. Contudo, como o próprio Faria saudou no momento em que se dirigiu a plateia quando Leila assumiu o piano, o músico estava diante de uma cantora que se porta como um músico em cena. E foi essa total sintonia entre cantora e músico que engrandeceu Céu e mar, show baseado no disco gravado por Leila com Faria em 2010 para o mercado externo, lançado na Europa em 2012 pelo selo inglês Far Out Recordings e editado no Brasil pela gravadora Biscoito Fino em maio deste ano de 2013. Com seu domínio técnico, Leila Pinheiro é cantora especialmente vocacionada para interpretar canções do universo da MPB - como, por exemplo, Doce presença (1983), balada de Ivan Lins e Vitor Martins que marcou sua entrada em cena em registro aveludado, após dois solos de Faria em Manhã de Carnaval (Luiz Bonfá e Antônio Maria, 1959) e em All the things you are (Jerome Kern e Oscar Hammerstein II, 1939), números em que o violonista / guitarrista já mostrou sua habilidade de tocar temas alheios num misto de reverência às músicas e exploração dos caminhos harmônicos apontados por seus compositores. E é nesse mergulho pelas harmonias requintadas de uma MPB já posta à margem do mercado fonográfico que Leila e Faria conduzem Céu e mar, ora revolvendo temas antigos como a música de 1953 do antenado Johnny Alf (1929 - 2010) que desaguou na Bossa Nova e que dá título ao show, ora lustrando pérola recente que já nasceu submersa, caso de Armadilhas de um romance (2009), exemplo da sintonia entre os parceiros Dori Caymmi e Paulo César Pinheiro. Como no disco, o show revolve memórias das águas que - no caso das músicas Dos Navegantes (Edu Lobo e Paulo César Pinheiro, 1993) e Embarcação (Chico Buarque e Francis Hime, 1972) - funcionam como metáforas para reminiscências de tempestades sentimentais que turbam o mar das paixões. Aliás, toda a cumplicidade entre cantora e guitarrista salta aos ouvidos e aos olhos no fim do samba Embarcação, destaque do roteiro. Que extrapola o repertório do disco quando Leila vai para o piano cantar Brisa do mar (João Donato e Abel Silva, 1981), Acaso (Ivan Lins e Abel Silva, 2000), Clube da esquina nº 2 (Milton Nascimento, Márcio Borges e Lô Borges, 1978) e o medley que une Domingo azul do mar (Antonio Carlos Jobim e Newton Mendonça, 1961) e Fotografia (Antonio Carlos Jobim, 1959), sendo que este último número de tonalidade jazzística é reminiscência de show feito pela cantora com o violonista Oscar Castro Neves na casa Blue Note, em Tóquio, no Japão. Por fim, já fora do piano, Leila exercita seu inglês eficaz ao cantar música do repertório da cantora norte-americana Billie Holiday (1915 - 1959), That old devil called love (Doris Fisher e Alan Roberts, 1944), tema sagazmente alocado no roteiro ao lado do Bolero de satã (Guinga e Paulo César Pinheiro). Por fim, cantora e guitarrista disparam a artilharia de Bala com bala (João Bosco e Aldir Blanc, 1972) sem se ferir no tiroteio rítmico do tema. Enfim, Céu e mar é grande show, de tamaninho ideal para expor a força perene da MPB de Leila e Faria. Mergulhe!

Roberto de Brito disse...

Leila é sinônimo de bom gosto musical! "Doce presença" é uma obra prima! "Sucedeu assim" é muito bonita. Foi gravada por Clara Nunes em 1968 no Lp "Você passa e eu acho graça"