Mauro Ferreira no G1

Aviso aos navegantes: desde 6 de julho de 2016, o jornalista Mauro Ferreira atualiza diariamente uma coluna sobre o mercado fonográfico brasileiro no portal G1. Clique aqui para acessar a coluna. O endereço é http://g1.globo.com/musica/blog/mauro-ferreira/


terça-feira, 28 de julho de 2015

Álbum de Ná Ozzetti e Passo Torto equilibra mal letras, melodias, voz e sons

Resenha de CD
Título: Thiago França
Artista: Passo Torto & Ná Ozzetti
Gravadora: YB Music
Cotação: * * 1/2

"Passo Torto e Ná Ozzetti é canção. Mas não exatamente a canção do samba-canção, a canção com refrão, a canção de amor e dor-de-cotovelo... Canções que contam pequenas estórias, mas estórias sem grandes heróis nem moral da estória... Estórias nem sempre lineares, estórias tortas cantadas em poesia, mas conduzidas também pela montagem inusitada dos arranjos, pelos cortes bruscos e secos, pelo contraste entre timbres saturados e cristalinos, pela alternância entre a estática do ruído e do quase-silêncio e a vertigem das intricadas texturas polifônicas... Tudo isto pode ser canção." Caçapa

O trecho do texto escrito por Caçapa para apresentar Thiago França - o recém-lançado álbum que junta a cantora paulistana Ná Ozzetti com o grupo também paulistano Passo Torto - dá a senha para um possível (não) entendimento do disco. Com repertório autoral e inédito que se distancia do formato convencional da canção, o álbum não justifica a grande expectativa gerada desde seu anúncio justamente pela qualidade melódica do repertório, inferior à produção autoral apresentada pelo Passo Torto em seus dois álbuns anteriores. O título Thiago França soa como uma piada interna que vai ser entendida somente por quem sabe que França é um músico paulistano que muitos pensam pertencer ao Passo Torto, o quarteto formado Kiko Dinucci, Marcelo Cabral, Rodrigo Campos e Romulo Fróes. A música em si também vai ser deglutida por poucos - e aí cabe ressaltar que a culpa não reside na imensa maioria que vai ter dificuldade para acompanhar os (com)passos inusitados de composições como Este homem (música de Ná Ozzetti com letra de Romulo Fróes) e Homem comum (música de Romulo Fróes com letra de Rodrigo Campos). A voz límpida de Ná Ozzetti está lá, mas por vezes abafada pelos ruídos do som noise do Passo Torto, como já sinalizara o brochante single Perder essa mulher (música de Marcelo Cabral e Kiko Dinucci com letra de Rodrigo Campos, Romulo Fróes e Kiko Dinucci). Talvez tenha faltado tempo para burilar esse cancioneiro composto em razão do projeto do disco. Das 10 músicas, Cipó (música de Romulo Fróes com letra de Rodrigo Campos) sobressai no repertório com sua evocação do cancioneiro do Rumo, o grupo que projetou Ná na primeira metade dos anos 1980 e que apontou caminhos inusitados para a canção brasileira dentro do movimento rotulado com Vanguarda paulista. Retrato nu e cru da personagem-título, Beth (música de Marcelo Cabral com letra de Rodrigo Campos) também transita com brilho por esses caminhos difíceis de serem acompanhados por ouvintes habituados ao tom palatável do pop radiofônico. Em contrapartida, Onde é que tem? (música de Ná Ozzetti com letra de Romulo Fróes) reitera que música difícil nem sempre soa mais interessante (ou melhor) do que a canção fácil, de refrão e de amor. Situada no disco após os versos concretistas de Palavra perdida (música de Marcelo Cabral com letra de Romulo Fróes), O cinema é melhor (música de Kiko Dinucci com letra de Rodrigo Campos) - grande destaque do cancioneiro ao lado da já mencionada música Cipó - aponta a grande superioridade das letras sobre as melodias de Thiago França com seus versos que confrontam o roteiro banal da vida real com a felicidade fantasiosa vivida na tela de cinema. Na sequência, Bloco torto (música de Ná Ozzetti com letra de Kiko Dinucci, Rodrigo Campos e Romulo Fróes) segue o passo anti-folião do grupo, fazendo outros Carnavais. No fim, O cadáver (música de Romulo Fróes com letra de Kiko Dinucci e Romulo Fróes) remete ao mote mortal de Encarnado (Independente, 2014), o estupendo álbum solo da cantora Juçara Marçal, gravado com Dinucci e Campos. Só que, se em Encarnado a liga resultou perfeita, em Thiago França algo parece fora de equilíbrio. Talvez os passos tortuosos das melodias dificultem a fruição do encontro histórico de uma cantora de geração fundamental na pavimentação de caminhos seguidos pela geração do grupo que ora a acolhe em disco em que a voz referencial dessa cantora soa como (mais) um elemento entre os timbres secos e crus desse grupo.

10 comentários:

Mauro Ferreira disse...

♪ O trecho do texto escrito por Caçapa para apresentar Thiago França - o recém-lançado álbum que junta a cantora paulistana Ná Ozzetti com o grupo também paulistano Passo Torto - dá a senha para um possível (não) entendimento do disco. Com repertório autoral e inédito que se distancia do formato convencional da canção, o álbum não justifica a grande expectativa gerada desde seu anúncio justamente pela qualidade melódica do repertório, inferior à produção autoral apresentada pelo Passo Torto em seus dois álbuns anteriores. O título Thiago França soa como uma piada interna que vai ser entendida somente por quem sabe que França é um músico paulistano que muitos pensam pertencer ao Passo Torto, o quarteto formado Kiko Dinucci, Marcelo Cabral, Rodrigo Campos e Romulo Fróes. A música em si também vai ser deglutida por poucos - e aí cabe ressaltar que a culpa não reside na imensa maioria que vai ter dificuldade para acompanhar os (com)passos inusitados de composições como Este homem (música de Ná Ozzetti com letra de Romulo Fróes) e Homem comum (música de Romulo Fróes com letra de Rodrigo Campos). A voz límpida de Ná Ozzetti está lá, mas por vezes abafada pelos ruídos do som noise do Passo Torto, como já sinalizara o brochante single Perder essa mulher (música de Marcelo Cabral e Kiko Dinucci com letra de Rodrigo Campos, Romulo Fróes e Kiko Dinucci). Talvez tenha faltado tempo para burilar esse cancioneiro composto em razão do projeto do disco. Das 10 músicas, Cipó (música de Romulo Fróes com letra de Rodrigo Campos) sobressai no repertório com sua evocação do cancioneiro do Rumo, o grupo que projetou Ná na primeira metade dos anos 1980 e que apontou caminhos inusitados para a canção brasileira dentro do movimento rotulado com Vanguarda paulista. Retrato nu e cru da personagem-título, Beth (música de Marcelo Cabral com letra de Rodrigo Campos) também transita com brilho por esses caminhos difíceis de serem acompanhados por ouvintes habituados ao tom palatável do pop radiofônico. Em contrapartida, Onde é que tem? (música de Ná Ozzetti com letra de Romulo Fróes) reitera que música difícil nem sempre soa mais interessante (ou melhor) do que a canção fácil, de refrão e de amor. Situada no disco após os versos concretistas de Palavra perdida (música de Marcelo Cabral com letra de Romulo Fróes), O cinema é melhor (música de Kiko Dinucci com letra de Rodrigo Campos) - grande destaque do cancioneiro ao lado da já mencionada música Cipó - aponta a grande superioridade das letras sobre as melodias de Thiago França com seus versos que confrontam o roteiro banal da vida real com a felicidade fantasiosa vivida na tela de cinema. Na sequência, Bloco torto (música de Ná Ozzetti com letra de Kiko Dinucci, Rodrigo Campos e Romulo Fróes) segue o passo anti-folião do grupo, fazendo outros Carnavais. No fim, O cadáver (música de Romulo Fróes com letra de Kiko Dinucci e Romulo Fróes) remete ao mote mortal de Encarnado (Independente, 2014), o estupendo álbum solo da cantora Juçara Marçal, gravado com Dinucci e Campos. Só que, se em Encarnado a liga resultou perfeita, em Thiago França algo parece fora de equilíbrio. Talvez os passos tortuosos das melodias dificultem a fruição do encontro histórico de uma cantora de geração fundamental na pavimentação de caminhos seguidos pela geração do grupo que ora a acolhe em disco em que a voz referencial dessa cantora soa como (mais) um elemento entre os timbres secos e crus desse grupo.

Mauro Ferreira disse...

Aviso aos navegantes: a capa oficial do disco é a preta. A outra é a capa interna do encarte do álbum. Abs, MauroF

Rafael disse...

Eu gostei do disco... Não é daqueles em que você morre de amor por ele, mas é bom... Adorei "Perder Essa Mulher", é muito boa...

Douglas Carvalho disse...

Exatamente o que achei ao ouvir o disco. Sou fã incondicional de Ná Ozzetti, para mim uma das 5 ou 6 melhores cantoras do Brasil. Mas esse disco é duro de escutar até para quem está habituado ao repertório pouco convencional de Ná. As melodias não são bonitas, não envolvem. Parece que a voz perfeita de Ná está vagando num deserto melódico. E as guitarras são barulhentas demais. Deu saudade de coisas deliciosas como Sutil, A Olhos Nus, Show, Canto Em Qualquer Canto e Capitu.

Unknown disse...

A Ná Ozzetti salvou o Passo Torto de dar (mais) um passo em falso. Achei as músicas bem interessantes, melhor que tudo que o grupo já fez até hoje. Acho que fui seduzido pela voz da Ná...

lurian disse...

Perdão Ná Ozzetti, mas disco de estética noise eu não consigo passar da 3a faixa ainda que possam haver sons/letras interessantes, me cansa...

Douglas Carvalho disse...

Nem sabia o significado de "noise". Fui ler a respeito. É exatamente o que é a guitarrinha barulhenta do Passo Torto: desconfortável e irritante.

ADEMAR AMANCIO disse...

Música é a combinação de sons e silêncios de uma maneira organizda,portanto,não é literatura.Se não tiver uma linha melódica agradável,mesmo que tenha a melhor letra de todos os tempos,a mim não interessa.Tem gente que pensa o contrário,que bom.

Unknown disse...

Mauro, e ao vivo ficou bom?

Confesso que gostei desse CD -embora eu pule uma faixa ou outra-.

Haverá uma apresentação aqui em Fortaleza e estou muito curioso pra conhecer a banda ao vivo (principalmente a performance do Passo Torto, que adoro).

abs

Unknown disse...

Povo reclamando que noise é noise. Vai entender...