Mauro Ferreira no G1

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sexta-feira, 18 de outubro de 2013

De 'biquíni', Tulipa (re)veste desnudadas canções com voz, corpo e alma

Resenha de show
Título: Tulipa Ruiz Acústico 
Artista: Tulipa Ruiz (em foto de Rodrigo Amaral)
Local: Miranda (Rio de Janeiro, RJ)
Data: 17 de outubro de 2013
Cotação: * * * * 

Após cantar Ok (Tulipa Ruiz e Gustavo Ruiz, 2012) no palco da casa carioca Miranda, em interpretação que alinhou canto e movimentos corporais, Tulipa Ruiz se dirigiu ao público para explicar o conceito de seu show acústico, que estreou no início do mês em São Paulo (SP) e chegou ao Rio de Janeiro (RJ) na noite de ontem, 15 de outubro de 2013. À plateia, a cantora paulista contou que sua sensação era a de estar se apresentando de biquíni ao mostrar as canções peladas, tal como elas vieram ao mundo. A explicação fez sentido. Contudo, para o público, a sensação foi a de que estas desnudadas canções estavam plenamente (re)vestidas com a voz, o corpo e a alma de Tulipa Ruiz - cantora já apta a ser incluída entre as grandes do Brasil. Feito no formato voz, violão (o do mano Gustavo Ruiz, produtor e parceiro de Tulipa em boa parte das composições autorais do roteiro) e clarinete (o de Alexandre Ribeiro, que também sopra eventualmente um clarone), o show é gracioso e extrovertido. Tulipa - que já desabrochara como intérprete no perfeito show Tudo tanto (2012) - está cantando como nunca, brincando com a voz aguda e extensa. Já no primeiro número, Pedrinho (Tulipa Ruiz, 2010), ficou claro o tom lúdico da apresentação, ressaltado pelo sopro espirituoso do clarinete de Alexandre Ribeiro. O reduzido formato acústico - a rigor, já experimentado pela cantora em shows mais econômicos feitos no exterior - alterou dinâmica dos arranjos, evidenciando a essência pop de músicas como É (Tulipa Ruiz, 2012). Essa essência pop saltou aos ouvidos sobretudo em Like this (2012), primeira parceria de Tulipa com Ilhan Ersahin, integrante da banda norte-americana de trip-hop Wax Poetic. Na gravação do disco Tudo tanto (2012), a música ganhou rebuscado arranjo de atmosfera indie. Já neste show acústico, Like this (rea)parece leve, linda e solta. Uma pérola pop! Da mesma forma, Desinibida (2012) - primeira parceria de Tulipa com Tomás Cunha Ferreira, músico do grupo português Os Quais - tem sua clara aura bossa-novista alimentada pelo toque do violão de Gustavo Ruiz em interpretação turbinada com as bossas da própria Tulipa, que transformou o fio do microfone no laço de um caçador no verso "E domestica animais". Na mesma sintonia, Da maior importância (Caetano Veloso, 1973) ganhou abordagem teatralizada no limite do excesso. Tulipa, aliás, está bastante teatral e falante no show acústico. Essa teatralidade cai bem em músicas como Da menina (Tulipa Ruiz, 2010). Contudo, um leve polimento nos gestos e nos comentários - espirituosos, quase sempre engraçados, mas às vezes desnecessários, como a explicação para o título de Brocal dourado (Tulipa Ruiz e Gustavo Ruiz, 2010) - deixaria o show mais ajustado, à beira da perfeição. O improviso do verso "Black bloc so peaceful" em Black is beatiful (Marcos Valle e Paulo César Valle, 1971) destoou do espírito da canção soul dos irmãos Valle, além de ser questionável do ponto de vista político. É que nem sempre cabe uma graça. E ainda bem que Tulipa percebeu isso ao cantar o folk People's parties (Joni Mitchell, 1974), que aborda desajuste emocional incondizente com a atmosfera descontraída do show. Feitas as ressalvas, cabe ressaltar que Tulipa está cada vez mais segura e luminosa como intérprete. Totalmente à vontade em seu universo autoral, a cantora realçou a ternura da canção Do amor (Tulipa Ruiz e Gustavo Ruiz, 2010) e fez Sushi (Tulipa Ruiz e Luiz Chagas, 2010) ficar saboroso como nunca. No bis, atendendo aos insistentes pedidos da plateia, a artista ainda improvisou Víbora (Tulipa Ruiz, Criolo, Caio Lopes, Gustavo Ruiz e Luiz Chagas, 2012) sem diluir o veneno dessa climática composição de seu segundo álbum. Enfim, com seu imaginário biquíni, Tulipa Ruiz mostra neste (ótimo) show acústico que tem voz o suficiente para se cobrir da cabeça aos pés.

4 comentários:

Mauro Ferreira disse...

Após cantar Ok (Tulipa Ruiz e Gustavo Ruiz, 2012) no palco da casa carioca Miranda, em interpretação que alinhou canto e movimentos corporais, Tulipa Ruiz se dirigiu ao público para explicar o conceito de seu show acústico, que estreou no início do mês em São Paulo (SP) e chegou ao Rio de Janeiro (RJ) na noite de ontem, 15 de outubro de 2013. À plateia, a cantora paulista contou que sua sensação era a de estar se apresentando de biquíni ao mostrar as canções peladas, tal como elas vieram ao mundo. A explicação fez sentido. Contudo, para o público, a sensação foi a de que estas desnudadas canções estavam plenamente (re)vestidas com a voz, o corpo e a alma de Tulipa Ruiz - cantora já apta a ser incluída entre as grandes do Brasil. Feito no formato voz, violão (o do mano Gustavo Ruiz, produtor e parceiro de Tulipa em boa parte das composições autorais do roteiro) e clarinete (o de Alexandre Ribeiro, que também sopra eventualmente um clarone), o show é gracioso e extrovertido. Tulipa - que já desabrochara como intérprete no show Tudo tanto (2012) - está cantando como nunca, brincando com a voz aguda e extensa. Já no primeiro número, Pedrinho (Tulipa Ruiz, 2010), ficou claro o tom lúdico da apresentação, ressaltado pelo sopro espirituoso do clarinete de Alexandre Ribeiro. O reduzido formato acústico - a rigor, já experimentado pela cantora em shows mais econômicos feitos no exterior - alterou dinâmica dos arranjos, evidenciando a essência pop de músicas como É (Tulipa Ruiz, 2012). Essa essência pop saltou aos ouvidos sobretudo em Like this (2012), primeira parceria de Tulipa com Ilhan Ersahin, integrante da banda norte-americana de trip-hop Wax Poetic. Na gravação do disco Tudo tanto (2012), a música ganhou rebuscado arranjo de atmosfera indie. Neste show acústico, Like this (rea)parece leve, linda e solta. Uma pérola pop! Da mesma forma, Desinibida (2012) - primeira parceria de Tulipa com Tomás Cunha Ferreira, músico do grupo português Os Quais - tem sua aura bossa-novista alimentada pelo toque do violão de Gustavo Ruiz em interpretação turbinada com as bossas da própria Tulipa, que transformou o fio do microfone no laço de um caçador no verso "E domestica animais". Na mesma sintonia, Da maior importância (Caetano Veloso, 1973) ganhou abordagem teatralizada no limite do excesso. Tulipa, aliás, está bastante teatral e falante no show acústico. Essa teatralidade cai bem em músicas como Da menina (Tulipa Ruiz, 2010). Contudo, um leve polimento nos gestos e nos comentários - espirituosos, quase sempre engraçados, mas às vezes desnecessários, como a explicação para o título de Brocal dourado (Tulipa Ruiz e Gustavo Ruiz, 2010) - deixaria o show mais ajustado, à beira da perfeição. O improviso do verso "Black bloc so peaceful" em Black is beatiful (Marcos Valle e Paulo César Valle, 1971) destoou do espírito da canção soul dos irmãos Valle, além de ser questionável do ponto de vista político. É que nem sempre cabe uma graça. E ainda bem que Tulipa percebeu isso ao cantar o folk People's parties (Joni Mitchell, 1974), que aborda desajuste emocional incondizente com a atmosfera descontraída do show. Feitas as ressalvas, cabe ressaltar que Tulipa está cada vez mais segura e luminosa como intérprete. Totalmente à vontade em seu universo autoral, a cantora realçou a ternura da canção Do amor (Tulipa Ruiz e Gustavo Ruiz, 2010) e fez Sushi (Tulipa Ruiz e Luiz Chagas, 2010) ficar saboroso como nunca. No bis, atendendo aos insistentes pedidos da plateia, a artista ainda improvisou Víbora (Tulipa Ruiz, Criolo, Caio Lopes, Gustavo Ruiz e Luiz Chagas, 2012) sem diluir o veneno dessa climática composição de seu segundo álbum. Enfim, com seu imaginário biquíni, Tulipa Ruiz mostra neste (ótimo) show acústico que tem voz o suficiente para se cobrir da cabeça aos pés.

André disse...

Tulipa é muito talentosa! Veio pra ficar!

Unknown disse...

Que linda! Tomara que repita esse show na rede sesc!

Douglas Carvalho disse...

Com todo respeito a sua crítica, Mauro, até concordo que Tulipa é dona de voz poderosa e personalíssima, mas AINDA falta a ela uma coisa fundamental para ser uma das grandes: um súper repertório. Exatamente o que Elis, Clara, Gal, Bethânia, Zizi, Simone, Beth, Alcione, Fafá, Simone, Rita têm (ou já tiveram em algum momento) ainda é muito esmaecido na carreira de Tulipa: grandes canções, daquelas capazes de serem lembradas por décadas.

Tulipa, assim como outras colegas de geração, até compõe músicas bonitinhas, mas suas canções ainda não têm esse status.