segunda-feira, 14 de abril de 2014

Belo livro revela como Circo Voador fez história a partir de onda de verão

Resenha de livro
Título: Circo Voador - A nave
Autor: Maria Juçá
Editora: Edição do autor
Cotação: * * * *

É impossível dissociar a história do rock brasileiro dos anos 1980 do Circo Voador, palco libertário erguido sobre as areias da praia do Arpoador, no Rio de Janeiro (RJ), em janeiro de 1982. Foi no verão que a banda carioca Blitz invadiu a praia dominada pela MPB, abrindo as comportas do mercado musical para grupos também debutantes como o Barão Vermelho e, um ano depois, o Kid Abelha. Foi sob a lona mais pop do Rio que essas bandas encontraram abrigo para se apresentar para um público que falava sua língua. Ecoando o começo de era propagado pelas ondas da Rádio Fluminense, outro veículo fundamental para a consolidação do rock na indústria da música, o Circo Voador fez história. E ainda faz, erguido no coração da Lapa, bairro do Centro do Rio para onde migrou em outubro daquele mesmo ano de 1982. Se o Circo não foi uma onda passageira de verão, muito de sua permanência e importância se deve ao caráter empreendedor da jornalista, radialista e produtora Maria Juçá. É Juçá - catarinense de alma carioca - quem conta a sua história e a da casa em Circo Voador - A nave, livro de narrativa arejada como as mentes que tornaram realidade o Circo e o sonho. Entre dados autobiográficos, Juçá rememora a construção da cena pop carioca dos anos 1980, relembrando momentos iniciais de nomes como Lobão e Paralamas do Sucesso. Cena que ecoou por todo o Brasil e que também tinha Brasília (DF) e São Paulo (SP) como núcleos-base. Tanto que bandas dessas duas cidades se apresentaram no Circo. O relato do festival punk organizado no Circo para dar visibilidade a bandas formadas por músicos com fome de comida e rock é uma das passagens mais saborosas do absorvente livro. Aliás, Juçá nunca tira onda: sem papas na língua politicamente incorreta, a produtora rememora a estrutura precária do Circo em seus anos iniciais, a luta para derrotar a máfia de seguranças corruptos na reabertura da casa em 2004, o estrelismo de certos artistas - com menção honrosa para o relato do piti de Lulu Santos por ter que entrar no Circo pela mesma porta do público - e a luta cotidiana para fechar as contas. Mesmo que a reprodução integral de entrevistas (algumas antigas, transcritas de jornais, outras inéditas) quebre por vezes o ritmo da narrativa, o livro logo torna a alçar voo porque são muitos os causos colecionados. Vale mencionar a dor de cabeça tida pela produtora quando peitou Tim Maia (1942 - 1998) - que, às voltas com duas prostitutas, deixou de fazer o show programado pelo Circo em agosto de 1984 - e o bolo do cantor carioca foi parar nas páginas do Jornal do Brasil para a fúria santa do Síndico. Longe de ser documento oficial sobre a casa, Circo Voador - A nave expõe o relato passional e pessoal de uma profissional que por vezes trabalhou de graça em nome de uma ideologia. Nada é maquiado no livro. As lembranças dos bicões que infestavam os camarins dos anos 1980 para disputar com os artistas cervejas bebidas em copos plásticos - estratégia para fazer a loura render mais - exemplificam o tom coloquial e sincero da narrativa. Juçá também enfatiza que o clima de irmandade dos primeiros heroicos tempos cedeu lugar a uma estrutura mais profissional, capaz de viabilizar a manutenção do Circo Voador como palco auto-sustentável.  O palco preferido do guitarrista e compositor carioca Celso Blues Boy (1956 - 2012), um dos recordistas de shows e público ao longo das três décadas de vida do Circo. A narrativa de 21 capítulos vai até os dias de hoje, lembrando, por exemplo, a recente ida a um show no Circo de ninguém menos do que lady Madonna. O relato é sempre quente. Transborda ao longo das caudalosas 704 páginas do livro o apego da comandante por sua nave. Nesse sentido, o livro de Maria Juçá conta uma história de amor. Amor pela música, pela liberdade e, sobretudo, por um palco que fez (e faz) história.

5 comentários:

  1. É impossível dissociar a história do rock brasileiro dos anos 1980 do Circo Voador, palco libertário erguido sobre as areias da praia do Arpoador, no Rio de Janeiro (RJ), em janeiro de 1982. Foi no verão que a banda carioca Blitz invadiu a praia dominada pela MPB, abrindo as comportas do mercado musical para grupos também debutantes como o Barão Vermelho e, um ano depois, o Kid Abelha. Foi sob a lona mais pop do Rio que essas bandas encontraram abrigo para se apresentar para um público que falava sua língua. Ecoando o começo de era propagado pelas ondas da Rádio Fluminense, outro veículo fundamental para a consolidação do rock na indústria da música, o Circo Voador fez história. E ainda faz, erguido no coração da Lapa, bairro do Centro do Rio para onde migrou em outubro daquele mesmo ano de 1982. Se o Circo não foi uma onda passageira de verão, muito de sua permanência e importância se deve ao caráter empreendedor da jornalista, radialista e produtora Maria Juçá. É Juçá - catarinense de alma carioca - quem conta a sua história e a da casa em Circo Voador - A nave, livro de narrativa arejada como as mentes que tornaram realidade o Circo e o sonho. Entre dados autobiográficos, Juçá rememora a construção da cena pop carioca dos anos 1980, relembrando momentos iniciais de nomes como Lobão e Paralamas do Sucesso. Cena que ecoou por todo o Brasil e que também tinha Brasília (DF) e São Paulo (SP) como núcleos-base. Tanto que bandas dessas duas cidades se apresentaram no Circo. O relato do festival punk organizado no Circo para dar visibilidade a bandas formadas por músicos com fome de comida e rock é uma das passagens mais saborosas do absorvente livro. Aliás, Juçá nunca tira onda: sem papas na língua politicamente incorreta, a produtora rememora a estrutura precária do Circo em seus anos iniciais, a luta para derrotar a máfia de seguranças corruptos na reabertura da casa em 2004, o estrelismo de certos artistas - com menção honrosa para o relato do piti de Lulu Santos por ter que entrar no Circo pela mesma porta do público - e a luta cotidiana para fechar as contas. Mesmo que a reprodução integral de entrevistas (algumas antigas, transcritas de jornais, outras inéditas) quebre por vezes o ritmo da narrativa, o livro logo torna a alçar voo porque são muitos os causos colecionados. Vale mencionar a dor de cabeça tida pela produtora quando peitou Tim Maia (1942 - 1998) - que, às voltas com duas prostitutas, deixou de fazer o show programado pelo Circo em agosto de 1984 - e o bolo do cantor carioca foi parar nas páginas do Jornal do Brasil para a fúria santa do Síndico. Longe de ser documento oficial sobre a casa, Circo Voador - A nave expõe o relato passional e pessoal de uma profissional que por vezes trabalhou de graça em nome de uma ideologia. Nada é maquiado no livro. As lembranças dos bicões que infestavam os camarins dos anos 1980 para disputar com os artistas cervejas bebidas em copos plásticos - estratégia para fazer a loura render mais - exemplificam o tom coloquial e sincero da narrativa. Juçá também enfatiza que o clima de irmandade dos primeiros heroicos tempos cedeu lugar a uma estrutura mais profissional, capaz de viabilizar a manutenção do Circo Voador como palco auto-sustentável. O palco preferido do guitarrista e compositor carioca Celso Blues Boy (1956 - 2012), um dos recordistas de shows e público ao longo das três décadas de vida do Circo. A narrativa de 21 capítulos vai até os dias de hoje, lembrando, por exemplo, a recente ida a um show no Circo de ninguém menos do que lady Madonna. O relato é sempre quente. Transborda ao longo das caudalosas 704 páginas do livro o apego da comandante por sua nave. Nesse sentido, o livro de Maria Juçá conta uma história de amor. Amor pela música, pela liberdade e, sobretudo, por um palco que fez (e faz) história.

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  2. Mauro,

    Você sabe onde eu posso encontrar pra comprar, por favor?

    Muito obrigado,

    Renato.

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  3. Renato, tenho visto o livro em livrarias do Rio. Não sei como está a distribuição em outros Estados. Abs, MauroF

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  4. Em São Paulo, no shopping Frei Caneca, tem na livraria BLOOKS...

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  5. Aguardo a crítica sobre o documentário recém-lançado "Circo Voador - A Nave".

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