Mauro Ferreira no G1

Aviso aos navegantes: desde 6 de julho de 2016, o jornalista Mauro Ferreira atualiza diariamente uma coluna sobre o mercado fonográfico brasileiro no portal G1. Clique aqui para acessar a coluna. O endereço é http://g1.globo.com/musica/blog/mauro-ferreira/


segunda-feira, 10 de junho de 2013

Textura de 'Para abrir os paladares' refina sabor da canção de Calderoni

Resenha de CD
Título: Para abrir os paladares
Artista: Vinicius Calderoni
Gravadora: sem indicação
Cotação: * * * 1/2

"... / Canto para quê? / Grito contra quem? / Vou atrás de quê?", pergunta Vinicius Calderoni - com o reforço de coro de amigos e com metais orquestrados por Tiago Costa à moda do Sgt. Pepper - em Juventude em marcha (Vinicius Calderoni), uma das 12 músicas autorais do segundo álbum do cantor e compositor paulistano, Para abrir os paladares. Com ironia, o artista responde que tais questões não são tão fundamentais. "Bom mesmo é encontrar os pares / Ir contrabandeando ideias torna as tardes mais solares", complementa Calderoni, indicando com poesia o caminho menos comprometido de sua geração. Produzido por Tó Brandileone (colega de Calderoni no  5 a seco, quinteto em atividade na cena de São Paulo desde 2009), o disco é marcado por rica profusão de texturas e timbres que refinam o sabor das canções de Calderoni. Em Para abrir os paladares, a forma adquirida pelas músicas é tão importante quanto a canção em si. Nesse sentido, é nítida a evolução do artista neste segundo álbum, sucessor de Tranchã (2007). Há ecos da arquitetura da música de Luiz Tatit no Grupo Rumo em Desprendimento (Vinicius Calderoni) e do suingue de Lenine na batida de Sobre óleo sobre tela (Vinicius Calderoni), mas nem por isso o jovem Calderoni deixa de marchar em ritmo próprio. A riqueza dos arranjos renova até as músicas já registradas pelo artista com o 5 a Seco no CD e DVD Ao vivo no Auditório Ibirapuera (2012), casos de Mesmo quando a boca cala (Vinicius Calderoni) - tema composto originalmente para a série da TV Cultura Tudo que é sólido pode derreter e regravado com cordas orquestradas pelo pianista André Mehmari - e Ou não (Vinicius Calderoni e Tó Brandileone), ora turbinada com guitarras que evocam Radiohead no toque de Michael Ruzistchka, que lê em alemão trecho do livro O capital, de Karl Marx (1818 - 1883), no meio da faixa repleta de questões da vida cotidiana. A propósito, se há uma questão suscitada pela audição de Para abrir os paladares, é se o mix de referências, sons e conceitos que pauta cada canção do disco eventualmente não peca pelo excesso. Em essência sensorial, o álbum por vezes resulta cerebral - impressão reforçada pelo detalhado faixa-a-faixa escrito por Calderoni e enviado aos críticos juntamente com o CD. De todo modo, a unidade da produção do disco faz com que a atmosfera de bossa nova que ambienta Uma ligeira impressão (Vinicius Calderoni) se afine com o minimalismo a la Philip Glass de O nome, a pessoa e com os climas de tango embutidos em Impasse (Vinicius Calderoni) e em Ponte incerta sobre rio selvagem (Vinicius Calderoni), música cuja letra é pura poesia. Os arranjos sempre servem às canções com precisão milimétrica, perceptível em Joquempô (Vinicius de Calderoni) quando as notas do piano acústico de Zé Godoy são salpicadas no verso "Goteiras de pirlimpimpim vão te atingir". Enfim, por mais que algumas músicas não estejam à altura das letras e precisem do ornamento orquestral do disco, como Carne e osso (Vinicius Calderoni), Para abrir os paladares cumpre a função de apontar o progresso da obra de Vinicius Calderoni na marcha de juventude mais antenada que vem encontrando seus pares e contrabandeando (boas) ideias sem a necessidade de gritar contra alguém. Tem sabor!

Um comentário:

Mauro Ferreira disse...

"... / Canto para quê? / Grito contra quem? / Vou atrás de quê?", pergunta Vinicius Calderoni - com o reforço de coro de amigos e com metais orquestrados por Tiago Costa à moda do Sgt. Pepper - em Juventude em marcha (Vinicius Calderoni), uma das 12 músicas autorais do segundo álbum do cantor e compositor paulistano, Para abrir os paladares. Com ironia, o artista responde que tais questões não são tão fundamentais. "Bom mesmo é encontrar os pares / Ir contrabandeando ideias torna as tardes mais solares", complementa Calderoni, indicando com poesia o caminho menos comprometido de sua geração. Produzido por Tó Brandileone (colega de Calderoni no 5 a seco, quinteto em atividade na cena de São Paulo desde 2009), o disco é marcado por rica profusão de texturas e timbres que refinam o sabor das canções de Calderoni. Em Para abrir os paladares, a forma adquirida pelas músicas é tão importante quanto a canção em si. Nesse sentido, é nítida a evolução do artista neste segundo álbum, sucessor de Tranchã (2007). Há ecos da arquitetura da música de Luiz Tatit no Grupo Rumo em Desprendimento (Vinicius Calderoni) e do suingue de Lenine na batida de Sobre óleo sobre tela (Vinicius Calderoni), mas nem por isso o jovem Calderoni deixa de marchar em ritmo próprio. A riqueza dos arranjos renova até as músicas já registradas pelo artista com o 5 a Seco no CD e DVD Ao vivo no Auditório Ibirapuera (2012), casos de Mesmo quando a boca cala (Vinicius Calderoni) - tema composto originalmente para a série da TV Cultura Tudo que é sólido pode derreter e regravado com cordas orquestradas pelo pianista André Mehmari - e Ou não (Vinicius Calderoni e Tó Brandileone), ora turbinada com guitarras que evocam Radiohead no toque de Michael Ruzistchka, que lê em alemão trecho do livro O capital, de Karl Marx (1818 - 1883), no meio da faixa repleta de questões da vida cotidiana. A propósito, se há uma questão suscitada pela audição de Para abrir os paladares, é se o mix de referências, sons e conceitos que pauta cada canção do disco eventualmente não peca pelo excesso. Em essência sensorial, o álbum por vezes resulta cerebral - impressão reforçada pelo detalhado faixa-a-faixa escrito por Calderoni e enviado aos críticos juntamente com o CD. De todo modo, a unidade da produção do disco faz com que a atmosfera de bossa nova que ambienta Uma ligeira impressão (Vinicius Calderoni) se afine com o minimalismo a la Philip Glass de O nome, a pessoa e com os climas de tango embutidos em Impasse (Vinicius Calderoni) e em Ponte incerta sobre rio selvagem (Vinicius Calderoni), música cuja letra é pura poesia. Os arranjos sempre servem às canções com precisão milimétrica, perceptível em Joquempô (Vinicius de Calderoni) quando as notas do piano acústico de Zé Godoy são salpicadas no verso "Goteiras de pirlimpimpim vão te atingir". Enfim, por mais que algumas músicas não estejam à altura das letras e precisem do ornamento orquestral do disco, como Carne e osso (Vinicius Calderoni), Para abrir os paladares cumpre a função de apontar o progresso da obra de Vinicius Calderoni na marcha de juventude mais antenada que vem encontrando seus pares e contrabandeando (boas) ideias sem a necessidade de gritar contra alguém. Tem sabor!