sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Canção pop de Buhr, 'Amor Brando' origina um clipe bom, bonito e barato

Resenha de clipe
Música: Amor Brando (Karina Buhr, 2011)
Artista: Karina Buhr (em foto de Amanda Nascimento)
Direção e edição: Alice Lanari
Fotografia: Juan Camilo Fleing
Produção: Gaivota Filmes
Cotação: * * *


Com uma ideia na cabeça e uma câmera na mão da diretora Alice Lanari, Karina Buhr gravou em Buenos Aires, em setembro de 2012, o clipe de Amor Brando, canção de sua lavra autoral, lançada pela artista em seu segundo álbum, Longe de Onde (2011). Gravado em duas milongas da capital da Argentina, El Beso e Club Gricel, o clipe foi posto em rotação no YouTube neste mês de novembro. Embora não seja evidente a sintonia entre as imagens e a letra da canção de arquitetura pop, cozida em fogo brando na gravação feita por Buhr somente com a guitarra de Edgard Scandurra, o clipe resulta simples e estiloso em seu despojamento. Lanari capta Buhr dançando sozinha no salão. Imagens de outros casais na pista são desfocadas, acentuando a solidão (feliz) da personagem dos versos da canção. Bom, bonito e barato, o vídeo de um minuto e 37 segundos é exemplo da viabilidade de produzir um clipe de baixo orçamento sem prejuízo da qualidade artística, como prova a bela fotografia de Juan Camilo Fleing. Vale ver!!!

'Vida que Segue' é o título e a (única) inédita do DVD dos 30 anos de Zeca

Vida que Segue é o título do CD e DVD com os quais Zeca Pagodinho vai festejar 30 anos de carreira em 2013. Vida que Segue é também o nome da única música inédita do repertório para o qual foram selecionados vários sambas originalmente lançados nos 60 como Trem das Onze (Adoniran Barbosa, 1964), Volta por Cima (Paulo Vanzolini, 1963), Só o Ôme (Edenal Rodrigues, 1968) e  Eu Agora Sou Feliz (Jamelão e Mestre Gato, 1963). Vida que Segue é de autoria de Serginho Meriti com Rodrigo Leite e Cocão. A gravação ao vivo do CD/DVD Vida que Segue está agendada para 4 e 5 de dezembro de 2012, em estúdio do Rio de Janeiro (RJ).

Dono de sua obra fonográfica, Metallica anuncia a abertura de gravadora

Através de comunicado postado em seu site oficial, o grupo Metallica anunciou nesta sexta-feira, 30 de novembro de 2012, a abertura de sua própria gravadora, a Blackened Recordings. A banda abre sua gravadora no momento em que se torna proprietário das masters de todos seus álbuns de estúdio e gravações ao vivo de shows (incluindo os registros audiovisuais) - como acordado em contrato assinado com a Warner Music em 1994. O primeiro lançamento do Metallica pela Blackened Recordings - o DVD e blu-ray Quebec Magnetic, registro de show captado em 2009 em Quebec, no Canadá - já está programado para 10 de dezembro de 2012. 

De tom roqueiro, mas até com fado na trilha, 'Jacinta' é musical farsesco

Resenha de musical de teatro
Título: Jacinta
Texto: Newton Moreno
Direção: Aderbal Freire-Filho
Direção musical: Branco Mello
Músicas: Branco Mello e Emerson Villani  / Letras: Newton Moreno e Aderbal Freire-Filho
Elenco: Andrea Beltrão, Augusto Madeira, Gillray Coutinho, José Mauro Brant,
           Isio Ghelman e Rodrigo França
Foto: Nil Caniné
Cotação: * * * 1/2
Espetáculo em cartaz no Teatro Poeira, no Rio de Janeiro (RJ), de quinta-feira a domingo

Definido no programa como comédia-rock, o musical Jacinta se utiliza de elementos de farsa para narrar a saga da personagem-título - atriz lusitana desprovida de talento - na busca por aplauso e reconhecimento. A direção musical do titã Branco Mello confere natural tom roqueiro à trilha sonora formada por 13 músicas compostas por Mello com Emerson Villani e letradas por Newton Moreno (autor do texto original, ponto de partida para a criação do musical) e / ou Aderbal Freire-Filho. Executada em cena por um quarteto denominado Os Jacintas, a trilha sonora serve bem ao espetáculo sem apresentar músicas com cacife para sobreviver fora do palco do carioca Teatro Poeira, onde o espetáculo estreou em 15 de novembro de 2012. Na travessia Portugal-Brasil, feita por Jacinta na incansável procura do aplauso, até um fado - o Fado Escatológico (Branco Mello, Emerson Villani e Newton Moreno) - se faz ouvir em cena na interpretação do entrosado elenco. Na pele de Jacinta, Andrea Beltrão entra nessa cena sem impressionar no papel de cantora de parte destas músicas, mas com interpretações eficientes que se afinam com o tom lúdico do espetáculo, um poema musicado sobre o ator, na definição de Newton Moreno. O quinteto coadjuvante - formado pelos atores Augusto Madeira, Gillray Coutinho, José Mauro Brant, Isio Ghelman e Rodrigo França - se alterna com evidentes prazer, vivacidade e talento na construção de várias personagens que vão se sucedendo neste road-musical que celebra a arte de mambembar e o jogo de cena que constitui a própria alma do teatro. A habitual brasilidade brejeira dos textos de Newton Moreno cede lugar na cena para o tom marcante da encenação de Aderbal Freire-Filho, cuja direção evidencia o parentesco de Jacinta com a linguagem cênica de outro espetáculo assinado pelo diretor no mesmo Teatro Poeira, O Púcaro Búlgaro, destaque da temporada carioca de 2006. Mesmo que resulte longo (a cena folhetinesca que marca o encontro de Jacinta com sua mãe é totalmente dispensável, até porque destoante do tom farsesco do espetáculo), Jacinta é musical quase sempre cativante que se desvia do padrão Broadway e serve de veículo para o exercício do talento versátil de Andréa Beltrão, grande atriz que põe seu canto a serviço do teatro. Se "A Arte é o que existe / O aplauso não existe", como sentencia Aderbal Freire-Filho em versos do tema O Antiaplauso, a simples existência de Jacinta já ratifica o teatro como (nobre) forma de Arte.

Sem recesso, Coldplay já compõe repertório do sexto álbum de estúdio

Mal lançou o registro ao vivo da Mylo Xyloto Tour (Live 2012, já disponível no Brasil em edição da EMI Music), Coldplay já arquiteta o repertório de seu sexto álbum de estúdio. Líder e vocalista do grupo inglês, Chris Martins está compondo as músicas do sucessor do pop Mylo Xyloto (2011), desfazendo rumores de que a banda entraria em prolongado recesso por conta do (súbito) cancelamento de todos os shows da turnê mundial inspirada por seu álbum anterior.

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Sanz toca repetitiva música pop em CD que o une a Ana, Ivete e Roberta

Resenha de CD
Título: Lá Música No se Toca
Artista: Alejandro Sanz
Gravadora: Universal Music
Cotação: * *

A máquina da gravadora Universal Music trabalha a todo vapor para devolver a Alejandro Sanz o sucesso no Brasil que, a rigor, o cantor e compositor espanhol alcançou somente uma vez, em 1998, quando sua música Corazón Partío - lançada em seu álbum Más (1997) - foi propagada em escala mundial na trilha sonora da novela Torre de Babel (TV Globo, 1998). A alavanca que tenta fabricar nova onda de sucesso foi acionada com o recrutamento de três cantoras nacionais - Ana Carolina, Ivete Sangalo e Roberta Sá - para gravar duetos com Sanz em versões em português de três músicas do décimo álbum de estúdio do astro latino, La Música No se Toca. Tais versões turbinam a edição brasileira do álbum sem alterar seu (baixo) valor. Das três cantoras, Ana Carolina é a mais identificada com o estilo do cancioneiro pop de Sanz - parentesco perceptível no dueto feito por Ana com Sanz em Irrepetível (Me Sumerjo), música de autoria do cantor, adaptada para o português pela própria Ana. Já Ivete dá voz a Não me Compares, balada pop de refrão ganchudo que se impõe como a melhor das três músicas escolhidas para os links de Sanz com as intérpretes nacionais. A versão em português de No me Compares (Alejandro Sanz) - canção também ouvida no CD no espanhol original - é assinada por Filipe Catto, cantor e compositor  gaúcho (radicado na cidade de São Paulo) que vem migrando progressivamente da cena indie para o universo pop(ular). Em qualquer versão, o coro pavoroso quase estraga a música. Estranha nesse ninho (pop)ular, Roberta Sá põe sua leveza em Bailo Com Vos (Alejandro Sanz) sem acrescentar nada de relevante à sua discografia com a gravação da versão assinada por Pedro Luís. No mais, o disco toca a palatável e trivial música pop de Sanz. Com destaque para a faixa-título La Música No se Toca (Alejandro Sanz), o repetitivo cancioneiro do disco flerta eventualmente com o universo do rock, como em Llamando a La Mujer Acción (Alejandro Sanz), sem adicionar peso ao disco com tais flertes. Na aba das cantoras brasileiras, e mesmo sem elas, Sanz soa insosso no mais das vezes.

Com hit de Piaf no roteiro, Machete faz 'Extravaganza' novamente no Rio

Com direito à inclusão de sucesso de Edith Piaf (1915 - 1963) no roteiro poliglota, Non, Je Ne Regrette Rien (Charles Dumont e Michael Vaucaire, 1956), Silvia Machete fez Extravaganza mais uma vez no Rio de Janeiro (RJ). Reapresentado no teatro do Solar de Botafogo na noite de ontem, quarta-feira, 28 de novembro de 2012, o show serviu para promover o CD e o DVD Extravaganza ao Vivo, captados em maio de 2011 em São Paulo (SP) e recém-lançados pela Coqueiro Verde Records. Machete - vista em foto de Rodrigo Amaral - cantou músicas do álbum Extravaganza (2010) e intercalou os números do gracioso show com comentários nos quais exercitou seu fino e inteligente humor. A volta do show aos palcos cariocas, mais de dois anos após sua estreia em agosto de 2010, reiterou a sensação de que Extravaganza perdeu (parte de) seu poder de sedução na captação para o DVD, tendo mais graça ao vivo e a cores.

Dose Certa colhe frutos do Fundo de Quintal no CD ''Pra Sempre Samba'

Resenha de CD
Título: Pra Sempre Samba
Artista: Dose Certa
Gravadora: Universal Music
Cotação: * * * 

Enquanto o pagode romântico dá sinais de desgaste no mercado comum da música, minado pela supremacia do sertanejo pop que tem ditado normas e padrões na indústria da música, um grupo de São Paulo (SP) chega para relembrar que o quintal brasileiro já deu frutos mais nobres na seara do samba. Contudo, o quinteto  - intitulado Dose Certa e formado por Alemão do Cavaco (cavaquinho e voz), Vitor da Candelária (percussão), Wilsinho do Peruche (voz e pandeiro), J. Petróleo(voz e banjo) e Vinicius Almeida (baixo e violões) - não escapa do formato ao vivo recorrente no sucateado mercado fonográfico nativo. Gravado em show no Teatro Fecap, em São Paulo (SP), o CD Pra Sempre Samba enfatiza já no título o apego às tradições do gênero, reverenciado logo na faixa que abre o disco, Samba, Eu te Agradeço (Mauro Diniz). Tema de grande beleza melódica gravado com o adesão vocal de Ivan Lins, No Compasso do Samba (Sereno e Moacyr Luz) reforça a assinatura do Dose Certa nesta espécie de carta de intenções que expressa a devoção do grupo aos cânones do samba mais nobre. Tanto que Velho João (Adilson Bispo e Zé Roberto) é (razoável) tributo à memória de João Nogueira (1941 - 2000), encerrado com citação de Batendo a Porta (João Nogueira e Paulo César Pinheiro, 1974), exemplo do poder do saudoso criador. Já A Rosa e o Beija-Flor (Milbe, Yvison Bezerra e Gerson da Banda) exala perfume lírico no quintal do Dose Certa. Os arranjos - divididos entre Alemão do Cavaco, o maestro Ivan Paulo e Mauro Diniz - acentuam o salutar tradicionalismo do álbum produzido por Luiz Ribeiro. Além de avalizar o samba do Dose Certa, a lista de convidados do disco - a maioria egressa das rodas, pagodes e quintais do Rio de Janeiro (RJ) - ajudar a quebrar preconceitos pela origem paulista do quinteto, propagado em bar de Vila Madalena. Pedro Miranda ajuda a reacender a chama do partido alto em Fogão de Lenha (Toninho Geraes e Toninho Nascimento). Bom compositor que não emplacou como cantor, Wanderley Monteiro ajuda o grupo a dar voz à nostalgia amorosa de Perseguir a Paz, parceria sua com o bamba Luiz Carlos da Vila (1949 - 2008). Já Ana Costa alinha desavenças conjugais em dueto com J. Petróleo em Ela e Ele (J. Petróleo). Estranha no ninho do samba, Verônica Ferriani reitera a beleza de sua voz ao dar a mediana Receita de Samba (Dona Ivone Lara, André Lara e João Martins). Por mais que o repertório inédito de Pra Sempre Samba soe irregular ao longo das 16 faixas do CD, perdendo na comparação com temas já conhecidos como Cândidas Neves (Zé Renato e Nei Lopes), faixa ambientada pelo grupo em clima de terreiro, o disco resulta coerente e sem apelação. É nessa atmosfera de terreiro que o Dose Certa também aclimata O Tombo da Corrente (J. Petróleo e Nelson Papa), evocação da raiz africana do samba, feita com o reforço vocal de Leci Brandão. Mesmo fora do terreiro, o Dose Certa mostra no registro ao vivo que soube colher os melhores frutos do Fundo de Quintal.

Seguida por Adele, Sandé lidera lista de álbuns vendidos no Reino Unido

Lançado em 2011, ano em que foi líder de vendas em escala mundial, o segundo álbum da cantora inglesa Adele, 21, ainda teve fôlego para chegar em segundo lugar na lista dos 10 álbuns mais vendidos no Reino Unido em 2012, divulgada pela The Official Charts Company nesta quinta-feira, 29 de novembro de 2012. Mas o vencedor foi Our Versions of Events, primeiro (bom) álbum da cantora escocesa Emeli Sandé. O álbum vendeu 928 mil cópias até o momento e deverá ultrapassar um milhão de cópias com o aumento das vendas no período natalino. As cantoras, aliás, dominam a lista, que inclui álbuns de Lana Del Rey (Born to Die, em honroso terceiro lugar), Jessie J (Who You Are), Rihanna (Talk That Talk) e Paloma Faith (Fall to Grace). Eis os 10 álbuns mais vendidos no Reino Unido de janeiro a novembro de 2012:

1. Our Version of Events - Emeli Sandé
2. 21 - Adele
3. Born to Die - Lana Del Rey
4. + - Ed Sheeran
5. Mylo Xyloto - Coldplay

6. Babel - Mumford & Sons
7. Who You Are - Jessie J
8. Talk That Talk - Rihanna
9. Fall to Grace - Paloma Faith
10. Up All Night - One Direction

RoRo regrava 'Fogueira' com Bethânia no Rio para o DVD 'Feliz da Vida'

Maria Bethânia voltou a acender a Fogueira de Angela RoRo. Além de incluir no roteiro do show Carta de Amor a canção de RoRo que lançou em seu álbum Ciclo (1983), Bethânia regravou Fogueira na noite de quarta-feira, 28 de novembro de 2012, em dueto com a compositora da música. A gravação foi feita no Rio de Janeiro (RJ) para os extras do DVD Feliz da Vida, segundo registro audiovisual de show de Angela RoRo - vista na foto de Rodrigo Goffredo na gravação ao vivo do show, realizada no Theatro Net Rio, no Rio de Janeiro, em 15 de outubro.

quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Machete realça performances no registro parcial do show 'Extravaganza'

Resenha de DVD
Título: Extravaganza ao Vivo
Artista: Silvia Machete
Gravadora: Coqueiro Verde
Cotação: * * * 

Quem for ao Solar de Botafogo na noite desta quarta-feira, 28 de novembro de 2012, assistir ao show de lançamento do segundo DVD de Silvia Machete, Extravaganza ao Vivo, vai ver uma apresentação maior do que a captada pela cantora e compositora carioca no Auditório Ibirapuera, em São Paulo (SP), em 20 de maio de 2011. Machete optou por fazer registro parcial do show no DVD, enfatizando na seleção de 14 números o caráter performático de suas interpretações. Um dos melhores shows de 2010, Extravaganza perde parte de seu poder de sedução no vídeo, e não somente por não eternizar o show na íntegra. Mas seu pálido registro audiovisual expõe a grande evolução musical de Machete. A ótima cantora pode até armar seu circo em um ou outro número, mas a música permanece no centro da cena, soberana, sem truques. Meu Carnaval (Márcio Pombo e Silvia Machete, 2010) e Guzzy Muzzy (Jorge Mautner, 1974) evidenciam o espírito tropical(ista) da folia pop. Entre a sensualidade de O Baixo (Silvia Machete, 2010) e a lembrança de Volta por Cima (Paulo Vanzolini, 1963), Machete reanima Coração Valente, parceria com Hyldon, lançada no irretocável CD Extravaganza (2010). Trocas de figurinos e jogos de cena - feitos com espelhos no samba-canção Só Você (Mais Nada) (Paulo Soledade, 1961), boa sacada do roteiro - valorizam show de sonoridade incomum. Tanto que uma tuba (tocada pelo trombonista Thiago Osório) se impõe entre os instrumentos da banda arregimentada por Machete. A teatralidade da artista também foge dos habituais padrões cênicos. O gestual que simula o toque de uma guitarra em Curare (Bororó, 1940) - número herdado de show anterior - reitera a elegância da cena de Machete. Nos extras, o DVD exibe making of do espetáculo com triviais imagens de bastidores. Numa delas, um flagrante do setlist - com 20 músicas - sugere que Extravaganza cresce ao vivo. Em todos os sentidos...

Bebel grava primeiro DVD no Rio com participação de Chico e Renegado

Com participação de Chico Buarque, Bebel Gilberto vai gravar seu primeiro DVD em show no Arpoador, em Ipanema, bairro do Rio de Janeiro (RJ) onde há 30 anos o Circo Voador armou sua lona pop - sob a qual Bebel deu seus primeiros passos artísticos ao lado de Cazuza (1958 - 1990). A gravação do DVD está agendada para dezembro de 2012 e vai ser feita sob a direção de Gringo Cardia. Além de Chico, está programada a participação do rapper Flávio Renegado.

Camila entra em cena como cantora para homenagear Maysa com classe

Resenha de programa de TV
Série: Cantoras do Brasil
Título: Camila Pitanga Canta Maysa
Idealização: Mariana Rolim, Mercedes Tristão e Simone Esmanhotto
Direção: Simone Elias
Emissora: Canal Brasil
Foto: Chris Valias
Cotação: * * * 1/2 
Exibição programada pelo Canal Brasil para as 18h45m de 29 de novembro de 2012


Maysa (1936 - 1977) foi cantora chegada a um drama que eventualmente se aventurou como atriz, tendo feito até novelas. Camila Pitanga é uma atriz chegada a uma música que se aventura como cantora no 13º episódio de Cantoras do Brasil, o último da série em que uma intérprete contemporânea - no caso, uma atriz - dá voz a músicas gravadas por uma cantora de tempos idos. Driblando as (baixas) expectativas geradas pela inclusão do nome da atriz no elenco de jovens cantoras, o programa Camila Pitanga Canta Maysa - a ser exibido pelo Canal Brasil nesta quinta-feira, 29 de novembro de 2012 - se revela interessante e fecha a série com requinte. É com classe que Camila entra em cena como atriz para celebrar Maysa, dando voz (bem colocada, diga-se) a Dindi (Tom Jobim e Aloysio de Oliveira, 1959) - clássico instantâneo do Maestro Soberano, gravado por Maysa no álbum Voltei (RGE, 1960), um ano após o lançamento da música -  e a Só Você (Mais Nada), tema noturno de Paulo Soledade que Maysa gravou paradoxalmente  no momento em que clareava os tons de seu repertório com o repertório bossa-novista do álbum Barquinho (Columbia, 1961). A elegância do registro de Dindi - feito em requintado clima minimalista, somente com a voz acariciante de Camila, o piano de cauda de Daniel Grajew e o baixo de Alex Dias - é bisada em Só Você (Mais Nada). Neste que é o melhor dos dois números musicais do programa, Camila põe seu talento de atriz a serviço de (bela) interpretação que evoca o canto sofrido e apaixonado de Maysa sem jamais cair na tentação de imitar o estilo da cantora. A economia do arranjo - calcado também no piano de Grajew e no baixo de Dias, mas com a adesão da guitarra sutil de Pipo Pegoraro e do leve toque da bateria de Flavio Lazzarin - alude à orquestração da gravação de Maysa e sublinha a solidão exposta em versos desiludidos que falam de saudade sentida no "silêncio da noite" e no "vazio da rua". Enfim, a atriz está bem no papel de cantora. Camila Pitanga Canta Maysa somente não resulta mais redondo porque, no depoimento que entremeia os dois números musicais, a atriz se expressa mal sobre a (importância da) cantora que celebra com elegância no fim da série que linkou vozes femininas de gerações, estilos e sotaques distintos. 

Lulina canta Ademilde e Miriam com desembaraço em Cantoras do Brasil

Resenha de programa de TV
Série: Cantoras do Brasil
Título: Lulina Canta Ademilde Fonseca e Lulina Canta Miriam Batucada
Idealização: Mariana Rolim, Mercedes Tristão e Simone Esmanhotto
Direção: Simone Elias
Emissora: Canal Brasil
Foto: Chris Valias
Cotação: * * * 1/2
Programa exibido pelo Canal Brasil às 18h45m de 22 de novembro de 2012


Cantora pernambucana radicada em São Paulo (SP), Lulina mostrou que tem lá seu estilo em gravação feita para recente tributo ao grupo de pagode Raça Negra, Jeito Felindie (Fita Bruta, 2012). No penúltimo episódio de Cantoras do Brasil, série do Canal Brasil em que uma intérprete contemporânea dá voz a músicas gravadas por uma cantora de tempos idos, Lulina reitera seu estilo e celebra com desembaraço os cantos de Ademilde Fonseca (1921 - 2012) e Miriam Batucada (1947 - 1994). Atípico por concentrar duas homenagens num único episódio, o 12º programa da série se revela interessante pela destreza de Lulina. Da eterna Rainha do Choro, a cantora escolheu História Difícil (Pereira Costa e Victor Santos), choro gravado por Ademilde no álbum A Rainha Ademilde e Seus Chorões Maravilhosos (Museu da Imagem e do Som, 1977), como informa a antenada Lulina em seu depoimento para as câmeras dirigidas com a habitual classe por Simone Elias. Além da agilidade vocal da intérprete, sobressai no número o suingue das guitarras de Gabriel Muzak e Maurício Tagliari, diretor musical da série. De Miriam Batucada, vivaz cantora paulistana (nascida na Mooca, descendente de italianos), Lulina escolheu A Banca do Distinto (Billy Blanco), samba gravado com certa repercussão pela intérprete. Detalhe: Lulina cai sentada no samba, entoado em poltrona, com acompanhamento mais tradicional, no qual se destacam o cavaquinho de Gabriel Muzak e a percussão de Beto Gibbs e Maurício Tagliari. No fim do episódio, pouco antes da rolagem dos créditos, Lulina ainda dá palhinha a capella de Apanhei um Resfriado (Leonel Azevedo e Sá Roris), outro tema associado ao canto esperto de Miriam Batucada, cantora indie, injustamente esquecida, mas lembrada com propriedade por Lulina com seu jeito indie na (oportuna) série do Canal Brasil.

Sem vivência, Mallu empalidece tributo a Elizeth em 'Cantoras do Brasil'

Resenha de programa de TV
Série: Cantoras do Brasil
Título: Mallu Magalhães Canta Elizeth Cardoso
Idealização: Mariana Rolim, Mercedes Tristão e Simone Esmanhotto
Direção: Simone Elias
Emissora: Canal Brasil
Foto: Chris Valias
Cotação: *  
Programa exibido pelo Canal Brasil às 18h45m de 15 de novembro de 2012


Em seu vago depoimento para o 11º  episódio de Cantoras do Brasil, série do Canal Brasil em que uma intérprete contemporânea dá voz a músicas gravadas por uma cantora de tempos idos, Mallu Magalhães fala mais de si própria do que de Elizeth Cardoso (1920 - 1990). Sobre a Divina, alvo da homenagem do episódio, a artista paulista se limita a expor uma ou outra percepção como "Ela cantava como se fosse a música". Em nítida evolução como cantora e compositora dentro de seu particular universo musical, Mallu decepciona no programa e deixa a certeza de não ter (ainda) vivência para encarar o repertório de Elizeth e - talvez - de não ter conhecimento mais nítido sobre a cantora que celebra na série idealizada por Mariana Rolim, Mercedes Tristão e Simone Esmanhotto. Tanto que as duas composições escolhidas por Mallu para dar origem aos habituais dois números musicais do episódio - gravados no estúdio YB Music, em São Paulo (SP), sob a direção musical do guitarrista Maurício Tagliari - são pouco ou nada identificadas com Elizeth, cantora de técnica primorosa que imortalizou vários clássicos da música brasileira com sua estilosa voz de contralto que roçava tons de mezzo-soprano. Demais (Tom Jobim e Aloyiso de Oliveira, 1959) foi lançada por Sylvia Telles (1935 - 1966) no álbum Amor de Gente Moça (Odeon, 1959), mas passaria a ser associada a Maysa (1936 - 1977) a partir de 1965 (a Divina gravou Demais em 1967 no álbum A Enluarada Elizeth). Já Manhã de Carnaval (Luiz Bonfá e Antônio Maria, 1959) - música conhecida em escala mundial por ser da trilha sonora do filme Orfeu Negro (1959) - foi gravada originalmente por Elizeth na trilha do filme, mas, ao menos no Brasil, tal registro não se impôs na discografia da cantora. As interpretações pálidas de Mallu para as duas músicas acentuam o caráter equivocado das escolhas. Nem os bons arranjos dos números musicais - em que sobressaem o acordeom de Daniel Grajew e os violões de Gabriel Muzak e Pipo Pegoraro - atenuam a sensação de Mallu Magalhães Canta Elizeth Cardoso ser o único episódio ruim da boa série Cantoras do Brasil.

terça-feira, 27 de novembro de 2012

Nick Cave & Bad Seeds lançam 15º álbum, 'Push The Sky Away', em 2013

Formado na Inglaterra em 1983 por músicos australianos, sob a liderança de Nick Cave, o grupo Nick Cave & The Bad Seeds vai festejar 30 anos de vida com o lançamento de seu 15º álbum de estúdio, Push The Sky Away.  Gravado no La Fabrique Studios, situado em mansão do Sul da França, o sucessor de Dig, Lazarus, Dig!!! (2008) tem lançamento agendado pela Mute Records para 18 de fevereiro de 2013. Trata-se do primeiro disco após a saída do cofundador Mick Harvey do grupo, em janeiro de 2009. Produzido por Nick Launey, Push The Sky Away apresenta nove músicas. Uma delas, We No Who U R, foi eleita o primeiro single, cuja edição está programada para 3 de dezembro. Eis as nove faixas de Push The Sky Away:

1. We No Who U R
2. Wide Lovely Eyes
3. Water's Edge
4. Jubilee Street
5. Mermaids
6. We Real Cool
7. Finishing Jubilee Street
8. Higgs Boson Blues
9. Push The Sky Away

Caixa 'Festivais da Canção 2' reaviva passos iniciais de Alceu e Tornado

O álbum dividido com Geraldo Azevedo - gravado e lançado em 1972 pela extinta gravadora Copacabana - é tido como o marco zero da discografia de Alceu Valença. De fato, tal disco delimita o início da expressiva caminhada fonográfica do cantor e compositor pernambucano. Contudo, em 1969, Alceu - então um ilustre desconhecido no Rio de Janeiro (RJ) - tentou a sorte no mundo da música ao defender Acalanto Para Isabela, tema de sua própria autoria, no IV Festival Internacional da Canção, o popular FIC. A gravação do acalanto foi incluída no segundo dos três álbuns editados com músicas do quarto FIC. Até então inédito em disco, o registro de Acalanto Para Isabela ao vivo vem à tona na caixa Festivais da Canção Vol. 2 - 1969 - 1972, editada pelo selo carioca Discobertas (clique aqui para saber alguns detalhes da caixa Festivais da Canção Vol. 1 - 1966 - 1968). A segunda caixa embala sete álbuns com gravações das quatro últimas edições do FIC, sendo que o segundo e o terceiro volumes do FIC de 1969 são títulos inéditos que trazem registros ao vivo das músicas do festival daquele ano, garimpadas pelo pesquisador Marcelo Fróes. Raros ou inéditos, os sete discos da caixa já assinalam o progressivo esvaziamento da era dos festivais. Ainda assim, o valor documental e musical é bem alto, não somente pela raridade da maioria dos fonogramas, mas também pela alta qualidade dos arranjos, assinados por maestros como Erlon Chaves (1933 - 1974), Julio Medaglia e Luiz Eça (1936 - 1992). Tal como o primeiro volume, a caixa Festivais da Canção Vol. 2 1969 - 1972 resgata muita composição datada, feita dentro dos padrões do subgênero definido como "música de festival", mas também belas canções compostas dentro desse mesmo padrão. E o fato é que, para colecionadores, as caixas são valiosas por pescarem pérolas raras da inflamada era dos festivais. Nos dois álbuns do V Festival Internacional da Canção (1970), por exemplo, há relíquias como o hilário Hino do Festival Internacional da Canção na voz esperta de Wilson Simonal (1938 - 2000) entre gravações que atravessaram gerações como BR-3 (Antônio Adolfo e Tibério Gaspar) - com o cantor Toni Tornado, voz  do funk e soul brasileiro que começava a ganhar visibilidade e admiradores no mercado nacional - e Universo no Teu Corpo, (grande) música de Taiguara (1945 - 1996), defendida pelo próprio cantor e compositor uruguaio radicado no Brasil. No único álbum do VI Festival Internacional da Canção Popular,  editado em 1971, Marlene - cantora egressa da era do rádio, então em fase de renascimento artístico - deu voz à composição de Silvio César, Você Não Tá Com Nada. A mesma Marlene interpreta Carangola - bissexta composição do diretor de teatro Fauzi Arap, assinada com Fototi - no disco que reuniu gravações das 12 músicas finalistas da sétima e última edição do FIC, veiculada pela TV Globo em 1972. Neste disco, os intérpretes - em sua maioria - já não são os originais por impedimentos contratuais, com honrosa exceção de Maria Alcina, defensora de seu Fio Maravilha (Jorge Ben Jor). Era o fim da era dos festivais, época efervescente reavivada nas duas (oportunas) caixas lançadas pelo importante selo Discobertas.

Caixa 'Festivais da Canção 1' traz registros de Beth, Elis e Milton no 'FIC'

Itens de colecionadores de discos, os dois volumes da caixa Festivais da Canção - recém-lançados pelo selo Discobertas, do pesquisador Marcelo Fróes - embalam as primeiras reedições em CD dos 14 álbuns gerados ao longo das sete edições do Festival Internacional da Canção Popular, conhecido como FIC. Com sete CDs cada, as duas caixas totalizam 203 fonogramas, em sua maioria raros e/ou inéditos em formato digital. São registros ao vivo e/ou de estúdio das músicas concorrentes no FIC nas vozes dos intérpretes que as defenderam no palco - diante das inflamadas torcidas organizadas em favor de determinado artista ou música - ou (nos casos em que o intérprete original estava impedido de aparecer nos discos dos festival por questões jurídicas) de cantores convidados. A primeira caixa, Festivais da Canção Vol. 1 - 1966 - 1968,  cobrem as três primeiras edições do FIC. Nos dois volumes do disco do I Festival Internacional da Canção Popular, promovido em 1966, há gravações de Elis Regina (1945 - 1982) (Canto Triste, de Edu Lobo e Vinicius de Moraes), Maysa (1936 - 1977) (Dia das Rosas, marcha-rancho de Luiz Bonfá e Maria Helena Toledo) e Nana Caymmi (Saveiros, a vaiada parceria de Dori Caymmi com Nelson Motta). Já o disco da segunda edição do festival destaca registros seminais de Milton Nascimento (Travessia e Morro Velho, destaques do primeiro álbum do cantor e compositor mineiro, gravado naquele ano de 1967). Por sua vez, o III Festival Intenacional da Canção Popular gerou nada menos do que quatro discos em 1968. Neles, há gravação pouco conhecida de Clara Nunes (1942 - 1983), Corpo e Alma (Augusta Maria Tavares), além do clássico registro de Andança (Danilo Caymmi, Edmundo Souto e Paulinho Tapajós) feito por Beth Carvalho com o grupo Golden Boys. Contudo, as duas músicas que mais provocaram discussões na terceira edição, Pra Não Dizer que Não Falei de Flores (Geraldo Vandré) e Sabiá (Antonio Carlos Jobim e Chico Buarque), foram registradas nos discos sem as vozes de seus intérpretes originais, sendo ouvidas com os cantores Aloísio Silva e Maria José, respectivamente. Nada que diminua o valor documental da edição da caixa.

BossaCucaNova cai no samba com Elza, Maria Rita e Teresa no quinto CD

Aos 15 anos, o trio BossaCucaNova - formado em 1997 no Rio de Janeiro (RJ) pelo tecladista Alexandre Moreira, o DJ Marcelinho Da Lua e o baixista Márcio Menescal - cai radicalmente no samba em seu  quarto álbum de estúdio, Nossa Onda É Essa!, lançado pela gravadora Coqueiro Verde neste mês de novembro de 2012. Cada uma das onze faixas do quinto título da discografia do grupo - que inclui um registro ao vivo de show lançado em CD e DVD - apresenta um convidado. Maria Rita dá voz à abordagem - em ritmo de samba-jazz - de Deixe a Menina, samba lançado por Chico Buarque em 1980 e turbinado no registro do BossaCucaNova com o toque do trio do pianista carioca David Feldman, incensado no circuito de jazz por sua criatividade nos improvisos. Elza Soares põe sua ginga em A Pedida É Samba (Roberto Martins e Jair Amorim), música que deu título ao álbum lançado em 1961 pela cantora paulista Isaura Garcia (1919 - 1993). Já Teresa Cristina revive Deixa pra Lá, samba de Leci Brandão, lançado pela compositora carioca em seu segundo álbum, Questão de Gosto (1976). Espécie de vocalista honorária do trio, Cris Delanno participa de três faixas. Delanno faz dueto com Martinho da Vila em Segure Tudo (samba da lavra do próprio Martinho, lançado pelo compositor em 1971), canta Balança (Não Pode Parar!) - tema inédito de autoria do trio - e segue o Monobloco na regravação de Tô Voltando (Maurício Tapajós e Paulo César Pinheiro, 1979), faixa gravada com a adesão de Roberto Menescal. No time masculino, Moska celebra a cidade natal do trio carioca em Rio de Inspiração. Os versos do inédito tema foram escritos por Moska a partir de melodia do BossaCucaNova. Emílio Santiago põe sua voz aveludada em É Preciso Perdoar (Carlos Coqueijo e Alcivando Luz, 1967). Já Wilson Simoninha aparece em dose dupla. O cantor abre Nossa Onda É Essa! cantando Adeus, América (Geraldo Jacques e Haroldo Lobo, 1948) - samba lançado nas vozes emblemáticas do conjunto Os Cariocas - no toque do violão de Oscar Castro Neves. Sete faixas depois, Simoninha reaparece como vocalista convidado de Waldomiro Pena, tema composto por Jorge Ben Jor em 1979 para a abertura de série de TV estrelada pelo ator Hugo Carvana. É o BossaCucaNova na (eterna) onda do samba!

Daúde evoca a ancestralidade africana em show feito na pressão (eletrônica)

Resenha de show
Evento: Back2Black
Título: Daúde
Artista: Daúde (em foto de Mauro Ferreira)
Local: Estação Leopoldina (Rio de Janeiro, RJ)
Data: 25 de novembro de 2012
Cotação: * * * 1/2

 É sintomático que Daúde tenha aberto seu show no festival Back2Black com música de Jorge Ben Jor - Crioula, lançada no consagrador álbum de 1969 que trouxe País tropical e Charles anjo 45 - que descreva linda dama negra descendente de nobres africanos que por descuido geográfico nasceu no Brasil. De volta à cena com moderno porte de rainha africana, a cantora baiana - radicada no Rio de Janeiro (RJ) - talvez tenha sido a mais perfeita tradução da negritude pop brasileira na programação do festival idealizado para propagar sons negros de diversos sotaques e latitudes. Mesmo prejudicada pela acústica deficiente da ambiência ao ar livre do Palco Petrobrás, que acentuou o desnível do som (baixo) de seu microfone em relação aos instrumentos da banda, a cantora volta à cena com bom show, feito na pressão, dada pela interação uniforme das programações eletrônicas com a guitarra de César Bottinha, imponente na banda. Ao longo de 13 números, o coeso roteiro conciliou músicas incluídas no vindouro quarto álbum da cantora - Código Daúde, com lançamento previsto para 2013 - com temas gravados pela artista em seus três CDs anteriores, evocando a ancestralidade afro-brasileira com sons contemporâneos. O alinhamento de músicas como Pata pata (Miriam Makeba e Jerry Ragovoy, 1957) - sucesso mundial em 1967 na voz da cantora sul-africana Miriam Makeba (1932 - 2008) - e Véu Vavá (Celso Fonseca e Carlinhos Brown, 1995) - sublinhou o tributo à negritude e à dinastia da linda dama negra, que destilou estilosa o veneno de Naja, tema de Paulinho Camafeu, compositor baiano identificado com as tradições da cultura afro-brasileira. Com energia, a elétrica e performática Daúde manteve a pressão do show, na alta velocidade exigida por músicas como o coco de embolada Quatro meninas (tema de domínio público que ela adaptou e gravou em 1995), Lavanda (Carlinhos Brown, 1997) e de Ah! (Luiz Tatit). Parafraseando verso do tema de Tatit, de 1981, a palavra musical de Daúde quase sempre soa carregada de sentido. Mesmo que esse sentido seja de natureza particular quando a cantora revive um mambo cubano imortalizado no Brasil  na voz luminosa de Ângela Maria, Babalu (Margarita Lecuona, 1939), reminiscência de sua memória afetiva. Na necessária apropriação de músicas alheias, Daúde - intérprete de personalidade forte - às vezes até peca pela radical desconstrução da moldura rítmica original. Na pressão do show, Cala boca, menino (Dorival Caymmi, 1973) é capaz de silenciar admiradores mais ortodoxos da obra de Caymmi. Contudo, palavras e sons vão fazendo sentido ao longo da apresentação. O suingue nortista reforça a arquitetura sedutora de Casa caiada (Léo Bit Bit, Alain Tavares e Boghan, 1997), destaque do show, momento mais orgânico e nem por isso menos fervido. Se mar e sertão se reviram na estranha pegada eletrônica de Sobradinho (Luiz Carlos Sá e Guarabyra, 1977), a deliciosa Eu não vou mais (Orlandivo e Durval Ferreira, 1966) - pérola rara extraída da discografia do rei dos bailes Ed Lincoln (1932 - 2012) - decifra ao fim parte do Código Daúde, vindouro disco de estúdio que promete recolocar Daúde sob os holofotes em 2013. E o fato de (longa) década separar o quarto álbum da cantora do anterior, Neguinha te amo (Real World / EMI Music, 2003), sinaliza que a antenada dama negra do suingue pode ter nascido no Brasil por um mero descuido geográfico-musical. Se assim foi, a sorte foi do Brasil!

segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Roteiro do show de Daúde no Back2Black decifra parte do CD 'Código Daúde'

 De novo sob os holofotes, Daúde - uma das mais interessantes cantoras brasileiras surgidas na cena pop dos anos 90 - voltou aos palcos cariocas em show apresentado no terceiro e último dia do Back2Black, o festival que agitou a Estação Leopoldina, no Centro do Rio de Janeiro (RJ), de 23 a 25 de novembro de 2012. O roteiro do show da cantora baiana - radicada na cidade do Rio de Janeiro desde os anos 70 - decifrou parte do Código Daúde, quarto álbum da intérprete, previsto para ser lançado em 2013, uma década após seu antecessor Neguinha te Amo (Real World / EMI Music, 2003). Apresentadas ao longo dos 13 números do show, feito na pressão do baticum eletrônico, músicas como Babalu (Margarita Lecuona, 1939), Cala Boca, Menino (Dorival Caymmi, 1973), Eu Não Vou Mais (Orlandivo e Durval Ferreira, 1966) e Sobradinho (Luiz Carlos Sá e Guarabyra, 1977) deram prévia do Código Daúde. Arquitetado desde 2008, o CD também tem no repertório Como Dois Animais (Alceu Valença, 1982), J’Ai Deux Amours (Vincent Scotto, Géo Koger e Henri Varna, 1930) - sucesso de Joséphine Baker (1906 - 1975) - e Segura Esse Samba, Ogunhê (Oswaldo Nunes, 1969). Eis o roteiro seguido por Daúde - em foto de Mauro Ferreira - em 25 de novembro de 2012 no show do Back2Black:

1. Crioula (Jorge Ben Jor, 1969)
2. Pata pata (Miriam Makeba e Jerry Ragovoy, 1957)
3. Quatro meninas (folclore) - gravado por Daúde em 1995
    - com citação de Asa branca (Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira, 1947)
4. Sobradinho (Luiz Carlos Sá e Guarabyra, 1977)
5. Alá-lá-ô (Haroldo Lobo e Antônio Nássara, 1941)
6. Naja (Paulinho Camafeu, 198?)
7. Babalu (Margarita Lecuona, 1941)
8. Lavanda (Carlinhos Brown, 1997)
9. Cala boca, menino (Dorival Caymmi, 1973)
10. Casa caiada (Léo Bit Bit, Alain Tavares e Boghan, 1997)
11. Véu Vavá (Celso Fonseca e Carlinhos Brown, 1995)
12. Ah! (Luiz Tatit, 1981)   
      - com citação de Babá Alapalá (Gilberto Gil, 1977)
13. Eu não vou mais (Orlandivo e Durval Ferreira, 1966)

Dona Onete mostra bolero chamegado aos cariocas no festival 'Back2Black'

 A IMAGEM DO SOMCom a habitual indumentária, tradutora dos tons nortistas que pautam a música que compõe e que canta, Ionete da Silveira Gama - a Dona Onete, apresentada como a "lenda viva" da música do Pará neste ano de 2012 em que a música do Norte ganhou aura hype na mídia de Rio e SP - mostrou boleros e carimbós chamegados aos cariocas na noite de ontem, 25 de novembro de 2012. Aos 74 anos, Onete foi a atração que abriu o Palco Petrobrás na terceira e última noite do festival Back2Black, apresentado na Estação Leopoldina, no Rio de Janeiro (RJ). Onete - em foto de Mauro Ferreira - cantou músicas autorais como a abolerada Poder da sedução e a maliciosa Jamburana, gravadas no recém-lançado primeiro álbum da veterana artista, Feitiço Caboclo (Na Music, 2012). Onete conseguiu prender a atenção do público até o momento em que Gal Costa começou (consagradora) apresentação do show Recanto no palco principal do festival, concentrando todas as atenções do Back2Black e esvaziando a plateia de Onete, vivaz voz do Pará.

Gravação inédita festeja os 50 anos de Cássia Eller em 10 de dezembro

Cássia Eller (1962 - 2001) completaria 50 anos de vida em 10 de dezembro de 2012 se não tivesse saído precocemente de cena em 29 de dezembro de 2001. Na data, o aniversário da cantora carioca vai ser festejado pela Universal Music com o lançamento no iTunes de gravação inédita de música também inédita da artista, feita em Brasília (DF) quando Cássia tinha 19 anos. Trata-se de Flor do Sol, música composta por Cássia com Simone Saback. A gravação foi finalizada em estúdio com a participação de músicos associados ao universo pop de Cássia Eller.

'Expresso 2222' de Gil volta a circular em CD com projeto gráfico original

Ficou somente na ideia o projeto da gravadora Universal Music de reeditar Expresso 2222 em vinil por conta dos 40 anos do emblemático álbum de Gilberto Gil. Contudo, Expresso 2222 volta a circular em CD neste ano de 2012 com reedição remasterizada no estúdio Abbey Road, em Londres, por Steve Rooke, como alardeado na luva que envolve o disco. Sem faixas-bônus, Expresso 2222 volta ao catálogo com o mesmo conteúdo de 1972. O criativo projeto gráfico da capa original - assinada por Edinizio Ribeiro Primo - foi transposto para o formato de CD.

Flávia se movimenta bem na popular rota nordestina de seu terceiro CD

Resenha de CD
Título: No Movimento
Artista: Flávia Bittencourt
Gravadora: Sem indicação
Cotação: * * * 1/2

Versão em português feita por Rossini Pinto (1937 - 1985) de (I Never Promissed You a) Rose Garden,   tema do recentemente falecido cantor e compositor norte-americano Joe South (1940 - 2012), Mar de Rosas fez grande sucesso com o grupo carioca The Fevers em gravação de pegada pop típica do conjunto. Decorridos 41 anos, Mar de Rosas ganha a sedutora voz de Flávia Bittencourt em registro melodioso que evidencia a beleza da canção popular. A releitura de Mar de Rosas é um dos trunfos do terceiro CD da cantora maranhense, No Movimento, lançado de forma independente. Dois anos após celebrar a obra de Dominguinhos no álbum Todo Domingos (2010), Flávia volta com trabalho de contorno mais (pop)ular sem anular sua identidade nordestina. O movimento em direção a uma sonoridade mais contemporânea é perceptível no uso de programações eletrônicas em faixas como Franqueza - inédita de Luiz Melodia com Renato Pial, endereçada à artista - e Bambayuque, música de 1996 em que o autor Zeca Baleiro, amigo e conterrâneo de Flávia, rebate na já batida tecla das divergências amorosas com versos como "Enquanto você Roberto, eu Hermeto Paschoal / ... / Enquanto eu papai-mamãe, você sexo oral". Em qualquer direção, a voz de Flávia Bittencourt é das mais afinadas e límpidas da geração recente de cantoras. Não é uma voz com veia dramática - e talvez por isso a regravação de Fanatismo (Fagner sobre poema de Florbela Espanca, 1981) soe inoportuna, em que pese o vigoroso arranjo em que sobressaem as guitarras de Pedro Silveira - mas seu fraseado é belo, envolvente e tem um frescor que valoriza temas como o coco Parangolé (César Teixeira), revitalizado por Flávia em dueto com Zeca Baleiro quatro anos após a cantora ter dado voz à mesma música em gravação lançada na coletânea Samba Novo (Som Livre, 2008). No Movimento assinala também a guinada de Flávia Bittencourt como compositora. Se no primeiro álbum (Sentido, 2005), a debutante assinou apenas duas músicas, neste terceiro CD a cota autoral aumenta. Quatro das onze faixas são da lavra da compositora - inclusive a faixa-título No Movimento - sem prejuízo para o resultado final do disco. O destaque do naipe autoral é o xote Lamento das Flores. Pontuada pela sanfona de Adriano Mogoo e pelos efeitos do percussionista Felipe Tauil, a toada pop Um Instante se impõe mais pelos versos do poeta maranhense Ferreira Gullar, musicados por Flávia após ter participado de ciclo de homenagens ao escritor por conta de seus 80 anos. Assim como a canção Volta (de linha pop romântica que evoca o cancioneiro passional de Ana Carolina) é valorizada pelo criativo arranjo de cordas, orquestradas por Maico Lopes. Já Dente de Ouro (Josias Sobrinho) brilha com os tambores que fazem ressoar a origem maranhense da cantora enquanto Onde Você Levar (Alberto Trabulsi) tangencia com elegância o universo da canção popular romântica em dueto da artista com o autor do tema. E assim, se movimentando em rota (pop)ular sem perder de vista sua origem nordestina, caminha Flávia Bittencourt neste terceiro disco que tem tudo para ampliar seu público neste país de cantoras ao longo de 2013.

domingo, 25 de novembro de 2012

Solo, João Cavalcanti concilia referências no tom indie do show 'Placebo'

Resenha de show
Projeto: Ouve.Aí
Título: Placebo
Artista: João Cavalcanti (em foto de Rodrigo Amaral)
Local: Oi Futuro Ipanema (Rio de Janeiro, RJ)
Data: 20 de novembro de 2012
Cotação: * * * 1/2

Ao fechar o bis da segunda apresentação de seu show solo Placebo no Rio de Janeiro (RJ), feita dentro do projeto Ouve.Ai do Oi Futuro Ipanema, João Cavalcanti avisou ao público que iria tocar música de artista que o influencia desde o início de sua formação musical, "desde a mais tenra idade". Na sequência, a banda esboçou riff de música de Lenine, pai do cantor e compositor carioca, mas era pegadinha. Cavalcanti encerrou então o show com o rock Smells Like Teen Spirit (Kurt Cobain, Dave Grohl e Krist Novoselic, 1991), o hino do Nirvana, pedra fundamental da era grunge. Enfim com disco solo, efeito de seu crescente destaque como compositor no grupo carioca de samba Casuarina, Cavalcanti concilia referências e influências no tom indie do show Placebo. O samba está presente no roteiro, evocado no ritmo da música-título Placebo (João Cavalcanti, 2012), na abordagem nervosa d'O Ronco da Cuíca (João Bosco e Aldir Blanc, 1976) e na negritude de Mulato (João Cavalcanti, 2012). Mas não está no centro da roda. Tal como o disco Placebo, recém-lançado pela Warner Music, o show homônimo extrapola ritmos ao firmar a assinatura de Cavalcanti como compositor. Em cena, Cavalcanti processa a (ótima) influência natural de Lenine - perceptível tanto no pancadão funkeado Inemurchecível (João Cavalcanti, 2012) como no batuque da inédita Valsa do Baque Virado, parceria de Cavalcanti com Mario Adnet - sem se prender a ela. A rigor, o mais forte traço familiar do show é o do hypado mano Bruno Giorgi, piloto do P.A. e dos samplers que turbinam o repertório com efeitos eletrônicos, mote da cibernética Binário (João Cavalcanti e Diego Zangado, 2012). Fora da roda do samba, o artista surpreende ao se revelar mais seguro como cantor e ao se permitir ousadias estilísticas como diluir a aura roqueira de Me Adora (Pitty, 2009) para deixar (ainda mais) evidente a irresistível melodia pop de Pitty que rendeu à roqueira baiana o seu maior sucesso popular. A afiada banda - formada por Diego Zangado (bateria e percussão), Nelson Freitas (acordeom e - arrasadores - teclados), Pedro Costa (viola, violões e guitarra) e Yuri Pimentel (baixo) - executa bem os arranjos que valorizam músicas como o tango Demônios (João Cavalcanti e Marcelo Caldi, 2012) e o rock Síndrome (João Cavalcanti, 2012). Climática, Luna (João Cavalcanti, 2012) - a canção em tese mais pop do repertório autoral do artista, não por acaso repetida no início do bis - alinha versos poliglotas que expõem a poesia contemporânea que também ilumina a valsa Em Tempo (João Cavalcanti, 2012). Se Morena (Tom Zé, 1978) tem tempero nordestino que se afina com o Frevo do Contra-Êxodo (João Cavalcanti, 2012), reminiscência da vivência do artista no Recife (PE), Eco (Jorge Drexler, 2004) ressoa com algo de latin jazz no toque dos teclados de Nelson Freitas. Enfim, o show Placebo firma João Cavalcanti como artista solo. No centro do palco e da cena, o cantor ainda deixa entrever nas falas e nos gestos certa insegurança típica de quem ainda não está acostumado a ficar sozinho sob os holofotes. Contudo, musicalmente, o show já se mostra azeitado. Aliadas ao bom repertório autoral do CD Placebo, as complementações poéticas - termo usado por Cavalcanti em cena - do roteiro ajudam a montar painel de múltiplas referências que clareia a identidade do artista e o ajuda a pavimentar seu caminho individual fora do samba, mas (também) com o samba. O efeito vai ser sentido a médio prazo.

Em cena, João complementa poeticamente 'Placebo' com Drexler e Pitty

Já em circuito com seu primeiro show solo, João Cavalcanti - cantor e compositor carioca projetado no grupo de samba Casuarina - adiciona ao repertório de seu disco solo Placebo o que chama em cena de "complementações poéticas", inseridas no roteiro para que o álbum surta mais efeito no palco. São músicas de João Bosco & Aldir Blanc (o samba O Ronco da Cuíca, lançado por Bosco em 1976), Jorge Drexler (Eco, faixa-título do álbum editado pelo cantor e compositor uruguaio em 2004), Pitty (Me Adora, hit pop do terceiro álbum de estúdio da roqueira baiana, Chiaroscuro, de 2009) e Tom Zé (Morena, tema criado pelo compositor baiano em 1978 a partir de motivo de domínio público). Todas essas boas "complementações poéticas" incrementaram o roteiro do show feito pelo artista no teatro do Oi Futuro Ipanema, no Rio de Janeiro (RJ), dentro da série Ouve.Aí, em 20 de novembro de 2012. De quebra, João Cavalcanti - visto em foto de Rodrigo Amaral - ainda apresentou a inédita Valsa do Baque Virado, composta com Mario Adnet. Eis o roteiro do show Placebo nessa apresentação carioca:

1. Cada Lugar na Sua Coisa (Sergio Sampaio, 1976) - citação
2. Luna (João Cavalcanti, 2012)
3. Você Alterego de Mim (João Cavalcanti e Diego Zangado, 2012)
4. Me Adora (Pitty, 2009)
5. Demônios (João Cavalcanti e Marcelo Caldi, 2012)
6. Em Tempo (João Cavalcanti, 2012)
7. Morena (Tom Zé sobre motivo de domínio público, 1978)
8. Binário (João Cavalcanti e Diego Zangado, 2012)
9. Criança (João Cavalcanti e Sílvia Nicolatto, 2012)
10. Eco (Jorge Drexler, 2004)
11. O Ronco da Cuíca (João Bosco e Aldir Blanc, 1976)
12. Placebo (João Cavalcanti, 2012)
13. Síndrome (João Cavalcanti, 2012)
14. Mulato (João Cavalcanti, 2012)
15. Frevo do Contra-Êxodo (João Cavalcanti, 2012)
16. Valsa do Baque Virado (João Cavalcanti e Mario Adnet, 2012) - música inédita
17. Inemurchecível (João Cavalcanti, 2012)
Bis:
18. Luna (João Cavalcanti, 2012)
19. Smells Like Teen Spirit (Kurt Cobain, Dave Grohl e Krist Novoselic, 1991)

Lili Araujo hospeda em 'Casa Aberta' a boa influência do jazz e de Joyce

Resenha de CD
Título: Casa Aberta
Artista: Lili Araujo
Gravadora: Delira Música
Cotação: * * * *

Cantora e compositora carioca, Lili Araujo descende da linhagem nobre de Joyce e Rosa Passos. Não é por acaso que Joyce avaliza o segundo álbum de Araujo, Casa Aberta, em texto escrito para o encarte do CD. O samba que abre o disco, exaltando a alma africana da Bahia, Negro Coração (Alegre Corrêa e Raul Boeira), poderia figurar no repertório de qualquer álbum mais recente de Joyce pelo balanço que remete de imediato ao cancioneiro desta conterrânea de Araujo. Quatro anos após lançar seu (bom) disco de estreia, Arribação (Oficina Records, 2008), trabalho em que filtrou o samba e o choro pela estética do jazz, a artista continua envolvendo a música brasileira em atmosfera jazzy, sem jogar nota fora, sem abrir espaço para improvisos exagerados. A boa influência do jazz é perceptível em todo o disco, mas notadamente em certas passagens de Até Quando Durar (Daniel Santiago e Mauro Aguiar) e da faixa-título Casa Aberta (Lili Araújo), destaques do disco produzido pela própria cantora (e cada vez melhor compositora) com o guitarrista Daniel Santiago. O piano de João Donato imprime em Não Tem Nada Não (João Donato, Eumir Deodato e Marcos Valle, 1973) o tom latino típico do músico. A faixa é outro trunfo de disco que reitera o  apego de Araujo ao samba, ritmo recorrente ao longo das 11 faixas de Casa Aberta. Um desses sambas, Não Tem Perdão, é da safra inicial de Ivan Lins, parceiro de Ronaldo Monteiro de Souza no tema lançado por Leny Andrade no álbum Alvoroço (EMI-Odeon, 1973). Outro, Onde Estiver (Chico Pinheiro e Paulo Neves), é cantado em ritmo veloz por Araujo em fina demonstração de sua destreza vocal. Um terceiro, Vai Saber (Lili Araujo), confirma a evolução da compositora, que também assina Pra se Lembrar de Mim, balada interiorizada (e menos envolvente no confronto com outros temas do disco). No todo, Casa Aberta hospeda a boa influência do jazz (e de Joyce) na música brasileira, sinalizando a desenvoltura de Lili Araujo em gênero hoje mais recebido no Exterior do que na sua humilde residência. Entre com ouvidos abertos para o samba jazzy...

Vergueiro seduz mais no autoral 'Vida Sonhada' quando extrapola samba

Resenha de CD
Título: Vida Sonhada
Artista: Carlinhos Vergueiro
Gravadora: Biscoito Fino
Cotação: * * 

No CD Vida Sonhada, Carlinhos Vergueiro retoma o fio autoral de sua obra fonográfica, recompondo a parceria com J. Petrolino, com quem faz música desde a segunda metade da década de 70. Sucessor de Carlinhos Vergueiro Interpreta Nelson Cavaquinho (Biscoito Fino, 2011), Vida Sonhada cai com frequência no samba - ritmo, aliás, recorrente no cancioneiro do artista - em faixas como A Seu Dispor (Carlinhos Vergueiro) e Passa Amanhã (Carlinhos Vergueiro, Afonso Machado e Dora Vergueiro). São sambas ambientados fora do terreiro, com pouca ênfase na percussão. O suingue reside mais no toque do piano de Amador Longhini Junior. Dentro da safra de sambas de Vida Sonhada, Sem Refrão (Carlinhos Vergueiro e Dora Vergueiro) se impõe como o mais bem acabado do repertório - sem seduzir de fato. Produzido por Aluízio Falcão, o disco prende mais a atenção quando extrapola o universo do samba. A faixa-título Vida Sonhada (Carlinhos Vergueiro e J. Petrolino) é o destaque absoluto do CD. Trata-se de canção de arquitetura clássica, bela, construída com certa influência buarquiana. Com formação instrumental que remete aos Regionais da fase pré-Bossa Nova, Chorar no Fim (Carlinhos Vergueiro e J. Petrolino) traça breve linha evolutiva da música brasileira em clima que fica entre a seresta e o fado. Aboio (Carlinhos Vergueiro e J. Petrolino) evoca de leve o sertão nordestino através rabeca de Thomas Rohrer. Em tom mais expansivo, moldado pelo arranjo que combina percussão e metais, Samba da Vida (Carlinhos Vergueiro e J. Petrolino) reconduz Vida Sonhada à roda, sem nunca soar marcante, mas deixando ao menos para a posteridade a bela canção que dá título a este disco que repõe Vergueiro no seu trilho autoral.  

Som de Katia B atinge ponto de maturação no CD 'Pra Mim Você É Lindo'

Resenha de CD
Título: Pra Mim Você É Lindo
Artista: Katia B
Gravadora: Sem indicação
Cotação: * * * 1/2

Talvez por ter seguido trilha de desbravamento atribuído a Bebel Gilberto, cantora brasileira (bastante) incensada pelo universo pop em 2000 ao aclimatar a música brasileira em atmosfera eletrônica (com o auxílio fundamental e nem sempre creditado do finado produtor Suba), Katia B sempre ficou à margem. Contudo, no quarto disco solo da cantora e compositora carioca, Pra Mim Você É Lindo, a música refinada de B (de Bronstein) atinge ponto de maturação. O upgrade do repertório salta aos ouvidos e contrasta com a irregularidade do cancioneiro do álbum anterior da artista, Espacial (2007), mais escorado nas ambiências eletrônicas do que na música em si. Sob azeitada produção capitaneada pelo guitarrista Bernardo Bosísio com a própria Katia B, com eventuais intervenções dos coprodutores Lucas Vasconcellos e Duda Mello, a cantora se apropria com personalidade de pérola rara de Lamartine Babo (1904 - 1963), A Tua Vida É um Segredo, originalmente um samba lançado em julho de 1956 pelo cantor carioca Francisco Carlos (1928 - 2003). Com bossa, B desconstrói o tema de Lamartine para enquadrá-lo dentro da estética cool do disco. Composta e/ou gravada com diversos parceiros, a safra autoral se revela de bom nível, a melhor de Katia B até o momento. Aprendendo a Viver é bela canção assinada e cantada com Rubinho Jacobina. Tão sedutora quanto, O Baile junta as vozes de Katia B e Jam da Silva, parceiro na composição. Armadilha é balada climática que exalta a vida e as possibilidades de amar. É parceria de B com Dé Palmeira e com Teresa Cristina, convidada da faixa, cada vez mais à vontade fora do universo do samba. Orquestrada com arranjo pontuado pelo charango de Lui Coimba, Seis Vidas (Charles Gavin, Bernardo Bosisio e Katia B) reitera o acerto da artista na escolha dos parceiros e climas do repertório de Pra Mim Você É Lindo. A propósito, o título do disco é a tradução em português de Bei Mir Bistu Du Shon (Sholom Secunda e Jacob Jacobs), canção de opereta iídiche que fez sucesso mundial em 1932 e que figura no disco para conectar Katia B à sua origem judaica. O tema é cantado no idioma original, iídiche, e também em inglês, língua da balada Where Is Your Heart? (Katia B), faixa de menor poder de sedução, assim como a abordagem da canção francesa Le Temps de L'Amour (Jacques Dutronc, Lucien Morisse e André Salvet). Dentro deste pequeno mosaico poliglota, valsinha de Antônio Saraiva, Sem História, (bem) gravada com o compositor, se revela mais repleta de sutilezas e barulhinhos bons. Se Depois do Bloco (Vik Barone e Katia B) é o anticlímax anticarnavalizante que exemplifica o bom uso que se pode fazer das programações eletrônicas (pilotadas por Vik Barone), Sete Mil Vezes - tema de alta voltagem poética composto por Caetano Veloso (com melodia aquém dos versos) e lançado por Maria Bethânia no álbum Alteza (1981) - reitera a habilidade de Katia B de irmanar sotaques, músicas e idiomas dentro da requintada estética sonora que pauta sua música, ironicamente hoje mais interessante e mais multifacetada do que a música da desbravadora Bebel Gilberto.