Mauro Ferreira no G1

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quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

Ondas de Caetano, Chet e João batem fortes no 'Arpoador' de Tomassini

Resenha de CD
Título: Arpoador
Artista: Leo Tomassini
Gravadora: Edição independente do artista
Cotação: * * * * 1/2

Dez anos após um primeiro CD solo de molde mais tradicional, Amor e cordas (2003), o sumido Leo Tomassini reaparece com um dos grandes discos de 2013, Arpoador, subvertendo (até certo ponto) as expectativas de quem conhece a trajetória musical do cantor e compositor carioca, iniciada como integrante da Família Roitman, grupo de samba que esteve em (relativa) evidência no Rio de Janeiro (RJ) ao longo dos anos 1990. Ondas sonoras do trompetista norte-americano Chet Baker (1929 - 1988), do compositor baiano Dorival Caymmi (1914 - 2008) e do cantor baiano João Gilberto batem fortes no autoral Arpoador, com bossa, em mix bem urdido por Dany Roland, produtor deste disco gestado e gravado desde 2006, no tempo cool do jazz de Baker, cujo som é evocado sobretudo pelo flugelhorn tocado por Leandro Joaquim em Elizabeth (Leo Tomassini) e em Queira, não queira (Leo Tomassini). Elizabeth, aliás, sintetiza bem o espírito de Arpoador, com o contraste da ardência de seus versos - nos quais o apaixonado autor se joga aos pés de sua rainha - com o clima cool da bossa digerida no toque do violão de Mig Martins. A presença da voz de Caetano Veloso justifica e explica tudo. A onda de Caetano - cuja voz se irmana com a de Tomassini em Elizabeth de tal forma que nem parece que são dois os cantores da faixa - é a que bate mais forte em Arpoador, porque, tropicalista pela própria natureza, o velho e antenado baiano já deglutiu antropofagicamente em sua obra todas as influências (Caymmi, Chet Baker e João Gilberto, sobretudo) absorvidas por Tomassini neste disco. A bossa herdada do seminal João ecoa tanto no violão posto pelo guitarrista Pedro Sá em Feitiço (Leo Tomassini) - samba-canção que adquire leve textura noise na segunda metade - quanto no violão tocado por Guinga na citada Queira, não queira, faixa em que também se ouve o canto profundo do carioca Guinga. Além da bossa, também evocada no violão tocado por Nelson Jacobina (1953 - 2012) em Estreia (Leo Tomassini), a herança do samba em sua forma original também banha as águas atemporais, e por isso mesmo contemporâneas, de Arpoador. É garoa (Leo Tomassini e Rubinho Jacobina) e Samba naif (Leo Tomassini) - sustentado pelo baticum d'Os Ritmistas (Dany Roland, Domenico Lancellotti e Stéphane San Juan) - abrem a roda para celebrar as tradições dos terreiros afro-brasileiros. Já Garbosa (Leo Tomassini) é samba buliçoso que entra nessa roda para mostrar a base sólida criada por um certo Dorival Caymmi nos anos 30 - década em que o compositor fluminense Ismael Silva (1905 - 1978) desceu o morro do Estácio com samba que ecoa maroto em Tomara que caia blusa (Leo Tomassini, Rubinho Jacobina e Mauro Aguiar). Contudo, é a presença de Caetano Veloso que paira sobre todo o disco, seja quando Tomassini dá voz a Arde (Leo Tomassini) - outra composição em que o calor da paixão (no caso, detectado em versos que remetem ao estilo dos sambas-canção dos anos 1950) - é diluído pelo clima cool do CD - ou quando apresenta canção, American love song way (Leo Tomassini e Marcos Alves), cuja letra é colagem (com poesia e sentido) de títulos de standards da música norte-americana, também  celebrada ao som das ondas no canto a capella de Dance with me (Leo Tomassini). Enfim, tudo parece dentro da ordem em Arpoador. Até o canto desmaiado de Tomassini se adequa com perfeição às músicas. Desmaiadas, a propósito, é como o escritor e poeta Francisco Bosco caracteriza as notas ouvidas na música-título Arpoador (Leo Tomassini) no texto em que apresenta o disco. No fim, Eu te amo - Canção de despertar (Leo Tomassini) é - do ponto de vista musical - declaração apaixonada de devoção ao som de Caetano Veloso, cuja música é a musa inspiradora de Leo Tomassini, abarcando todas as ondas que batem fortes no inspirado e surpreendente Arpoador.

3 comentários:

Mauro Ferreira disse...

Dez anos após um primeiro CD solo de molde mais tradicional, Amor e cordas (2003), o sumido Leo Tomassini reaparece com um dos grandes discos de 2013, Arpoador, subvertendo (até certo ponto) as expectativas de quem conhece a trajetória musical do cantor e compositor carioca, iniciada como integrante da Família Roitman, grupo de samba que esteve em (relativa) evidência no Rio de Janeiro (RJ) ao longo dos anos 1990. Ondas sonoras do trompetista norte-americano Chet Baker (1929 - 1988), do compositor baiano Dorival Caymmi (1914 - 2008) e do cantor baiano João Gilberto batem fortes no autoral Arpoador, com bossa, em mix bem urdido por Dany Roland, produtor deste disco gestado e gravado desde 2006, no tempo cool do jazz de Baker, cujo som é evocado sobretudo pelo flugelhorn tocado por Leandro Joaquim em Elizabeth (Leo Tomassini) e em Queira, não queira (Leo Tomassini). Elizabeth, aliás, sintetiza bem o espírito de Arpoador, com o contraste da ardência de seus versos - nos quais o apaixonado autor se joga aos pés de sua rainha - com o clima cool da bossa digerida no toque do violão de Mig Martins. A presença da voz de Caetano Veloso justifica e explica tudo. A onda de Caetano - cuja voz se irmana com a de Tomassini em Elizabeth de tal forma que nem parece que são dois os cantores da faixa - é a que bate mais forte em Arpoador, porque, tropicalista pela própria natureza, o velho e antenado baiano já deglutiu antropofagicamente em sua obra todas as influências (Caymmi, Chet Baker e João Gilberto, sobretudo) absorvidas por Tomassini neste disco. A bossa herdada do seminal João ecoa tanto no violão posto pelo guitarrista Pedro Sá em Feitiço (Leo Tomassini) - samba-canção que adquire leve textura noise na segunda metade - quanto no violão tocado por Guinga na citada Queira, não queira, faixa em que também se ouve o canto profundo do carioca Guinga. Além da bossa, também evocada no violão tocado por Nelson Jacobina (1953 - 2012) em Estreia (Leo Tomassini), a herança do samba em sua forma original também banha as águas atemporais, e por isso mesmo contemporâneas, de Arpoador. É garoa (Leo Tomassini e Rubinho Jacobina) e Samba naif (Leo Tomassini) - sustentado pelo baticum d'Os Ritmistas (Dany Roland, Domenico Lancellotti e Stéphane San Juan) - abrem a roda para celebrar as tradições dos terreiros afro-brasileiros. Já Garbosa (Leo Tomassini) é samba buliçoso que entra nessa roda para mostrar a base sólida criada por um certo Dorival Caymmi nos anos 30 - década em que o compositor fluminense Ismael Silva (1905 - 1978) desceu o morro do Estácio com samba que ecoa maroto em Tomara que caia blusa (Leo Tomassini, Rubinho Jacobina e Mauro Aguiar). Contudo, é a presença de Caetano Veloso que paira sobre todo o disco, seja quando Tomassini dá voz a Arde (Leo Tomassini) - outra composição em que o calor da paixão (no caso, detectado em versos que remetem ao estilo dos sambas-canção dos anos 1950) - é diluído pelo clima cool do CD - ou quando apresenta canção, American love song way (Leo Tomassini e Marcos Alves), cuja letra é colagem (com poesia e sentido) de títulos de standards da música norte-americana, também celebrada ao som das ondas no canto a capella de Dance with me (Leo Tomassini). Enfim, tudo parece dentro da ordem em Arpoador. Até o canto desmaiado de Tomassini se adequa com perfeição às músicas. Desmaiadas, a propósito, é como o escritor e poeta Francisco Bosco caracteriza as notas ouvidas na música-título Arpoador (Leo Tomassini) no texto em que apresenta o disco. No fim, Eu te amo - Canção de despertar (Leo Tomassini) é - do ponto de vista musical - declaração apaixonada de devoção ao som de Caetano Veloso, cuja música é a musa inspiradora de Leo Tomassini, abarcando todas as ondas que batem fortes no inspirado e surpreendente Arpoador.

ADEMAR AMANCIO disse...

É mais um que desconheço.

Nivaldo Andrade disse...

Boa notícia, é um dos meus cantores preferidos desde a época da Família Roitmann e do qual não ouvia falar desde o excelente "Amor & Cordas". Mauro, onde o CD pode ser adquirido?