Mauro Ferreira no G1

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quinta-feira, 24 de novembro de 2011

'Metamorfoses' embala discos em que 'camaleão' Ney decidiu todas as cores

Resenha de caixa de CDs
Título: Metamorfoses
Artista: Ney Matogrosso
Gravadora: Universal Music
Cotação: * * * * 1/2

 Sequência de Camaleão, caixa de 2008 que agrupou os álbuns editados por Ney Matogrosso entre 1975 e 1991, Metamorfoseembala os discos lançados pelo cantor entre 1993 e 2009. São discos de fase de contínua maturidade em que o Camaleão decidiu todas as cores que iria adotar, embora de forma geral ele sempre tenha escolhido as principais cores desde que saiu em carreira solo, no fim de 1974. Todos os 14 títulos - aos quais foram adicionados duas coletâneas duplas, Vinte e cinco (disco duplo de caráter revisionista produzido em 1996 com o aval de Ney e com gravações inéditas dos sucessos O vira, América do sul, Coubanakan e Bandido corazón), e a inédita e oportuna Metamorfoses (2011) - já tinham sido editados em CD na época do lançamento e, por isso, são embalados na caixa com o mesmíssimo padrão gráfico original, acompanhados de libreto onde o pesquisador musical Rodrigo Faour detalha a criação de cada disco em textos sóbrios e objetivos, sem o tom irreverente dos textos da caixa Camaleão. O único deslize acontece na reedição de As aparências enganam (1992), o álbum mais antigo. A ficha técnica exposta na contracapa e no encarte da atual reedição é a do LP, e não a do CD lançado em 1993. Por isso, a faixa Cheiro de saudade (Alceu Valença) - originalmente um bônus da edição original em CD - não está creditada no disco, embora esteja na reedição deste trabalho em que o Camaleão uniu seu canto às cores do grupo Aquarela Carioca.  Na sequência, ao longo da década de 1990, Ney passou a revisitar com requinte e personalidade os repertórios de ícones da música brasileira. Em Estava escrito (1994), disco de tom camerístico, o cantor refinou o repertório de Ângela Maria, garimpando o luxo e ignorando o lixo a que a Sapoti deu voz. Em Um brasileiro (1996), o intérprete expôs nuances do cancioneiro de Chico Buarque em disco que marcou a ruptura com o produtor Marco Mazzola ("Eu queria uma ênfase maior na harmonia e ele no ritmo", explica o cantor em entrevista a Faour). Foi quando Ney assumiu o controle total de sua discografia. Em O cair da tarde (1997), um de seus discos menos ouvidos (talvez pelo fato de não ter gerado um show), o cantor entrelaçou as obras de Antonio Carlos Jobim (1927 - 1994) e Heitor Villa-Lobos (1889 - 1959), realçando afinidades entres os cancioneiros soberanos dos maestros. Em Olhos de farol (1999), o Camaleão voltou a vestir pele pop ao mirar composições de nomes como Fred Martins, Flávio Henrique, Celso Viáfora e Pedro Luís. Título de peso na discografia do artista, Vivo (1999) - lançado no mesmo ano de Olhos de Farol - perpetuou o show originado do visionário álbum anterior. Na sequência, Ney reabriu a cortina do passado para dar voz a músicas lançadas nos anos 1930 e 1940 - algumas do repertório de Carmen Miranda (1909 - 1955) - no irretocável álbum Batuque (2001). Seguiu-se então classuda abordagem do repertório do compositor carioca Cartola (1908 - 1980). Idealizado para ser encartado no livro de fotos Ousar Ser (2002), Ney Matogrosso interpreta Cartola foi lançado em maio de 2002 em formato convencional de CD, tendo gerado um ano depois o redundante Ney Matogrosso interpreta Cartola ao vivo (2003). Fechada temporariamente a cortina do passado, Ney desbundou em Vagabundo (2004), um de seus discos mais ousados, de arquitetura pop alicerçada pelo peso percussivo de Pedro Luís e a Parede. Outro título redundante, Vagabundo ao vivo (2006) saiu tardiamente quando Ney já havia lançado, um ano antes, Canto em qualquer canto (2005), álbum originado de especial gravado para o Canal Brasil. Com a mesma contundência e pele pop de Vagabundo, mas de contorno bem distinto, Inclassificáveis (2008) foi álbum politizado de atitude roqueira. Belo e arrojado, Inclassificáveis foi o registro de estúdio de um dos shows mais bem-sucedidos de Ney. Um contraponto para o posterior Beijo bandido (2009), álbum de moldura mais camerística, gerado a partir de show sedutor que estreou em dezembro de 2008, quando o Camaleão ainda mantinha a vistosa pele pop de Inclassificáveis, então ainda em turnê nacional. E foi assim, alternando peles e cores, dono da própria voz, que o cantor se manteve na linha de frente da música brasileira. Ao embalar 14 álbuns de alto padrão de qualidade, a caixa Metamoforses mostra que Ney Matogrosso vem se transformando em (muitos) outros - desde 1975 - sem nunca deixar de ser Ney Matogrosso.

6 comentários:

KL disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Pedro Progresso disse...

gosto mais dos discos dessa caixa do que da anterior.

lurian disse...

É uma pena que as pessoas não escutem "O cair da tarde", considero esse um dos grandes discos do Ney, onde ele aborda Tom e Villa fugindo um pouco ao óbvio ao lado do UAKTI. O disco é um deslumbramento, uma festa de sons para os ouvidos, basta lembrar o pout-pourri de cirandas e O trenzinho do caipira. Outra coisa que admira é Cheiro da saudade ter sido faixa bônus, quando é exatamente uma das mais interessantes de "As aparências enganam", tema muito mais associado á antológica gravação de Elis Regina. Na sequência grandes discos como Batuque e Olhos de farol que são bons do começo ao fim.
Ney não é apenas camaleônico e festivo ou intimista é de fato um de nossos maiores intérpretes!

Acácio Costa disse...

O cair da tarde, pra mim, é um dos melhores discos da mpb de todos os tempos. Sempre toca no meu ipod!

Afonso disse...

Nada contra Mazzola. Ney fez trabalhos deslumbrantes c/ ele ao longo dos dezoito anos em que estiveram juntos, formando uma das mais belas e profícuas parcerias da mpb. Mas é impossível não observar o quanto Ney amadureceu sem a presença do produtor. Se c/ Mazzola Ney manteve a regra da diversidade, chegando a fazer (bons) trabalhos que chegavam a ser caldeirões de ritmos, livre dele, Ney foi capaz de exercitar uma unidade maior, sem perder o colorido exuberante e a originalidade que sempre foram sua marca registrada, só que de maneira mais apurada. Cada vez mais seguro, Ney fez, por exemplo, trabalhos predominando sambas, tristes ou alegres, outros de contorno absolutamente pop, como "Inclassificáveis", onde uma inusitada abordagem política acaba se transformando numa bela reflexão sobre a passagem do tempo, ou mesmo em trabalhos sofisticados e elaboradíssimos como "O cair da tarde" que, como eu já mesmo expressei neste espaço, talvez seja o meu favorito dessa caixa. E que independente de Ney não ter feito um show pra divulgá-lo, não seria mesmo um dos mais ouvidos de sua discografia, pois requinte demais não costuma agradar às maiorias.

Unknown disse...

O cair da tarde é um disco lindíssimo,de vez em quando ouço com prazer